A gente sabe que a nossa vida online, ainda que a gente tente evitar, acontece dentro de uma bolha. Que ela não reflete, objetivamente, a realidade. Está mais para uma fatia do que essa realidade seria. A gente sabe. Mas isso não invalida a sensação boa que deu para sentir, esta semana, ao ver o país (pelo menos do ponto de vista da minha bolha) unido em torno de um sentimento tristemente positivo.

A morte de Bibi Ferreira, na última quarta-feira, aos 96 anos, causou uma onda de expressão de respeito e amor. Por incrível que pareça, não vi nenhum daqueles comentários vergonhosos do tipo “quem se importa, já estava velha” que a gente costuma tropeçar nas redes sociais, vomitadas por quem parece preencher a vida chamando a atenção dos outros com atitudes negativas, como uma criancinha mimada.

Bibi – aí na foto bem jovem, ao lado de uma Fernanda Montenegro que mostra bem como a Fernandinha é a cara da mãe – deve ser um caso raro de respeito unânime. Apesar de ter estrelado espetáculos como Gota d’Água, de autoria de Chico Buarque e Paulo Pontes, ela escapou, em vida e na morte, de ser xingada de comunista. Apesar do repertório eclético, ninguém ousou torcer o nariz e chamá-la de brega. Ela estava, e vai continuar estando, acima das críticas mesquinhas. Elegantérrima.

Não há quem tenha a visto ao vivo que não destaque o quanto ela crescia pessoalmente, o quanto seu talento e carisma criavam um silêncio reverente ao seu redor. Uma grandeza rara.

Talvez o melhor, nessa hora, tenha sido perceber que ela, que só se aposentou dos palcos ano passado, não tenha passado pela tristeza de ser esquecida. A cada aparição dela, em vídeo, a admiração era renovada. Nunca perdemos Bibi e ela nunca nos perdeu.

Não consigo deixar de lembrar aqui a ideia de mortalidade exibida no filme Coco – é, aquele que foi traduzido no Brasil como Viva – A Vida É uma Festa. A gente só morre, mesmo, quando ninguém mais lembra da gente. Assim sendo, Bibi será imortal.

 

 

Bruno Ganz

Outra morte que marcou a semana passada causou, evidentemente, muito menos emoção no Brasil. O ator suíço se foi na sexta passada, aos 77 anos. Todos os textos sobre ele destacaram a atuação como Hitler no filme A Queda.

Pois que me desculpe a maioria, mas, para mim, quem morreu foi o anjo Daniel, protagonista de dois dos filmes mais poéticos de todos os tempos, Asas do Desejo e sua continuação Tão Longe, Tão Perto, ambos dirigidos por Wim Wenders.

Duas maravilhas obrigatórias na “cestinha” de qualquer pessoa apaixonada por cinema e que, instantaneamente, fizeram com que eu me apaixonasse pelo ator que deu tanta humanidade ao anjo que… abriu mão de sua imortalidade para se transformar em humano. R.I.P.