Este ano nem dá para dizer que o carnaval está chegando. Porque a onda de “bloquinhos” fez com que a mídia e as ruas entrassem no clima com antecedência, criando um ambiente aparentemente alegre e simpático. Talvez muita gente discorde – pelo jeito, em São Paulo, a falta de planejamento causou um bocado de dor de cabeça em quem tenta se movimentar normalmente pela cidade, nesses dias de pré folia. Sem falar nos abusos e odores desagradáveis, para ser bem phyna…

E tem muita gente que se adianta aos problemas mais sérios. Como o assédio. Preste atenção na descrição deste grupo aí abaixo, que começou atuando no carnaval do Rio de Janeiro e que, através de crowdfunding, começou a expandir sua atuação por outros estados.

Somos um coletivo, um movimento contra o assédio. Lutamos para que todas as mulheres possam andar nas ruas, nos blocos, nas festas, nas faculdades, em casa ou no trabalho, como bem entenderem.

Transformamos nossos corpos em outdoors da nossa luta, produzindo, usando e distribuindo tatuagens temporárias com os dizeres: Não é Não. Uma frase simples, direta, óbvia mas que ainda precisa ser repetida constantemente. Exigimos respeito aos nossos desejos.

É realmente óbvio. Ao mesmo tempo, é inquietante. Mulheres precisam “tatuar” no corpo essa verdade tão simples: quando dizemos não, queremos dizer não. Pode ser carnaval, pode ser show, pode ser balada: não é não. Podemos estar com muita pele de fora, podemos estar dançando sensualmente, podemos ter bebido demais: não é não. Não existe nada que justifique ultrapassar os limites pessoais de uma mulher – se quisermos, podemos ampliar isso para qualquer gênero: não há nada que justifique ultrapassar os limites pessoais de uma pessoa. Não está liberado o beijo contra a vontade, a passada de mão, o assédio ou abuso, sob qualquer forma. Aprenda. Não só não é não… como é necessário um sim. Uma concordância. Não vale achar que quem cala consente.

Ah, mas o mundo está chato. Não se pode fazer nada. Essas mulheres não estão abertas à paquera, elas não querem saber dos homens”. Como assim, cara pálida? Será que a capacidade masculina de aproximação é assim tão paleolítica? Tem que puxar pelos cabelos, tomar posse do corpo na marra? Não tem conversa, olhar, sorriso, sutileza? Meninos, moços, homens, senhores: melhorem. O mundo atual está requisitando de vocês um passo adiante na evolução. Aquele passinho que diz que o contato com a mulher, até no carnaval, não é um direito seu. Você tem que conquistar aquele beijo, aquele toque. Enquanto você não chega nisso, vamos esfregar na sua cara: não é não.

Ah, sim: se você é do carnaval, fique de olho e não permita que ninguém sofra assédio. Não tenha vergonha de se intrometer em situações constrangedoras. Sem confrontos. Faça de conta que conhece a moça assediada, puxe pela mão, diga que é bom tê-la encontrado no meio da multidão e que tem um monte de amigos esperando, ali pertinho. Tire a pessoa de perto do assediador, o quanto antes. Assim, a única pessoa que não vai conseguir se divertir é quem ainda se acha no direito de invadir limites alheios. Ainda.

Fica uma ideia: se você não tem acesso às tatuagens temporárias, vale escrever um não é não com canetinha em algum lugar visível do seu corpo. Um acessório útil para a sua fantasia.

PS.: A página da revista Azmina, que já foi alvo de conversa nas Beltranas, também tem uma campanha contra o assédio no carnaval. Quanto mais, melhor!


Claudia Bia
– jornalista e não-carnavalesca.