Voluntária aluga residência para oferecer refeições e banhos a andarilhos de Brusque

Maria Neide Heil alimenta 21 pessoas, que, se não fossem por ela, talvez não teriam acesso a pratos básicos, como feijão, arroz, carne e farofa

Voluntária aluga residência para oferecer refeições e banhos a andarilhos de Brusque

Maria Neide Heil alimenta 21 pessoas, que, se não fossem por ela, talvez não teriam acesso a pratos básicos, como feijão, arroz, carne e farofa

O barulho do abre e fecha de panelas que ecoa da casa branca de janelas pretas localizada em uma das extremidades da rua Anita Garibaldi, no bairro São Luiz, horas antes do meio-dia, é semelhante ao som produzido por muitas residências de Brusque no mesmo horário. O local, entretanto, tem um diferencial. Chamado de Casa Branca pelos frequentadores, o espaço recebe moradores de rua de segunda a quinta-feira.

No local, eles tomam banho e almoçam. A comida, preparada com zelo e carinho pela idealizadora da casa, Maria Neide Heil, de 43 anos, alimenta 21 bocas que, se não fossem por ela, talvez não teriam acesso a pratos básicos, como feijão, arroz, carne e farofa.

Enquanto conversa com a reportagem, Neide – como prefere ser chamada – não desgruda os olhos do fogão. Às 11h30, o preparo está na reta final e ela não pode se dar ao luxo de deixar o alimento passar do ponto, em especial, para manter a fama de boa cozinheira que conquistou ao longo dos dois anos em que mantém a Casa Branca ao lado do marido, Marcos Heil, de 45 anos, e das filhas Marine, de 20, e Samara, de 17.

“Eu já faço esse trabalho de ajudar moradores de rua há mais ou menos 10 anos. Fiz em Balneário Camboriú e Navegantes, antes de fazer em Brusque. Quando comecei, distribuíamos marmitas para os moradores de rua. Quando foquei só em Brusque, primeiro dávamos lanches para eles, então resolvemos alugar essa casa e fazer almoços”, conta Neide.

Paranaense de Ortigueira e radicada em Brusque há 35 anos, Neide dedica boa parte da semana aos moradores de rua. Nos dias em que fornece a comida, ela chega ao local por volta das 9h30 e sai apenas depois que todos almoçaram. Antigamente, Neide trabalhava com medicina ocupacional e estética, agora, porém, trabalha apenas em prol dos necessitados.

“O que realmente me fez querer ajudar é que me chamava a atenção quando eu ia comer em algum restaurante ou bar e via os moradores de rua pedindo comida. Eu me colocava no lugar dessas pessoas e via que era muito difícil a vida deles”, diz.

A cada cinco meses, é utilizada uma tonelada de alimentos nos almoços fornecidos na Casa Branca. Os produtos chegam ao local por meio de doações de amigos, de conhecidos, dos próprios moradores de rua e também da própria família de Neide, que mantém uma oficina de pintura automotiva no Centro. Além dos alimentos, Neide também arrecada utensílios, roupas, toalhas e produtos de limpeza e de banho. Esses materiais são indispensáveis porque ela orienta os moradores de rua a tomarem banho antes das refeições.

“Nem todos tomam banho todos os dias. Alguns não gostam de tomar e pra esses eu preciso explicar que se todos estão limpos na mesa, eles não podem ir sujos. Então eles tomam. Alguns tomam em um dia sim e no outro não. Segunda-feira é um dia que todos tomam, porque geralmente ficaram o fim de semana sem banho”, explica Neide.

A maioria dos 21 moradores de rua que passam pela Casa Branca mantêm algum vício, seja em álcool ou em droga. Segundo Neide, alguns estão na condição de rua devido a isso. Há também os que tiveram passagem pela polícia e, por isso, foram rejeitados por suas famílias e encontram dificuldades para se manter.

A bebida, para o morador de rua Carlos Alberto da Silva, o Amarelinho, de 35 anos, é um alento não apenas nos dias de frio como também nos dias em que a tristeza se sobrepõem aos outros sentimentos. Ele é uma das pessoas que almoçam diariamente na Casa Branca. Natural de Itajaí, ele está na condição de rua há 15 anos em Brusque.

“Eu moro na rua desde os 12 anos de idade, que foi quando minha mãe e meu pai faleceram. Comecei a sentir um vazio muito grande e não queria ficar mais em casa e fui pra rua. Eu sentia muita falta principalmente da minha mãe, então também comecei a beber”, conta. “O trabalho da Neide é muito bom. Eu considero essa casa, a minha casa. Não existe lugar melhor. E ela é muito paciente e muito amorosa com todo mundo”, completa Amarelinho.

Palavra de Deus

A Casa Branca não se restringe apenas ao fornecimento de almoço e de banho, Neide também costuma conversar e tentar auxiliar os andarilhos a saírem da condição de rua. No ano passado, por exemplo, 10 pessoas que frequentavam o local deixaram a condição e retomaram a vida.Uma das ferramentas utilizadas por ela na assistência aos moradores de rua é o aprendizado adquirido ao longo dos últimos 12 anos. Desde 2004, ela é pastora. Atualmente, no entanto, Neide não tem ligação com as igrejas do município.

“Pra mim é gratificante ajudar os moradores de rua. E é especialmente muito bom reencontrar, hoje em dia, os que conseguiram sair dessa condição. Há alguns que vêm até aqui cumprimentar e até ajudam doando algumas coisas”, diz. “Eu quero seguir fazendo esse trabalho por Brusque. Sou apaixonada pela cidade e quero ver as pessoas que vivem nela bem e felizes”, completa.

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