E lá fui eu, renovar minha carteirinha de plateia de sofá. Rock in Rio. Ok. Claro, o primeiro final de semana, o mais pop, não me fez realmente ocupar o sofá para dedicar atenção exclusiva a algum show – só parei um pouco para ver a apresentação de Fernanda Abreu no palco Sunset, que foi bem digna.

Mas eu já estava, é lógico, de olho no sábado passado. The Who, uma das bandas mais importantes da História do Rock e da minha história pessoal. Não sou do tempo em que a banda se tornou conhecida, mas sou do tempo do lançamento de Tommy em sua versão filme – que, quando chegou em Santos, fez com que eu emendasse 3 sessões em todos os finais de semana em que ele continuou em cartaz. Minha turma e eu nos escondíamos no banheiro no final de uma sessão e voltávamos para a sala de exibição assim que começava a próxima, pequenos delinquentes que éramos.

Essa memória fez com que, por trás do “senhor” Daltrey, eu veja sempre e ainda o Roger Daltrey em sua versão Tommy… esse que está aí acima, no auge da expressão vazia de quando era cego, surdo e mudo. Ave, Roger!

Fiquei de coração partido por não poder ter a experiência de ver a banda ao vivo, finalmente, ainda que apenas com dois de seus membros originais. Mas foi o que aconteceu. E, pela configuração do Rock in Rio, não seria lá que eu tentaria matar a lacuna cultural. Não colocar o The Who como headliner foi uma falta de respeito, uma maldade com os fãs, que tiveram que aturar uma multidão de desinteressados aguardando o show do Guns N’ Roses. Para ter uma ideia, um jornalista veterano da área musical como Jamari França, que estava na Cidade do Rcok, simplesmente não conseguiu ouvir o suficiente para se sentir com direito de escrever sobre o show. Ele desabafou no Facebook: “Deviam ter feito como em 2001, a maior parte foi embora e quem gosta de Classic Rock viu um show inesquecível de Neil Young. Aqui foi frustrante, a História do Rock passando no palco e maioria cagando e andando“.

Aqui do meu sofá, salvo as falhas que já conhecemos das transmissões do Multishow, deu para cultivar emoção e admiração por Pete Townshend e Roger Daltrey, cheios de energia aos, respectivamente, 73 e 72 anos. Não são mais os mesmos? Evidentemente. O tempo passa, o tempo passou. Mas o que “sobrou” é mais do que suficiente para transformar o show em uma aula de como o rock deveria sempre ser. Dizem que, no primeiro show, em São Paulo, Daltrey errou a entrada de My Generation e desafinou. Ao vivo, gente, corre-se o risco, em qualquer idade. Que o digam outros shows do RIR.

A dupla sobrevivente sabe também se cercar de músicos que garantem a qualidade – e o tesão – dos seus shows. Quem chama mais atenção, é claro, é Zak Starkey, o baterista filho de um dos bateristas mais famosos do mundo, Ringo Starr… e que teve a sorte suprema de conviver, na infância, com o próprio Keith Moon que está substituindo agora. O mais impressionante é que Zak já tem 52 anos… mas na dinâmica da banda parece aquele moleque que injeta energia explosiva nos veteranos. Decididamente, o terceiro ponto focal do show.

Além dele, a banda conta com mais cinco integrantes: o irmão de Pete, Simon, na guitarra; Jon Button, no baixo; Loren Gold  e John Corey nos teclados;  e o diretor musical e também tecladista Frank Simes. Um time azeitadíssimo.

Repertório? A maioria dos maiores hits da banda estavam lá. Incluindo os temas da franquia CSI, que mesmo o público desatento deve ter reconhecido. Aliás, impossível não trancar a respiração em We Won’t Get Fooled Again, só esperando se Daltrey daria conta daquele grito característico da música. E ele deu. Tivemos dois blocos dedicados às duas óperas rock da banda. Ambos poderiam ser maiores… De Tommy, pelo menos I’m Free poderia ter se juntado a Amazing Jorney, Sparks, Pinball Wizard e See Me, Feel Me. E de Quadrophenia, uma das minhas preferidas, The Real Me, também ficou de fora. Mas não teria, mesmo, como tocar tudo o que a banda tem de melhor. Especialmente em um show ensaduichado entre duas outras atrações, sem direito a bis. Mas, mesmo de longe, ainda estou me sentindo privilegiada por ter feito parte do público virtual desse show único.