Advogada de Brusque acusada de fazer vídeo que critica auxílio-moradia de promotores consegue barrar investigação na Justiça

TJ-SC decidiu que mandado de busca e apreensão violou prerrogativas profissionais

Advogada de Brusque acusada de fazer vídeo que critica auxílio-moradia de promotores consegue barrar investigação na Justiça

TJ-SC decidiu que mandado de busca e apreensão violou prerrogativas profissionais

A Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) concedeu habeas corpus a uma advogada de Brusque acusada de ser a autora de vídeo que questiona a legalidade do pagamento de auxílios-moradia a um casal de promotores de Justiça de Brusque, divulgado nas redes sociais. O nome não será divulgado pois o processo corre em segredo de Justiça.

O pedido foi realizado pela Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Catarina (OAB-SC), por meio da Procuradoria de Prerrogativas e da Comissão de Prerrogativas, no fim de novembro do ano passado. A decisão, concedida de maneira unânime, foi divulgada na terça-feira, 30.

O vídeo começou a ser divulgado nas redes sociais em novembro. A produção de cerca de dois minutos aponta que “há algo ilegal e imoral em Brusque”, referindo-se ao promotor de justiça, Daniel Westphal Taylor, e sua esposa, a também promotora pública, Fernanda Crevanzi Vailati.

Conforme o vídeo, cada um recebe cerca de R$ 30 mil mensais de salário, e ainda ganham o benefício de auxílio-moradia de aproximadamente R$ 4,3 mil cada um. O material mostra também que os promotores recebem auxílio-saúde e auxílio-alimentação. Além disso, provas dos referidos auxílios são exibidas, por meio de fotos de pedidos de informação.

Devido à divulgação do material, no fim de novembro, o juiz da Vara Criminal da Comarca de Brusque acatou um requerimento formulado pelo Ministério Público e determinou a expedição de mandado de busca e apreensão da advogada acusada.

Na ocasião, agentes do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) estiveram nas dependências da Câmara de Vereadores de Brusque e apreenderam o computador de trabalho e o celular de uso pessoal utilizados por ela. Todos os arquivos digitais do computador e do HD externo também foram copiados.

Prerrogativas profissionais
Após essa situação, a OAB Subseção Brusque buscou junto à OAB estadual meios para trancar a investigação criminal, já que entende que o fato não configura crime. Segundo a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, o habeas corpus foi concedido porque a busca e apreensão aos materiais da advogada viola as prerrogativas profissionais.

O conselheiro estadual da OAB-SC, Leonardo Pereima de Oliveira Pinto, que entrou com o habeas corpus junto com os advogados Gabriel Henrique da Silva e Leoberto Baggio Caon, afirma que foi “corretíssima a decisão prolatada pela Segunda Câmara Criminal”.

De acordo com ele, “não se faziam presentes os requisitos para a busca e apreensão e para a quebra do sigilo telemático, sendo evidente o constrangimento ilegal imposto à colega de Brusque”.

Vitória para a classe
Para Renato Munhoz, presidente da OAB de Brusque, a decisão foi de suma importância para a advocacia catarinense e, principalmente, para a de Brusque, já que foi “restabelecida a violação das prerrogativas profissionais sofridas pela advogada”.

“Foi um ato extremamente desproporcional, praticado em deferimento dela, e que as luzes do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, com a intervenção da diretoria da Subseção de Brusque e da diretoria do Conselho Estadual da OAB, conseguiram afastar esse ato que depõem não só contra a advogada, mas contra toda advocacia”, ressalta.

Munhoz destaca que mesmo tendo uma liminar que garanta o auxílio-moradia aos promotores de Justiça, ele considera que há imoralidade. “Nenhum cidadão brasileiro recebe auxílio-moradia para fazer as suas atividades regulares. Não faz sentido que quem tem uma propriedade receba o auxílio-moradia”.

Informação é pública, diz advogada
A advogada de Brusque acredita que foi acusada de ter feito o vídeo por ter solicitado informações ao promotor Taylor referentes ao auxílio-moradia que ele e a esposa recebem. No entanto, ela garante que não é responsável pelo material.

Segundo a advogada, essas são informações públicas e deveriam estar disponibilizadas de maneira transparente. “Solicitei mais informações detalhadas, que não são sigilosas e que deveriam estar disponíveis, já que qualquer cidadão pode recorrê-las, e por isso achou-se que eu fiz o vídeo”, defende.

A advogada ainda diz que repassou todas as informações ao Gaeco e facilitou a investigação da melhor maneira possível. Segundo ela, a equipe do Gaeco foi cordial e lhe tratou bem durante todo o procedimento.

O que diz o promotor Daniel Westphal Taylor, citado no vídeo

O Município: O que motivou a busca e apreensão aos equipamentos da advogada de Brusque na Câmara?
Taylor: Quanto à busca e apreensão realizada na Câmara de Vereadores, não sei dar detalhes, pois sou vítima e o processo está em sigilo.

O Município: Houve, na sua visão, violação das prerrogativas profissionais, como julgou o TJ-SC? Como avalia a decisão favorável ao habeas corpus?
Taylor: O que sei é que uma busca e apreensão não é nem solicitada nem deferida sem uma explicação plausível.

O Município: As informações que constam no vídeo procedem?
Taylor: A informação do vídeo procede em parte. No caso concreto dos Promotores de Justiça de Santa Catarina, o recebimento do auxílio, mesmo por cônjuges que exercem a mesma função, foi reconhecido por Lei Estadual e por decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, sendo esta última referendada pelo Superior Tribunal de Justiça, de modo que não tem nada de ilegal (então, nesta parte certamente o vídeo é falso).

O Município: O senhor entende que há alguma imoralidade no recebimento dos benefícios?
Taylor: Para mim é e sempre foi muito claro que o auxílio-moradia foi criado com o objetivo de repor perdas inflacionárias e não propriamente para “garantir a moradia” de juízes e promotores. Basta, aliás, ler as entrelinhas das resoluções e da lei que tratam do tema para chegar a essa conclusão.
Obviamente, a definição dessas políticas repositórias são traçadas no topo da pirâmide da Magistratura e do Ministério Público, e não por mim. Assim, minha opinião pessoal é que a instituição do auxílio-moradia foi uma péssima escolha política e que teria sido muito mais adequado a continuidade da luta pela reposição inflacionária. Dentro dessa perspectiva (ou seja, a de que o auxílio tem o objetivo de repor perdas inflacionárias), não considero imoral o recebimento do auxílio-moradia por marido e esposa que trabalham na mesma função. Se isso fosse imoral, também o seria, me parece, o recebimento por um só juiz ou promotor, como acontece, até onde sei, com os demais juízes e promotores de Brusque e do resto do país.
Curiosamente, ou nem tanto, o vídeo não trata desses outros profissionais, sendo focado apenas em mim. Assim, creio que é pertinente que cada um, e especialmente este jornal, se pergunte o porquê da produção desse vídeo. Deriva a produção de uma preocupação com a moralidade? Ou seria o vídeo uma retaliação contra este específico Promotor de Justiça? Quem e por qual motivo teria interesse em produzir um vídeo desse, ao invés de procurar as vias próprias para questionar o benefício? Tudo isso tem algo a ver com as investigações e as ações judiciais promovidas por este Promotor de Justiça?
Finalizo esclarecendo que, concordem ou não com o recebimento do auxílio, taxem ele de imoral ou não, os meus ganhos, assim como a ação judicial que deferiu o recebimento por promotores casados, são públicos e podem ser questionados pelas vias próprias. Por outro lado, e ao contrário de mim, quem produziu o vídeo pelas sombras agiu e pelas sombras certamente continua a agir.

O que diz o promotor Rodrigo Cunha Amorim, que investiga o caso na 6ª Promotoria de Justiça de Brusque

“Com a veiculação de um vídeo criminoso contra a honra de Promotores de Justiça, dizendo que receberam valores públicos ilegalmente, o que não é verdade, iniciamos investigação criminal para verificar o assunto, requerendo, inclusive, medidas cautelares em relação a titulares da documentação utilizada no vídeo.
Quanto a busca e apreensão e seus fundamentos, não é possível tecer maiores comentários, pois foi decretado segredo de Justiça na tramitação do processo, razão pela qual a divulgação por minha parte configuraria ilícito penal.
Já em relação à decisão do Tribunal de Justiça, sequer foi a mesma publicada. Não tomamos conhecimento do seu teor. Assim que formos intimados, o Ministério Público examinará a possibilidade do recurso adequado aos Tribunais Superiores, inclusive com pedido de efeito suspensivo do trancamento das investigações, por não concordar com qualquer ilegalidade nas medidas adotadas.
Os questionamentos em relação aos auxílios citados no vídeo já foram respondidos pelos órgãos de direito (Tribunais Superiores), não havendo qualquer irregularidade na percepção.
Em relação às ações tomadas pelo Ministério Público na investigação do vídeo, enfatizo que, na nossa análise, o material divulgado caracteriza crime contra a honra dos Promotores de Justiça. Tal episódio interessa apenas àqueles que buscam de tumultuar a crescente atuação ministerial na moralidade administrativa. Por isso a importância de definir sua autoria e reprimir esse tipo de conduta. Assistimos, frequentemente, estes ataques no cenário nacional. Contudo, no atual momento em que passa o país, não se pode admitir interferência à atuação do Ministério Público, a fim de desnaturar ações desenvolvidas em favor da sociedade de Brusque”.

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