Que caminho é esse que percorremos agora? Algo nos cenários muda constantemente. Em nada mais podemos ancorar. Somos barcos a navegar sem rumo certo. Ansiamos por um porto onde parar, e negamos mergulhos profundos. Acredito que o hábito de sermos reféns de prisões douradas nos tirou (e tira ainda) o gosto pela aventura. Como reféns nos acostumamos a viver a prisão como proteção. Ledo engano esse nosso, de acreditar que instituições nos asseguram melhor vida. Aprendemos duramente que fomos enganados, pois nada é seguro quando é controlado. Tivemos anos de encarceramento, correntes de ouro que impediam passos que não fizessem parte da norma. Mas o que é a norma, senão uma forma devastadora de prisão? O cenário político e econômico que hoje se mostra, nos faz entender das balelas que nos iludiu por tanto tempo. Nós não queremos mais isso!!!

Mas, ao saber disso, que outra solução nos aparece? Nenhuma. Caminhamos com os olhos menos seguros em cenários de incertezas. Nos vemos órfãos…mas não queremos ser órfãos. Acreditamos a vida inteira que ser órfão é algo desalentador, sofrido, temeroso. Em nenhum momento a orfandade foi vista como possível liberdade, como possível dono-de-si-mesmo. Pois isso nos foi passado como individualismo, como egoísmo. Mantemos um medo absurdo de sermos livres e por isso mesmo, criamos slogans inalcançáveis para a ideia de liberdade. Como se liberdade fosse negar o outro, pisar no outro, esquecer o outro em um exercício egocêntrico. Não queremos ser órfãos, porque não sabemos ser órfãos.

Por não saber, vivemos nessa torrente constante de busca a o que nos apegar. Numa emergência absoluta de voltarmos a ser reféns, voltarmos a ter uma prisão, uma proteção. Embarcamos em mandatos aparentemente estoicos para fingir a nós mesmos que pertencemos a algum lugar, que não estamos indefesos diante do mundo.

Penso, que este momento de orfandade, talvez seja um momento propício para encararmos a nós mesmos de frente. Sem espelhos que reflitam prosopopeias ensaiadas, mas olhando para dentro e assumindo que somos únicos e com um poder imenso. Que para exercer esse poder não precisamos negar o outro, mas ao contrário, é no outro que vivo, que manifesto, que não sofro como órfão, mas que, é nele que corajosamente, podemos deixar de ser reféns e admitir que podemos ser livres, e que liberdade é ser quem você é, quem você pode ser.

Como diria Fernando Pessoa “Navegar é preciso…viver não é preciso…”. Que possamos ser um barco a navegar em mares proibidos. Às vezes temerosos, noutras pura maravilha. Que nossas extravagâncias não sejam apenas panfletárias, mas que sejam transparências de nosso interior. Que tenhamos âncoras inventadas por nós, portos criados por nós mesmos, onde se preciso for, abandonemos o barco, para mergulhar no infinito de nossos desejos.


Silvia Teske
– artista