Não
é fácil interpretar, neste momento, o fenômeno popular que tem tomado o Brasil,
mas deixo algumas considerações na tentativa de contribuir com tal tarefa.

Quando
as primeiras manifestações explodiram, lembrei-me da música da banda mineira
Skank: “A nossa indignação é uma mosca sem asas, não ultrapassa as janelas de
nossas casas”. Eis que, cansados da indignação solitária, ou mesmo
compartilhada no mundo virtual, os brasileiros resolvem dar-lhe asas. Motivos não
faltam, mas a corrupção resume todos. Os políticos, agora, talvez aprendam que
não se pode mais contar, a todo tempo, com a passividade e a ingenuidade do
brasileiro. Ninguém é contra a Copa. Amamos o futebol e nos orgulhamos de
sediar o evento. Mas ele nos foi vendido como algo que atrairia investimentos
privados e nos daria obras de infraestrutura permanentes. Pois bem, o dinheiro
público escoou pelo ralo com elefantes brancos, superfaturados, construídos em
cidades nas quais o futebol é inexpressivo. Do prometido trem bala entre São
Paulo e Rio, só temos as balas, perdidas ou não. Alguns aeroportos estão sendo
“maquiados” e espera-se que, quando a bola role, ninguém mais se preocupe com
esses “detalhes”. Daí a surpresa e o atordoamento de todos os governos.

Mesmo
que alguns partidos ou centrais sindicais estejam querendo pegar carona no
movimento, não são bem-vindos, pois não representam ninguém além de si mesmos e
de seus interesses cada vez mais ávidos por cargos e espaços nos governos.
Apoiam ou retiram o apoio de acordo com os “afagos” do poder aos seus
interesses mesquinhos. Daí que os que comandam a corrupção de hoje são os que vociferavam
contra ela num passado recente.

De
origem ainda desconhecida e veiculado pelas redes sociais, este é um evento
histórico que pode mudar mesmo o Brasil.

Mas
a mudança não vai acontecer apenas com “manifestações”, pois a corrupção não é
privilégio que quem tem o poder e administra altos orçamentos. Entre os
manifestantes estão os que buscam atestados frios para faltarem ao trabalho e
os que consomem ou produzem todo tipo de pirataria. Enquanto cartazes pedem
mais Educação, a maioria dos jovens não está nem aí para a própria formação.
Gastam o tempo de estudo com entretenimentos fúteis, não leem e fraudam
trabalhos escolares. A mudança deve acontecer no alto comando, mas só será
sólida se passar também pela avaliação do nosso comportamento enquanto
cidadãos. É fundamental que nossa indignação tenha criado asas, mas é mais
importante ainda que ela crie raízes.