Jogadora de futsal luta contra o câncer enquanto entra em quadra pelo seu time em Guabiruba

Com o apoio de família, amigos e equipe, Andresa Paza Ebel disputa o campeonato de futsal da cidade e quer ser inspiração

Jogadora de futsal luta contra o câncer enquanto entra em quadra pelo seu time em Guabiruba

Com o apoio de família, amigos e equipe, Andresa Paza Ebel disputa o campeonato de futsal da cidade e quer ser inspiração

Em 2 de julho de 2022, Andresa Paza Ebel pôde voltar, ainda que por poucos minutos, a pisar em uma quadra de futsal para jogar uma partida do Campeonato de Futsal de Guabiruba, ao mesmo tempo em que combate o câncer de mama. O feito emocionou as amigas do seu time, o Fênix, e foi um momento marcante do 3 a 3 contra o Boos Futsal. Depois de um diagnóstico tardio, ela conta com o apoio da família e dos amigos para vencer a doença e, como a própria jogadora fala, ser motivo de inspiração.

Na verdade, quase ninguém conhece Andresa pelo nome. Na camisa 5 do Fênix, está o apelido: Tatu. A alcunha existe desde quando ela ainda tinha 11 anos e longos cabelos castanhos-claros. Na escola, começaram a chamá-la de Tatuapu, por conta do personagem de mesmo nome interpretado por Claudio Heinrich na novela Uga-Uga (2000-01).

“Eu odiava o apelido. Cortei o cabelo curtinho para ver se paravam, e só piorou (risos).” O “Tatu” ultrapassou os limites da escola quando, em um treino de futsal pelo Cestão, ela estava usando a camisa de sua turma que se formou na oitava série. Havia os nomes estampados. “As meninas perguntaram onde estava o meu nome na camisa e eu disse que estava meu apelido”, relembra, aos risos. Desde então, Tatu abraçou o apelido. “Ninguém me conhece como Andresa.”

No entanto, há uma outra Andresa na família: a filha de Tatu tem o mesmo nome da mãe. Ou, mais precisamente, de uma das mães. Há cinco anos, a pivô do Fênix vive um relacionamento estável em três, com seu marido, Leandro — com quem é casada há 15 anos — e sua namorada, Raquel, que é a mãe biológica da pequena e fez uma homenagem ao dar o nome à filha. A “Desinha” completa quatro anos em julho, e também é apaixonada por futebol e futsal. Já dá seus primeiros chutes e passes e brinca durante os treinos da mãe xará.

“Eu sempre quis adotar, e olha como deu tudo certo. É ‘mamãe Desa e mamãe Keel’, é ‘papai Leandro e papai Thiago’. A gente brinca com isso, ‘coitado de um genro nosso no futuro’ (risos). Não consigo me imaginar sem os dois [Leandro e Raquel]. Dá muito certo. Não escondemos de ninguém. estamos juntos, vamos juntos aos lugares”, comenta, feliz com o respeito que tem da comunidade.

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O Fênix em quadra em 2022 | Foto: Divulgação

Doença

Tatu descobriu o câncer de forma tardia, depois de ter passado pelo que considera negligência médica. A primeira suspeita foi por conta de fortes dores na mama direita, após um acidente durante uma brincadeira com a filha. De setembro a janeiro, ela não recebia o diagnóstico correto, apesar de sentir que havia algo errado. Em 29 de dezembro, percebeu o mamilo “invertido”, sintoma que, aliado às outras sensações que tinha, poderia indicar a doença.

Apenas ao trocar de médicos foi possível chegar à verdade, em 10 de fevereiro: um câncer em estágio três, descoberto pelo mastologista Guilherme Gamba, com base nos exames da radiologista Izabel Grazel.

“Ali, meu mundo meio que desabou. Mas botei meus pés no chão, e disse que vou conviver com esta doença. Vou fazer com que ela se adapte a mim, e não que eu me adapte a ela.”

Uma esperança nova surgiu dias depois, quando Tatu, que trabalha como inspetora de qualidade externa, estava presa no trânsito em Apiúna, a trabalho, e esperava o resultado de um novo exame para verificar de que tipo de câncer de mama se tratava. Pegou o celular, conseguiu acessar o laudo e viu que se tratava de uma variante menos agressiva, que não se espalharia pelo resto do corpo.

O tratamento começou logo depois, com sessões da chamada quimioterapia vermelha, entendida pelos pacientes como aquela que tem os efeitos colaterais mais intensos. Tatu precisou deixar o trabalho de inspetora de qualidade externa e, a princípio, o futsal estaria mais distante de sua vida. Depois do hiato dos Jogos Comunitários e do Campeonato de Futsal de Guabiruba, por conta da pandemia, era bastante improvável que ela voltaria a jogar num futuro próximo.

Paixão

Tatu nasceu em 30 de agosto de 1988 e foi criada no bairro Poço Fundo. Por muito tempo fez um “revezamento” de casas, morando em diversos períodos diferentes com o pai, em Brusque, e com a mãe, em Guabiruba, cidade pela qual é apaixonada. “O futebol e o futsal sempre foram partes importantes na vida de Tatu. “Sempre fui criada como molecona. Não tinha primas para brincar, então brincava com os primos, de futebol a “polícia e ladrão”, estas coisas. Desde pequena sou apaixonada por futebol.”

“Quando eu tinha 14 anos, fui morar com a minha mãe. Fui morar com minha mãe em Brusque e fiz um teste no Cestão [time de futsal]. Passei no teste e comecei a jogar. A gente jogava por tudo. Depois, o Cestão acabou parando o apoio, e meu treinador na época montou a Associação Brusquense de Futsal Feminino (ABF). Jogávamos os Jogos Abertos, Joguinhos Abertos, todas as competições.”

Tatu relata também que, na ABF chegou a ser colega de equipe de Daniela Civinski, dirigente responsável pelo Barateiro Futsal. “Eu saí da ABF, e meses depois a Dani montou o Barateiro a partir daquele time. Então eu meio que joguei no Barateiro (risos).”

Depois de um tempo sem jogar competições a sério e de ficar apenas na “brincadeira” com o futsal, veio o convite para atuar pelo Fênix no Campeonato de Futsal de Guabiruba, em 2016. Jéssica Bretzke, a Pepe, fez a proposta, que foi logo aceita. Naquele mesmo ano, com Tatu no elenco, o time foi campeão pela sétima vez, depois de 2007, 2008, 2010, 2011, 2012 e 2013.

Tatu joga como pivô, a posição mais avançada em quadra, geralmente de costas para o gol adversário. Nasceu destra, mas tem completo domínio das duas pernas para o chute. “Faço gols, mas minha função é distribuir as jogadas. Sinto mais orgulho quando dou a bola redondinha para a Pepe, para a Duda [colegas de equipe]. Em 2019, me lembro de um toque tão lindo para a Duda, ela pegou na veia e foi um golaço.”

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“Força, Tatu”. Uniforme do Fênix tem mensagem de apoio à pivô | Foto: João Vítor Roberge/O Município

Recuperação

Aos 33 anos e próxima do 34º aniversário, Tatu não se importa sobre as consequências que o câncer traz à aparência. “Posso ficar careca, um peito só, não ligo. Falei até para minha médica: ‘se quiser tirar os dois, tira’ (risos). O importante, para mim, é viver. Não ligo sobre ficar sem cabelo.”

“Sempre levo tudo pelo lado bom, pelo lado positivo. Sempre quis saber como ficaria careca. Claro que câncer é complicado, não é fácil. Mas se precisa de quatro coisas: fé em Deus: não pode faltar de jeito nenhum; fé na medicina, porque a medicina está em uma evolução incrível; força de vontade: não pode abaixar a cabeça de jeito nenhum. É ‘eu vou vencer e deu’; e o apoio da família.”

Em todo este processo de recuperação, Tatu se incomoda com o sentimento de pena sobre si, mas também afirma não se apegar a estas reações. “Não tenho vergonha de ter câncer. Mas tem esses olhares [de pena]. Quero que as pessoas olhem pra mim e pensem “pô, essa é guerreira”. Quero voltar a trabalhar, tatuar no peito que superei o câncer. Ser motivação para as pessoas.”

Tatu segue o tratamento em Blumenau, no Hospital Santo Antônio, sob os cuidados do oncologista Gustavo Gastal e da mastologista Bianca Silveira Sá. Ela aguarda também a última sessão de quimioterapia, que deve ser realizada no meio de setembro. A partir de então, com o prazo adequado, entre outubro e novembro, poderá passar pela mastectomia, a retirada da mama direita. E, a partir de então, o último obstáculo aguardado é a radioterapia.

Pelos médicos que a diagnosticaram e também pelos que vêm comandando o tratamento, Tatu foi encorajada a seguir a vida da maneira mais normal possível. Como ela relata, tinha mais “tempo livre”. Quando teve condições, conseguiu reconstruir o muro da própria casa, no bairro Guabiruba Sul, com a ajuda do marido, Leandro. Além disso, ela não foi impedida de seguir fazendo o que mais gosta: jogar.

Pouco depois do diagnóstico do câncer, em fevereiro, começaram os Jogos Comunitários de Guabiruba. Tatu queria muito participar, mas os efeitos da quimioterapia vermelha impediram que ela pudesse estar presente. A frustração era grande, afinal, o último ano com competições municipais do tipo havia sido 2019. em 2020 e 2021, houve o hiato por conta da pandemia.

Mas, no caso do Campeonato de Futsal de Guabiruba, a história mudou. Já sob as sessões da quimioterapia branca, que tem efeitos colaterais menos pesados, a pivô vislumbrou uma chance de voltar a jogar.

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“Vou dar um jeito de jogar” | Foto: João Vítor Roberge/O Município

“Pensei: ‘vou dar um jeito de jogar’. Mandei mensagens pra Pepe [capitã da equipe]: minha situação é essa, e vou tentar. Porque não sei como vai ser minha reação da quimioterapia, mas vou tentar”. Pepe lhe entregou uniformes de comissão técnica para a temporada 2022.

“Ela é bem empenhada, sempre vem nos treinos, dificilmente falta. Se falta, é porque realmente não está bem, ou está machucada. Mas ainda assim, ela aparece, vai para apoiar. Ela é sensacional como pessoa, atleta, amiga. Excepcional mesmo. Ela está mais firme e forte do que todas nós imaginávamos. Estamos apoiando ela muito, em tudo”, comenta a capitã.

A surpresa para Tatu foi ver que, nas costas de cada camiseta do Fênix, estavam estampados o laço rosa, característico da luta contra o câncer de mama, ao lado da mensagem “Força, Tatu.” A jogadora não conseguiu segurar a emoção ao saber da homenagem.

“Se um dia eu sair desse time, não jogo em mais nenhum. A gente cria uma amizade tão grande, e começa a ser como uma família. E também, depois dessa homenagem não tem como, né? (risos).”

Tatu entrou em quadra nos dois primeiros jogos do Fênix, em 2 e 9 de julho. Atuou por poucos minutos diante do Boos e do Aliadas do Futsal, em partidas terminadas em 3 a 3 e 2 a 1. O time segue invicto na competição. No dia 7, ela havia passado por uma sessão de quimioterapia.

A jogadora relata que tem que “escolher bem” em quais jogos vai atuar, dependendo do nível de disputa física. “Eu não posso me machucar, e os jogos são muito disputados, têm times muito fortes. Conheço as meninas, claro que ninguém vai entrar para me machucar, mas é jogo, todo mundo quer ganhar. Elas não podem pegar mais leve comigo, eu nem iria querer isto.”

Passadas as ansiedades dos primeiros minutos em quadra, as expectativas são de continuar ajudando o Fênix e permanecer lutando firme. “Claro, não estou 100%, mas com meus 80%, eu vou conseguir alguma coisa, me sinto bem para contribuir. Não é como antes, eu treinava mais, e não tivemos competição em 2020 e 2021. Mas quero jogar, quero ajudar” comenta, sem tirar a pulseira com a palavra “esperança”, que ganhou da cunhada em fevereiro, quando foi diagnosticada.

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