Foi muito difícil soltar a mão dela. Aquela mãe estrela, forte e brilhante, a lhe proteger da vida. Mas a coragem dela era contagiante, pois conseguia disfarçar seu medo e as lágrimas de despedida com risadas acaloradas e divertidas. E foi assim, que apavorada, acreditou que podia ser livre. O ônibus ia cheio de jovens iguais a ela, que também com lágrimas embrulhadas e escondidas, partiam para uma nova vida, um outro horizonte…não tinham a mínima ideia do que iriam encontrar. Mas sabiam, e ela também, que ali, naquela cidade, naquele pseudo-paraíso, não encontrariam o que quer que fosse que poderia ser encontrado. Quanto mais a distância se fazia, o olhar na janela se entristecia…mas depois que nada de muito conhecido podia ser visto, houve algo dentro dela, que até hoje ela não sabe explicar: ela se transformou em outra, atenta, alargada, fronteiriça, forte. E em sua alegria recém descoberta é que entrou naquele prédio esquisito, meio lúgubre com seus tijolinhos a vista e suas janelas sem persianas. Que casa seria aquela? Era muito diferente das casas que conhecia e onde convivia. Os outros moradores estavam mais acostumados com suas delicadas circunstancias e seus espaços apertados. Nem ligavam os colchões no chão e os lençóis na janela fazendo as vezes de cortinas. Nem se importavam com aquela altura, do sétimo andar, e o aprisionamento que a falta de um jardim ocasionava. Juntou suas coisas como pode no lugar que lhe foi predestinado e começou a andar por aquele espaço mínimo. Um quarto, grande, onde todos dormiam. Um banheiro disputado a tapa. Uma sala com mais um colchão querendo ser sofá, e uma tv que ficava ligada o dia todo. A alegria sucumbiu a saudade…ficou infeliz de imediato. Louca pra voltar para casa…para a mãe, o afeto…Mas então, os colegas de quarto anunciaram brincadeiras, coloriram as paredes com cartazes revolucionários, a tv foi substituída por uma vitrola abóbora com um mpb que todos cantavam e logo alguém começou a tocar violão e o canto lhe devolveu o riso e a casa a acolheu como um abraço, mostrando a ela que iniciava sua vida, não mais uma menina, mas uma promessa de mulher.

 

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Silvia Teske – artista