O ano começa, mas parece que nem terminou. De uma certa forma é interessante que não haja essa ruptura fantasiosa, onde as férias criam um parênteses nem sempre auspicioso. É óbvio que temos que ter uma parada na loucura acelerada de nosso cotidiano. Aliás, cada vez mais rápida e sem reflexão. Mas, fico pensando se essas “pausas” não poderiam ser mais frequentes e menos longas… Será que não aproveitaríamos mais? Será que não conseguiríamos afastar um pouco o estresse, mas sem perder o laço de nossas intenções?

Sinto uma coisa bastante esquisita quando recomeço minhas atividades no início do ano. Um misto de expectativa com uma preguiça avassaladora. Eu prefiro trocar a expectativa por desejo, por vontade, por prazer… e penso que uma boa maneira de encarar o cotidiano de maneira mais feliz seria nos conectarmos à ele. Se mantivermos nossas escolhas que nos fazem vivos e em trânsitos e compartilhamentos. Atentos ao que vivenciamos durante o ano que passou (acabou?), podemos continuar nossos sonhos, sem rupturas ilusórias de começar de novo.

As coisas não terminam de um ano para outro, o ano em si não é o fim de nada, a não ser datas no calendário. Penso que respirar pausas, férias, repouso, diversão não deveria ser uma obrigação com data marcada.

Ou, pelo menos, não ter essa pressão de fazer diferente, de cobrança de um novo status, seja financeiro, amoroso ou mesmo mental. Parece aquela busca de sentido em outra coisa que não seja simplesmente o ato de viver o dia-a-dia. Parece que o sentido da vida está em algo além dela própria. Parece que a vida tem que ter sentido para ser bela, triunfante, digna de ser divulgada. Parece que não basta viver, mas tem que ter prêmio.

E as férias de final-início de ano soam como isso: o que eu tenho que fazer para dar sentido à minha vida? Como posso melhorar o que não consegui viver no ano anterior? Como vou ser feliz? Como vou ficar rica? Como vou trabalhar menos? Como vou ter mais saúde…? E assim por diante. Tudo se concentra naqueles dias (7, 10, 15, 30….) em que as questões existenciais surgem e retiram mais da metade do prazer das próprias férias com a preocupação de começar tudo novo, novíssimo, e com muito sucesso!

Preferiria poder viver meu dia a dia com pausas encantadoras e com entregas sem culpa. Não ter que esperar o trânsito louco para as praias para sentir o cheiro gostoso do protetor solar. Nem esperar nevar na Europa para poder ver a Torre Eiffel. Gostaria de poder me deitar no sofá e ver todos os filmes, ler todos os livros, desenhar, beber cerveja, espumante, vinho… beber água de coco e sentir o cheiro da floresta… em qualquer dia da minha vida, sem ter que me preocupar com o que serei obrigada a fazer quando voltar para o cotidiano.

Ser livre para escolher trabalhar nas coisas que me fascinam, e folgar, quando as delícias de meu entorno, e meu ser andarilho desejar visitar novas estações da alma.


Silvia Teske
– artista