Sem apoio, jovens promessas são obrigadas a desistir do esporte

Quando se veem aptos a entrar no mercado de trabalho ou ingressar em uma universidade jovens desistem da carreira de atletas

Sem apoio, jovens promessas são obrigadas a desistir do esporte

Quando se veem aptos a entrar no mercado de trabalho ou ingressar em uma universidade jovens desistem da carreira de atletas

A formação de atletas em Brusque se resume a poucas categorias hoje em dia. Trabalhos de base são feitos com excelência na natação e futsal masculino, mas em determinado momento a história de jovens revelações, seja de qual for a modalidade, se cruzam.

É o caso de três jovens promessas brusquenses que largaram o esporte pela falta de incentivo. Outros que estão surgindo, ainda vivem a incerteza sem saber sobre o amanhã (ver destaque). “Para segurar um atleta hoje, a partir dos seus 16 anos, é muito difícil. Na maioria das vezes, eles optam por trabalhar para ajudar em casa”, diz o técnico de natação José Armando Vasquez Soto, o Bay.

Um dos exemplos é o nadador Lucas Venzon, hoje com 16 anos. Aos 13, já havia sido medalhista de bronze no campeonato brasileiro nas provas de 100 e 200 metros peitos. “Já fui campeão brasileiro e conquistei vários recordes que acredito que até hoje perdurem no estado”, comenta.

Depois de 10 anos dedicados à natação, o atleta desistiu de seguir no esporte para ajudar o pai em um supermercado da família. O fato de querer fazer uma universidade também influenciou. “Fiz quase 10 anos de natação, mas sempre foi difícil, com meu pai bancando. Estava chegando num momento mais profissional com bastante viagens para fora e isso aumentava os gastos”, observa.

Segundo ele, os custos mensais para se manter no esporte passavam de R$ 1 mil mensal. Mesmo com o incentivo da família, o atleta desistiu de dar continuidade ao sonho de ser nadador. “Eu mesmo resolvi parar. São muitos gastos. Nutricionista, competições, material, alimentação. Até já fui atrás de patrocínios, mas nunca consegui alguém para ajudar”, comenta.

A realidade pela qual hoje atravessa Venzon já foi enfrentada também pelo ciclista Henrique Voltolini. O atleta iniciou na modalidade em 2007 e logo se destacou na prova de contrarrelógio sendo medalhista nos Joguinhos Abertos de Joinville. Permaneceu no ciclismo até 2009, quando, sem incentivo, foi obrigado a parar. “Não corro mais faz cinco anos. Eu tinha potencial. O que faltou mesmo foi investimento ou algum tipo de ajuda”, observa.

Segundo ele, em razão disso outros atletas de talento também se perderam pelo caminho. “Da minha época, ficou somente 1 ou 2”, diz.

Atualmente com 24 anos, Voltolini trabalha como funcionário de uma TV a cabo e sente na pele o drama de quem um dia já sonhou em ser um profissional da modalidade. “Hoje, dá aquela saudade. Chega a me bater um desânimo. Procurei me desligar, porque se eu voltar a pegar uma bicicleta sei que vai me dar aquela vontade de largar tudo para voltar a pedalar”, declara. “O sentimento é de saudade, me lembro sempre do início quando vejo alguém pedalando”, afirma.

O atletismo, bicampeão dos Jogos Abertos, também já perdeu uma de suas maiores revelações pela carência financeira. Depois de quatro anos na equipe, Bruna Rocha chegou a tentar sobreviver no esporte disputando por Itajaí. Ficou dois anos na cidade vizinha, retornou posteriormente para mais uma temporada em Brusque, mas sem condições de se manter, foi outra atleta de destaque a entrar nas estatísticas negativas de jovens que deixam o esporte. “Parei porque chega uma época que não tem mais como você se manter. Saí do ‘terceirão’ e precisava fazer uma faculdade. Ganhando R$ 300 por mês não tem como se virar com fisioterapia, alimentação saudável, nutricionista, suplementação. Sem contar as viagens”, observa.

Hoje , com 23 anos, Bruna é formada em educação física e administra um estúdio de treinamento funcional em Itajaí com a expectativa de quem sabe ainda voltar a praticar a modalidade. “Quando a gente pára, fica muito triste. Dá um ‘baque’ porque a gente ama fazer aquilo. Mas agora que já acabei a faculdade e tenho uma estabilidade financeira, penso em um dia voltar”, diz.

A história da atleta na cidade começou quando ela tinha apenas 11 anos. Descoberta pelo técnico João Francisco Nunes em uma corrida de escola em 2006, logo transformou-se em uma das principais revelações da modalidade na cidade disputando as provas de 800 e 1.5 mil metros.

A aposta do treinador no talento da jovem atleta se confirmou. Bruna precisou de pouco tempo para ganhar todos os principais títulos do atletismo que disputou. O auge foi em 2009. “Neste ano, a gente ganhou tudo que podia ganhar.

Ganhei brasileiro em três categorias, menor, sub-23, e até adulto. Fui quarto lugar no Troféu Brasil de Atletismo, maior competição do país”, recorda a atleta. “Em 2009, foi o topo. E a gente não recebia nada, Ganhava uns R$ 200 por mês do seu João (treinador) para poder se virar”, conta. A brusquense ainda lembra que participou de cinco sul-americanos e foi medalhista em três oportunidades. Se orgulha também de ter a oportunidade de disputar o mundial do Catar.

Bruna recorda que quando começou o trabalho do atletismo em Brusque ainda estava começando. Além dela, apenas outras cinco atletas davam os primeiros passos na modalidade. “Entre elas estava a Sabrina Caviquioli, hoje auxiliar-técnica”, observa.

A brusquense comenta que naquela época a situação era precária para quem queria se manter na modalidade. “A gente não tinha apoio nenhum. O atletismo em Brusque não era muito ativo. Não tinha ninguém. Não havia equipe. Buscamos patrocínio, mas era difícil conseguir”.

Quem por muitas vezes deu vida ao sonho das atletas era Rubens Facchini, recorda. “Ele via que a gente não tinha condições e começou a ajudar com dinheiro do próprio bolso. Por isso seu João (Nunes) é tão grato a ele. Aí entrou a RVB Malhas (atual patrocinadora) e as coisas começaram a mudar”, diz.

Mesmo com o apoio do patrocinador máster, a ex-atleta considera que é preciso que mais empresas invistam para desenvolver a modalidade. “Hoje a realidade é um pouco melhor, até porque já existe também o Bolsa-Atleta. Mas ainda é pouco. Falta muita conscientização dos empresários. Para empresa é um ganho, pois o nome é divulgado para o Brasil inteiro. Então, não tem porque não ajudar. Só a prefeitura não tem condições de bancar tudo”, destaca.

Promessas vivem incerteza

A dificuldade de conseguir patrocínios e a incerteza quanto a continuidade no esporte já assusta até mesmo aqueles que mal começaram a competir. É o caso dos jovens tenistas Matheus Buemo, 10 anos, e Natália Tormena, 14. Hoje, ambos acumulam 26 troféus da modalidade somente deste ano.

Buemo faturou 14 títulos. A mãe do jovem brusquense, Eliane Buemo, atualmente é quem banca integralmente os custos do atleta. O mesmo ocorre com Aurélio Tormena, pai da jovem revelação Natália.

Com o nível dos atletas aumentando e consequentemente a necessidade de mais viagens para novos desafios, eles sabem que o custo com os tenistas só tende a aumentar daqui para frente.

Elaine diz que pretende buscar patrocínios a partir do ano que vem, mas tem ciência de que a tarefa não será fácil. “Ele terá mais competições em 2015. Será difícil continuar tirando do próprio bolso. Já estamos nos preparando, pois sabemos que as empresas brusquenses são resistentes em apoiar”, observa.

Com 12 títulos somente este ano, Natália terminou como primeira colocada no ranking catarinense até 14 apenas, apesar de ter somente 13, superando atletas mais velhas. Mesmo assim, vive situação semelhante a de Buemo.

Segundo Tormena, ele chega a gastar cerca de R$ 650 mensais com as competições da atleta. O pai comenta que sofre para conseguir apoio financeiro à jovem tenista. “Desistimos de visitar as empresas porque nunca tivemos êxito. Eles dizem ‘não’ já no início da conversa”, reclama. Segundo ele, a dificuldade é maior por se tratar de um esporte individual.

Para manter a participação de Natália nas competições, Tormena diz que faz um ‘rodízio de pais’ para ajudar no transporte. “As vezes eu levo, em outras o pai de outro atleta leva, e assim vamos, rachando a gasolina”, explica.

Tormena acredita que a filha pode vir a ser uma realidade nacional. No entanto, sem patrocínios, acaba tendo o desenvolvimento prejudicado por perder eventos importantes para o seu desenvolvimento. “O ideal seria ela participar de cinco etapas do Campeonato Brasileiro de Tênis, mas isso somente com apoio”.

A Série

A série ‘Obstáculos do Esporte’ aborda as dificuldades enfrentadas pelos atletas brusquenses para permanecerem no esporte. Foram cerca de 20 entrevistados, de várias modalidades, que propiciaram a produção de cinco reportagens especiais que você verá até sexta-feira nas páginas impressas do MDD. Leia na edição de amanhã a matéria ‘Barreiras superadas’, e conheça atletas que driblaram as dificuldades para hoje brilharem no esporte.

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