Lado a lado elas esperavam algo. Já haviam visto a TV por uma semana inteira. Eram férias. Não deveriam fazer nada. Afinal, esperaram por isso o ano inteiro. Mas naquele instante, desligaram os aparelhos que as conectavam com o mundo. E permaneceram ali, sentadas naquele sofá marrom a olharem para o nada. Não olhavam uma para a outra. Havia um estopim a ser aceso a qualquer momento…e isso significava perigo. O olhar era como uma faísca a acender a chama e elas não sabiam, mas desconfiavam, que podia provocar desordem.

Tendo feito um acordo tácito para o silêncio. Agora mantinham-se ali. Largadas naquele sofá que conhecia muito bem suas posturas e o desconforto de seus corpos.

Mudavam de posição repetidamente. Ora deitavam-se e permitiam que suas pernas se entrelaçassem, para poder aproveitar o conforto do espaço de forma vertical. Depois sentavam-se eretas, olhando para lugar nenhum e todos ao mesmo tempo. Eretas, encostadas na maciez do tecido. Distantes uma da outra, usando os lados simetricamente opostos do sofá, por algum momento ficaram a pensar em si mesmas, ou em sonhos rarefeitos.

Mas havia uma urgência em ambas. Então, as pernas se cruzavam. Os braços se abriam. Os chinelos caiam dos pés. Os cabelos amarfanhados precisavam de pente e de xampu.

Mantinham os óculos, pois ambas enxergavam mal, prontas para ver o que quer que fosse que as tirasse daquele tédio.

Uma delas deixou cair os ombros e sentou na beira do sofá. Já a outra deitou-se encolhendo as pernas em posição de feto. O silêncio só era interrompido pelo barulho que vinha da rua.

Músicas indistintas. Péssimas escolhas. Crianças com seus gritos guturais de alegria. Carros testando os motores numa revanche mútua. Ás vezes um ronco de tempestade. O ritmo repetitivo do ventilador. E o calor…ah, o calor a manchar suas roupas, a destilar os cheios incompreensíveis de seus corpos vivos.

As horas passaram. Lentas. Caprichosas. Intolerantes….

Em algum momento, uma delas começou a puxar um fio que se desprendia do tecido do sofá. A outra, talvez por inveja ou falta do que fazer, começou a puxar outro fio, do lado oposto. E ambas, contentes por ter algo para fazer, foram abduzidas por essa tarefa…e foram puxando o fio…e foram puxando o fio…e foram puxando o fio………

Algumas horas depois, já de pé, continuaram a puxar, selvagemente, cada uma o seu fio e conseguiram, depois de muito esforço, muito suor e movimentos corporais intrépidos e ginásticos desmanchar de vez aquele sofá.

Pararam e finalmente tiveram a coragem de olhar uma nos olhos da outra. Deram-se as mãos e vivas, felizes, e compreensivelmente esperançosas saíram porta a fora e foram viver a vida.


Silvia Teske
– artista