“O pior de envelhecer é que não se envelhece” dizia o escritor Oscar Wilde, tratando de sinalizar que com o passar dos anos as pessoas sentem uma espécie de disfunção, uma falta de sincronia entre o que se pensa e deseja com o corpo físico que carrega uma série de cicatrizes e sequelas de décadas de vida. 

O ser humano que consegue passar seis décadas de vida sem nenhuma doença, nenhum trauma, sem dores articulares nem problemas mentais, sem cirurgias e sem necessidade de usar medicamentos de uso crônico, em plena capacidade física de correr uma meia maratona e totalmente lúcido pode se considerar um ganhador da loteria, a melhor loteria possível, a loteria da saúde, uma conjunção entre fatores genéticos, sociais e ambientais.

“A idade é uma traição do corpo” complementava Wilde, apesar que a maioria das pessoas vai sentindo aos poucos os sinais do envelhecimento, não são raros os casos em que o sujeito toma ciência da sua idade avançada subitamente, de um dia para outro, geralmente ao completar mais uma década de vida, aos sessenta ou setenta anos. 

Lembro de uma paciente que entrou numa crise emocional severa ao acordar no dia de seu septuagésimo aniversário, olhou-se no espelho e só então reconheceu que toda uma vida se passou. Nesse momento, despida de filtros e maquiagem ,se  reconheceu de forma abrupta como idosa e esse fato a fez entrar numa crise depressivo-ansiosa que se prolongou por anos.

Na nossa infância todo adulto que estivesse com mais de quarenta anos já era considerado velho, isso mudou muito com o aumento da expectativa de vida em quase todos os países do mundo, se considera que só na segunda metade do século XX a expectativa de vida aumentou em 30 anos, é uma conquista sem precedentes. 

Cabe aqui lembrar que expectativa de vida não tem o mesmo significado que longevidade. A longevidade está relacionada aos anos potenciais de vida que uma espécie é capaz de alcançar, está determinada principalmente pelas características biológicas e genéticas da espécie. 

A espécie humana tem o potencial de alcançar os 120 anos de idade (embora poucas pessoas tenham superado essa idade e também poucas atingem essa idade), a longevidade não tem mudado desde o aparecimento dos primeiros sapiens. O que tem mudado é a expectativa de vida ao longo dos tempos com o avanço de uma série de condições como uso de água potável, esgoto sanitário, avanços na medicina e no atendimento primário em saúde, acesso a alimentos saudáveis, etc. 

No começo do século 21, prevendo os avanços da biologia molecular e das terapias gênicas os cientistas previam que pelo ano de 2050 a expectativa de vida em países do primeiro mundo chegaria aos 120 anos, está claro que essa promessa não será cumprida pelo menos para essa data. Além disso haverá uma série de fatores de bioética para serem resolvidos como o fato de ter países com altas taxas de mortalidade e ao mesmo tempo outros que conseguiriam prolongar a vida dos seus cidadãos idosos. Não nos enganemos, terapia gênica para prolongar a vida terá um custo de milhões de dólares.

No Brasil no ano de 2019 a expectativa de vida era de 76,6 anos, com a mortalidade provocada pela pandemia abaixou para 72,2 anos. 

Atualmente o Brasil ocupa o octogésimo lugar no ranking de expectativa de vida da ONU, há muito portanto para melhorar.

A sociedade moderna tem colocado num pedestal o culto ao corpo perfeito e à juventude ao mesmo tempo que coloca aos idosos no esquecimento. 

Há poucas politicas públicas que favoreçam as pessoas da terceira idade, deixamos muitas vezes de aproveitar pessoas que detém muitos conhecimentos, experiências e sabedoria, temos colocado aos aposentados no escanteio, uma grande parte deles tem que continuar trabalhando porque não conseguem se sustentar com o valor da aposentadoria. 

Os anos que eram para ser mais tranquilos, com momentos de lazer, para poder curtir família e amigos se transformam em anos difíceis em que há que trabalhar mesmo carregando uma serie de doenças que se acumularam ao longo da vida.

O desinteresse da sociedade para com o idoso é evidente ao perceber a escassez de serviços médicos especializados no seu atendimento como clínicas geriátricas, casas de repouso, residências para idosos, etc. e ao mesmo tempo existe muita oferta de clínicas de estética, cirurgia plástica, implante capilar. 

Se estamos falhando em nível coletivo, em nível individual percebemos uma grande preocupação das pessoas na hora de encarar suas últimas décadas de vida. 

Pacientes com mais de 60 anos perguntam o que devem fazer para ter uma velhice boa, essa preocupação na verdade tem que começar décadas antes porque é nas primeiras décadas de vida onde devemos ter os cuidados em saúde e estilo de vida para poder chegar aos 70, 80 anos com vitalidade e principalmente conseguindo ser autônomos nos afazeres do dia a dia. 

Para ter uma velhice saudável não há receita pronta nem remédio miraculoso, podemos esquecer as vitaminas e as terapias quânticas (charlatanismo). 

Torça para ter sido beneficiado por uma genética familiar sem tendências para sofrer de  doenças crônicas, considere algo imprescindível a prática de atividades físicas regularmente, mantenha sua dieta rica em vegetais, frutas, durma bem, mantenha seu cérebro ocupado com atividades como leituras variadas, escutar música, assistir filmes, mantenha-se socialmente ativo e não deixe de continuar tendo seus pequenos projetos de vida.

Uma das melhores definições de velhice diz que quando as lembranças substituem os projetos significa que a velhice chegou.

O grande desafio para todos não consiste em ter mais anos de vida e sim em dar mais vida aos nossos anos.