Antes de começar a prestar seu depoimento na Promotoria de Justiça, Murilo Ceconello, um dos diretores da SetorSul, empresa que segundo o Ministério Público ajudou a Múltiplos a fraudar licitações, ouviu do promotor sobre a possibilidade de um acordo de colaboração premiada.

Segundo o que consta na primeira audiência em que ele prestou depoimento, seus advogados é que procuraram o Ministério Público e manifestaram esse interesse.

Entretanto, apesar do interesse, não houve, no âmbito da investigação, pelo menos até o momento, a concretização de um acordo de colaboração premiada.

Na audiência, foi informado pelo promotor que os advogados de Ceconello disseram que ele “teria coisas a falar”. O membro do Ministério Público até chegou a informar ao investigado sobre os direitos dos quais abriria mão se firmasse o acordo, entre eles, o de permanecer em silêncio.

Ceconello, entretanto, não esboçou reação à assertiva, e O Município não conseguiu confirmar que fim deu sua intenção de fazer delação.

Ele é uma das peças-chave na investigação e foi um dos denunciados na ação penal cuja consequência mais imediata foi a proibição da Múltiplos participar de licitações e firmar novos contratos com o poder público.

Conforme o promotor Daniel Taylor, houve “participação essencial na fraude” por parte de Ceconello. Em dois depoimentos que prestou, que ao todo somam cerca de 1h15, ele negou veementemente que tenha tido participação em conluio para combinar licitações na SDR.

Vídeo: Murilo Ceconello nega ter participado de fraudes


Para o Ministério Público, sua negativa é pouco crível. Em audiência, Ceconello não reconheceu como suas algumas assinaturas em documentos de licitação das quais participou junto à Múltiplos.

A Promotoria entende que, apesar disso, “outros elementos ligam ele inevitavelmente ao esquema”.

Um desses elementos é o fato de que na maior parte das licitações alegadamente fraudadas era necessária a apresentação de certidão do Conselho Regional de Engenharia (Crea). Essa certidão só pode ser obtida pelo próprio engenheiro da empresa, mediante senha pessoal e intransferível.

“E, quando a Múltiplos entregava à SDR a documentação e a proposta da Setorsul, ela nunca teve qualquer problema em conseguir essa certidão do Crea, emitida por Murilo Cecconello”, pondera o promotor, na petição inicial da ação penal.

“Ou seja, é impossível que Ceconello tenha sido vítima do esquema, como ele afirmou, pois, como se viu, ele extraiu certidões do Crea e entregou à Múltiplos, certidões essas que foram parar nos procedimentos fraudados”.

Em operações de busca e apreensão realizadas pelo Gaeco, foram encontradas, na Múltiplos, cópias de documentos da Setorsul, devidamente autenticadas. Segundo o MP-SC, não seria possível que a empresa tivesse acesso a esses documentos sem o auxílio de Ceconello.

Outro elemento juntado pelo MP para comprovar conluio entre empresas é documentação emitida pelos cartórios, as quais mostram de onde partiram as solicitações de documentação: e-mails da Múltiplos receberam certidões da Setorsul e da Britagem Barracão | Foto: Reprodução

A Setorsul nas obras públicas

Ceconello relatou que a Setorsul surgiu após ele e um sócio enfrentarem problemas com sua antiga empresa, a Setor Engenharia. Com dívidas se acumulando, eles não conseguiam mais tirar certidões negativas para participar de licitações.

A Setor foi encerrada e eles abriram a Setorsul, em nome de suas esposas, já que os seus estavam “sujos” perante o mercado. Ceconello, então, assumiu a responsabilidade pela atuação da empresa em concorrências públicas.

Sua empresa atuou em Brusque durante bastante tempo, sobretudo durante o governo Ciro Roza, e não executou mais obras com a troca de governo.

“Na transição de governo eu não era muito bem quisto porque eles achavam que eu era da ala do Ciro Roza, mas eu sou um cara que sou apartidário”, disse, em depoimento.

Ele relata que só começou a ser convidado quando fez trabalho comunitário para a prefeitura, com laudos e avaliações de áreas de risco para a Defesa Civil.

O empresário diz que não sabe como sua assinatura foi parar em diversos documentos da Setorsul encontrados entre os papéis da Múltiplos, no bairro Guarani, entre eles, cartas-proposta para participação em licitações do governo do estado.

Ceconello negou ter havido qualquer tipo de combinação entre as empresas, e se disse surpreso com a descoberta de documentos e assinaturas dele que considerou falsificados.