João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Empréstimo consignado, ontem e hoje

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Empréstimo consignado, ontem e hoje

João José Leal

A imprensa tem noticiado o assédio indecoroso de alguns bancos a muitos aposentados. Não basta o baixo valor da aposentadoria, na maioria dos casos na casa de um salário mínimo. Esses aposentados têm sido bombardeados por incessantes telefonemas, geralmente, na hora do almoço ou logo depois, quando o velho inativo está descansando, tirando aquele cochilo durante a sua mais que merecida sesta.

Não tem jeito. Quem tem telefone acaba sendo encontrado. Muitas vezes, para ser perturbado, incomodado por vozes desconhecidas e inconvenientes. É o caso da oferta de empréstimo consignado que os bancos oferecem freneticamente. Sabem que o retorno é garantido pelo INSS, responsável pelo desconto das suaves e intermináveis prestações, como diz a propaganda bancária. Quando o bom aposentado atende ao chamado, escuta aquela voz macia, aveludada, de funcionárias bem treinadas, portadoras de uma conversa matreiramente articulada para dosar a pílula de uma oferta impossível de ser recusada.

Então, depois daquelas frases perfumadas, decoradas, centenas de vezes repetidas nos ouvidos de outras vítimas, vem a proposta do empréstimo com valor já calculado e do tamanho da capacidade de endividamento do pobre aposentado que, certamente, ficará mais pobre. Mas, não faz mal porque, pobre, do dinheiro sempre precisa, conta sempre tem para pagar conta e alguma coisa sempre está a precisar. E a voz aveludada, vinda do outro lado da ligação garante prestações a serem descontadas sem qualquer problema, do valor mensal da aposentadoria.

São milhões de aposentados endividados, engatados nessa corrente bilionária dos pequenos empréstimos sob consignação, seguramente pagos, repassados ao banco credor pelo INSS. É a seguridade social a serviço da segurança bancária! Podemos estranhar e até reprovar essa parceria público-privada. Mas, está prevista em lei do governo do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva que, pai dos pobres, não se furtou a dar a sua grande contribuição para o endividamento dos milhões de aposentados brasileiros.

No entanto, parece que no passado já foi pior. Em sua edição de 03.07.1915, a Gazeta Brusquense transcreve notícia de um jornal do Rio de Janeiro, denunciando “a anarquia que se passa na nossa administração pública, pela agiotagem que campeia pelas pagadorias do Thesouro”.

Diz a nota que agiotas emprestavam dinheiro para os funcionários públicos e, com a maior liberdade, frequentavam os corredores das repartições para cobrar o pagamento dos seus créditos na boca do caixa. A reportagem acusava “o chefe desses sugadores dos magros vencimentos do funcionalismo de chegar ao desplante de entrar pelas pagadorias para determinar a forma do pagamento a este ou aquele, segundo as suas conveniências, especialmente, a si próprio, agiota-chefe, estranho e pernicioso ao serviço público”.

Como se vê, 100 anos se passaram e os nossos aposentados, funcionários ou não, continuam endividados e dependentes de empréstimos. Só que agora são devedores dos bancos e agências de crédito, que contam com a lei e com administração pública para garantir o recebimento das prestações.

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