Uso tal estratégia há um ano, e cada vez aplicada fico satisfeita. Embora ela esteja com os dias contados, no momento ando estudando e refletindo sobre como regirei no futuro, na adolescência dos meus filhos, principalmente. Somos os primeiros papis e mamis a lidar com este desafio, não temos passado que nos guie em relação aos limites no uso dos eletrônicos. Parece-me que embarcamos em tempos de transformações extremamente ligeiras e quem sabe, em certos aspectos, não haverá mais pais e mães que possam se referenciar nas experiências passadas.

Sabe o que tenho feito? Desligo o Wi-Fi por algumas horas durante boa parte das três tardes que ficamos em casa e durante boa parte dos fins de semana. Se o sol chama, é para lá que devemos ir, se a chuva faz visita e o dia for quente, vamos para chuva também, e, por fim, existe algo – que não é algo – aliás, é um vazio na superfície, até conseguirmos remover a nata de cima e mergulhar, que vem me atraindo; é a ociosidade. Êta preciosidade!

Percebi que, atualmente, as crianças da minha vida fazem questionamentos aflitivos.

– Tá, mãe, mas o que a gente faz?

– Tem nada pra fazer tia Kali, deixa a gente jogar mais tempo.

Parecia mais fácil quando eram menores, do que ainda são. Os jogos de tabuleiros pulavam das prateleiras, os brinquedos viviam espalhados, caixas de papelão raramente jogávamos fora, cobertores eram cabanas, tudo que é pedaço de sei lá o que, virava sei lá o quê.

Sim, eles crescem, mas os meus beiram os 9 anos e ando com outro na barriga. Espere aí! Quem é que cresce para não brincar e criar? Proponho o movimento contrário. Foi aí que entrou a ociosidade em nossas vidas. De um ano para cá, nos momentos que boicoto a conexão, por alguns minutos bate um desespero, inclusive em nós adultos, pois a casa fica bem mais calma com as crianças voltadas às telas. No entanto, a mágica acontece, logo elas dão um jeito e põem em prática o uso de operações infralógicas, que avalizam as operações de espaço, tempo e causalidade. Elas inventam, elas brincam.

Já encontrei literatura na área psicológica que adverte que o problema não reside no uso dos aparelhinhos e sim na falta de contato com o mundo real. Ou seja, não se trata do contato e sim o tempo de contato. Noções lógico-elementares são prejudicadas quando a criança extrapola as horas diárias. Mas são quantas horas? Quantas vezes por semana? Tudo conta? Televisores, computadores, celulares, videogames, etc.? Sem números exatos, enfrentamos um impasse e necessitamos usar do bom senso para estabelecer as regras. Um bom senso baseado em “feeling”, vix! Nada simples de resolver.

Em uma das pontas da corda a geração analfabeta digital, na outra a geração ultra, mega, hiper, autodidata digital. Deste lado quem é impedido de experimentar as vantagens das redes virtuais e daquele lado quem está preso nelas. No meio, aqueles que se aproximam de um equilíbrio, coisa difícil de encontrar em um cabo de guerra.

Aqui em casa estamos entre a recém maioria – de 51% de domicílios brasileiros com acesso à internet, segundo a Agência Brasil – isso significa, minha gente, que nosso país está bastante comprometido com o não acesso ao mundo virtual. Não é boa notícia a metade da população não possuir este recurso em suas casas. Entretanto, quem o tem deve torna-se o possuidor e não o possuído.

Dia desses li matérias interessantíssimas sobre o uso de aplicativos beneficiar pessoas com danos cerebrais e não o contrário, além de viver na pele a imensa diferença que a internet tem causado na aquisição da língua inglesa nas crianças, entre várias outras vantagens. Nem entrarei no mérito dos jogos online e videogames, responsáveis por boa parte do vocabulário em inglês e português de muitos dos meus pupilos. Enfim, caímos novamente na busca da quantidade ideal de chocolate e qual tipo a ser consumido diariamente, ou o Wi-Fi, ou roupas…

Boicotarei a internet sem fio por aqui vez e outra. É um caminho, por hora, sem muitos conflitos pois meus pequenos não têm a menor ideia do porquê ela simplesmente para de funcionar e logo põem-se a encontrar brincadeiras que os levam para o barranco, o mato, a bola, os gibis. A sensação é boa pacas vê-los enfrentando a frustração, como também a tranquilidade que sinto quando depois de sujos e suados, as telas não lhes farão mal.

Daqui uns anos, quando eles souberem do meu segredo, espero que tenham compreendido a importância do tempo, do mundo real e sozinhos queiram se auto sabotarem. Revelo que tem servido para mim. Pronto, contei mais um segredinho.


Karline Beber Branco
– professora e mãe