Antes de mais nada… eu sei que corro o risco de cair na categoria “relembre o caso”… Ainda mais que a gente vive um tempo em que os assuntos “viralizam” e morrem instantaneamente. Mas, mesmo que esses dois assuntos tenham pertencido ao longínquo passado localizado perto de umas semanas atrás, não dá para deixá-los fora das páginas beltranas. Disclaimer devidamente feito, vamos ao que interessa…

Desculpa aí, Silvio Santos, mas não tem o que torne a sua atitude menos absurda. Nem a sua idade, nem o seu “posto” de patrão, nem o fato de, como disse a Regina Duarte sobre outra pessoa e em outro contexto, você ter nascido em outra época. O que você fez, durante o Teleton, foi indesculpável.

Claudia Leitte, que nem costuma contar com a simpatia das pessoas, ganhou apoio de (quase) todos os lados. Muita gente acha que, quando seus comentários ficaram pesados, praticamente dizendo que, com “aquela roupa”, ela não merecia respeito, ela devia ter levado a cabo o que cogitou fazer e ter vazado. Mas era um evento beneficente, né? Ia ficar feio para ela. Também pesa que, nos últimos anos, Sílvio Santos, sua figura foi folclorizada e aceita inclusive quando passa de todos os limites. Temos aí mais um legado maldito do CQC.

A cantora estava com um vestido curto e grudado no corpo. E daí? O que ela teve que aturar no palco foi muito parecido com aquele velho argumento nojento que diz que mulher com roupa curta merece ser estuprada. No caso, ela mereceu ouvir que ela não era assim antes, que agora ela tinha virado uma mulher sedutora – e, antes que alguém venha dizer o contrário, não, isso não foi um elogio. Foi mais do que uma crítica. Foi a afirmação de que ela não é mais uma mulher decente, para dizer o mínimo. Que virou uma mulher que não se pode abraçar sem que isso vire uma preliminar para o sexo. Em palavras claras, foi categorizada como prostituta.

Não é engraçado. Não é admissível. Nós não queremos mais viver em um tempo em que essa sua atitude não seja, no mínimo, alvo geral de repugnância. De preferência seguida de uma dor de cabeça jurídica.

Você também, Eduardo esqueci o sobrenome, cantor que aparentemente é famoso, mas de quem eu nunca tinha ouvido falar. Usar as redes sociais para ofender e ameaçar Fernanda Lima, que simplesmente usou o espaço do programa que ela apresenta na Globo para passar uma mensagem de empoderamento feminino… é tudo o que de pior se espera. Especialmente neste momento confuso, em que os avanços das minorias (mulher é minoria, minha gente?) parecem incomodar aqueles que se sentem autorizados a expressar preconceitos e ódios. E não faz sentido ir pedir desculpas dias depois. A “babaquice” já havia sido feita.

Claudia Leitte respondeu no Instagram. Vale a pena ler.

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Aonde quer que eu vá, minha entrega é total. Tem que ser com todo amor do mundo, especialmente quando se trata de contribuir para o bem de alguém. Senti-me constrangida sim! Quando passamos por episódios desse tipo, vemos em exemplificação, o que acontece com muitas mulheres todos os dias, em muitos lugares. Isso é desenfreado, cruel, nos fere e nos dá medo. A provocação vem disfarçada de piada, e as pessoas riem, porque acostumaram-se, parece-nos normal! E lá se vai a nossa vida, cheia de reflexões quanto ao que usar como artista, como empresária, como esposa, como amiga, como empregada, como patroa… como mulher. Até que horas podemos estar nas ruas? Aprendemos a nos esquivar. Fizemos concessões porque fomos educadas assim. Mas, nós que somos vítimas! “Ah, mas se estivéssemos usando outra roupa?” Definitivamente a culpa não é do que estamos usando! A culpa é dessa atitude constrangedora e de dois pesos e duas medidas. Somos livres! Eu, como cantora, ciente do meu papel e da responsabilidade que carrego, sentia que precisava dizer isso a vocês, meus fãs, e a todas as pessoas, em especial às mulheres, que longe do olhar público sofrem todos os dias.

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Fernanda Lima, no Twitter, foi sutil. “Gostaria de agradecer o carinho das pessoas que têm se manifestado positivamente em relação ao programa que foi ao ar na última terça-feira, sobre a mulher. Estou recebendo muito amor e com isso renovando minhas energias para seguir a caminhada.” Também aproveitou para explicar que o programa Amor e Sexo que teve a mulher como tema foi gravado… em julho.

Portanto, carapuças foram vestidas por conta da vontade do cantor/comentarista. Imbecilidade, meu senhor, segundo o Aurélio, é “retardo mental em que o nível intelectual do indivíduo não ultrapassa o de uma criança de 7 anos”.

Pois eu aposto que as crianças de 7 anos saberiam se comportar muito melhor do que esses “famosos” que acham que mulher tem que ser, como era mesmo… bela, recatada e do lar. E, de preferência, que não saiba usar a própria voz.


Claudia Bia
– jornalista que não aprecia nem Milk nem Fernanda “Linda”… mas que acredita que mexeu com uma, mexeu com todas.