#4 Intimidades: proprietário da Embrast fala sobre a relação do esporte de adrenalina com um líder corporativo
Entusiasta da cadeia circular, Denisio comenta que o canudinho pode virar sacola, que pode se tornar inúmeros outros materiais de consumo, até roupa. Mas há uma dificuldade deste mercado: sustentar o discurso do poder público, já que é uma educação que não depende exclusivamente do setor privado. “Proibir o canudinho é mais fácil do que promover educação ambiental nas escolas e colocar a mão na massa da reciclagem para a geração atual e as futuras”, acredita.
Denisio do Nascimento também é um dos pioneiros em Santa Catarina a trazer a pauta de ESG para dentro de sua empresa. ESG – Environmental, social and corporate governance, traduzido do inglês, é o termo para avaliar as políticas internas de governanças ambientais, sociais e corporativas para avaliar até que ponto uma corporação trabalha em prol de objetivos sociais, que vão muito além do interesse pela lucratividade apenas.
Todo o perfil do empresário é diretamente ligado a seu principal hobby em competições a motor. “Ambos exigem escolhas cruciais. O tempo inteiro o piloto está exposto ao fio da navalha, e as emoções são muito similares aos negócios. As escolhas são muito determinantes na competição, e no mercado do mesmo modo”.
André Groh: Como foi a infância em São João Batista?
Denisio do Nascimento: Tenho uma irmã mais velha, e um irmão caçula que fez sua passagem antes de completar sete anos. Cresci no distrito de Tijipió, área rural de São João Batista, numa época que os acessos eram todos por estrada de chão. Próximo a minha casa tinha uma escola, que tinha só o ensino fundamental, e no momento de evoluir para o ensino médio precisei mudar pra Brusque. Morei com minha irmã, e meus pais vieram mais tarde. É uma época muito saudosa, sempre que tem uma folga volto pra visitar esse passado e reviver a infância nesse cenário que marcou minha vida. As brincadeiras eram outras, jogávamos bola e brincava na rua com os amigos. Muitos deles ainda estão lá, outros já se mudaram pra outras cidades também. Eu ia pra escola obrigado, minha mãe era professora e eu não queria decepcioná-la. Na minha juventude lembro que não tinha nada em Tijipió, e se quisesse sair pra conhecer uma namoradinha, era aquela folia pra arrumar carona para outros lugares. Um amigo tinha fusca, e alugávamos para ir em festas como o Humaitá em Nova Trento. Hoje temos ainda nosso sítio em Tijipió, e vamos pra lá aos finais de semana para descansar nesse refúgio.
Foi nessa época que conheceu a Rina?
Não, foi quando estava em Brusque já. Meu pai tinha uma cachoeira que era aberta ao público, e o Jonas Paegle e a Rosalda Paegle iam com as filhas pra lá nos fins de semana. Meu pai tinha uma lagoa com pedalinho, e o Jonas chegava bem no fim do dia às vezes. Eu já tinha recolhido os pedalinhos, e quando ele chegava, meu pai obrigava a colocar os pedalinhos na água de novo. Eu ficava furioso. Não imaginava que mais tarde iria casar com a filha dele. Já na faculdade, uma prima da Rina nos conectou. A Rina tem uma participação muito importante na minha vida empresarial. Ela me deu muita força. Apesar de ser filha de médico, e sempre ter tido muito conforto, minha realidade era diferente. Precisei vender meu carro pra abrir minha empresa, e perguntei a ela se teria problema, e ela apoiou. Eu ia a pé ou de bicicleta visitá-la. Minha casa era Souza Cruz e ela no Maluche. Eu até brinco que a primeira filha de um médico bem sucedido estava namorando um rapaz que ia de bicicleta na casa dela.
Como é o Denisio pai?
Tenho dois filhos, Thiago (11) e Manu (13). São meus parceiros, umas figuras. Os dois gostam de andar de moto e quadriciclo. Busquei sempre trazer um pouco deste meu mundo pra eles. Mas claro, eles são livres pra escolher. Neste último fim de semana teve uma corrida em Rio Negrinho, e a Manu não pode ir porque precisava ficar estudando. Thiago já é mais bon vivant, então fomos juntos e passamos o fim de semana lá. Os dois são meus parceiros, e passam muito tempo comigo no fim de semana. Durante a semana eles estudam na Praia Brava, e a Rina passa mais tempo com eles. Fim de semana somos os quatro juntos. Optei que eles estudassem numa escola bilíngue pra não ter as dificuldades que tive para aprender inglês, e nessa idade é o mais adequado. Já tivemos planos de passar 1 ano fora, mas então começou a pandemia. Hoje eles me ajudam no inglês até, e falam melhor que eu. Eu protejo bastante, mas eu também deixo eles livres. A Rina acho que é mais protetora que eu, tem mais medos e cautelas. Eu defendo que precisam aprender a dirigir cedo. Fim de semana vão para casa dos amiguinhos, mas eu prefiro trazer os amiguinhos pra vir conosco à praia ou ao sitio. Sempre carrego todos esses amigos, até nas corridas. Adoro estar com eles.
Como surgiu a Embrast?
A empresa foi ideia de uns guris durante a faculdade de administração na Unifebe. Na época trabalhava de vendedor externo na Bilu. Identificamos que tinha um mercado aberto de sacolas na região, que o principal fornecedor era a Dokassa. Um dia fazendo um peixe na casa do Jean, resolvemos planejar uma fábrica de sacolas e começamos a rodar várias indústrias. Quando fomos ver essas estruturas, ficamos assustados com a grandeza financeira deste mercado. Não tínhamos dinheiro pra comprar essas máquinas e abrir uma indústria. Mas pensamos em comprar produto e revender, e fizemos uma parceria com um fornecedor de São Ludgero que produzia as sacolas pra nós. Trazia o produto pra Brusque, fazíamos as caixas e eu saia vendendo no mercado. Jean foi meu sócio por seis meses. Na época ele tinha confecção, e combinamos que ele atenderia as lojas do têxtil como na FIP e Stop Shop. Ele atendia lojas, e eu varejo como supermercado e padaria. Nos primeiros seis meses ficamos assustados porque a margem de lucro era muito baixa. Ainda estávamos divididos das nossas rotinas profissionais existentes com a nova. Então chegamos num acordo que não daria pra dois gerir a empresa, e um tinha que vender. Falei que tanto vendia quanto comprava a sociedade, mas estava convicto que precisava ser pra um só a empresa. O nome surgiu dentro da sala de aula, quando já definimos que íamos começar a trabalhar sacolas e o negócio precisava de um nome. Um colega sugeriu Embrast. Se alguém perguntar o significado, não consigo descrever a não ser desta maneira.
Qual o papel da Embrast?
Gerar oportunidades. É uma mãe. Tentamos profissionalizar nossa equipe de 380 pessoas diretas na fábrica. Acredito muito na formação das pessoas. Pagamos 80% dos cursos que algum colaborador queira fazer, desde que o curso esteja dentro do nosso plano de negócio.
E qual o papel do Denisio na empresa?
Fazer a gestão de pessoas é meu grande trabalho. Eu até brinco que na minha mesa ninguém chega pra dizer que os negócios estão indo bem. Só chegam com bomba. O maior desafio de montar uma instituição é conseguir sincronizar várias pessoas em busca do mesmo objetivo. Fazer com que todas as pessoas estejam alinhadas, trabalhem juntas e motivadas. Também estamos sempre em pesquisas de mercado. Há mais de 50 mil clientes cadastrados, e nosso portfólio é origem de pesquisa para novos produtos por exemplo.
Como são as políticas de sustentabilidade da empresa?
Alguns amigos alertaram que as sacolas podem ser proibidas. Eu sou critico nessa questão sustentável, porque o plástico não é o problema do mundo. Tem vereadores que querem se promover nessa questão de vetar o uso de alguns produtos. O plástico não vai pro mar sozinho. Os governos precisam se movimentar e gastar sua energia para reciclagem. O plástico se transforma em mais mil anos. É um material infinito. O mundo precisa focar em coletas seletivas eficazes. Eu acredito na movimentação da sociedade para a reciclagem e educação ambiental. Acredito muito na cadeia circular que nunca para. Você faz um canudinho, e esse canudinho se torna uma sacola, que se torna uma camiseta. Tem gente que quer proibir, e tudo bem. Em 2018 lançamos nossa linha Eco, com papel sendo a principal matéria prima. Fernando de Noronha é um de nossos principais clientes, com todo esse mix circulando na ilha.
A pandemia mudou as estratégias da empresa?
O mercado de descartáveis com a chegada da pandemia esfriou e caiu muito. Mas por outro lado, surfamos na onda com a venda de EPI, como máscaras. A venda de prato, papel e alumínio, que é uma curva A nossa, que caiu 80% neste período. Mas por outro lado os EPIs subiram 1000%. E agora está voltando a linha de festa, e os EPIs estão caindo de novo.
Como equilibrar sustentabilidade financeira e ambiental?
Estamos nos preparando com o ESG. Semana passada estávamos com nossos engenheiros que contratamos para esse ajuste, e tratamos deste projeto que existe há 7 anos. Já apresentei a prefeitura um projeto que pretendíamos colocar uma máquina de reciclagem num aterro sanitário, e paralelamente criar campanhas nas escolas. Mas o governo é um limitante na hora de focar na coleta seletiva. Esse mercado no poder público exige todos os acertos, e não tive garantia jurídica que o governo iria trabalhar comigo. Preferi não me envolver na época, porque política tem muita safadeza e declinei. É um projeto de gaveta, mas com o ESG está retomando muito intenso. Temos muitos pré-requisitos do ESG já alcançados. A Embrast tem projetos de reciclagem para contribuir com o meio ambiente neste quesito. Nossa equipe de engenharia está dividida em três fases para ver o que conseguimos entregar. Porém é um processo cultural que leva algum tempo. Já enxergamos o objetivo, e estamos com pessoas focadas em fazer essas melhorias. Vamos ser uma das pioneiras no mercado nacional com esse projeto dentro do nosso segmento. E fazer que a Embrast não seja uma empresa que acabe ali na frente.
Faltam políticas públicas?
A pandemia provou também que é necessária essa questão de embalagens individuais para poder proteger e evitar contaminação em massa. O ser humano precisa encontrar uma alternativa. O Brasil é um dos maiores produtores de papel e celulose no planeta. Mas o processo pra fazer o papel acaba agredindo mais a natureza do que o plástico. Nós precisamos colocar na cabeça do ser humano que ele precisa ter uma economia circular. Lixo orgânico contamina, por exemplo. Orgânico tem que ser orgânico. Você pode ate misturar o plástico, papel e alumínio. Agora quando você coloca o orgânico junto, contamina tudo. E pra descontaminar, você gasta energia e água. Então esse é um processo coletivo de educação ambiental. Se eu pensar só no lado financeiro da empresa, prefiro que proíbam o canudinho de plástico mesmo. O papel custa 5x mais. Mas porque não montamos um projeto de reciclagem e educação ambiental nas escolas? Aí sim vamos criar uma cultura de reciclagem. Ninguém quer fazer o papel de educação, porque isso dá muito trabalho. Proibir é mais fácil.
Em que momento começou a se aventurar no esporte de adrenalina?
Eu não tinha pais ricos, mas sempre gostei de aventura. Tinha uma bicicleta quando criança. E com 17 anos comprei minha primeira moto, quando comecei a fazer trilhas na região. Lá me motivei a correr, e fui no cross country em Guabiruba, e até hoje não parei. Até 2013 corri de moto. Depois estive na equipe Dakar por três anos, e foi uma grande experiência de vida. Sempre associei as competições off road com o dia a dia do empresário. O tempo inteiro você está no fio da navalha, e por incrível que pareça, as emoções são muito similares ao mundo dos negócios. Porque as escolhas são muito determinantes na competição. Quando casei com a Rina, ela me conheceu correndo de moto. Na época eu não tinha nem um carro, mas eu tinha uma moto de corrida, e essa não vendi. Meus amigos me levavam nas corridas porque gostavam de me ver competindo. Sempre foi um mundo muito presente.
Quando surgiu a relação com a Can-Am?
A Rina, minha esposa, ficava preocupada com os riscos de competir de moto. Estava sempre com o coração na mão. Então encontrei a UTV, e me tornei piloto oficial da Can-Am. É como se fosse uma gaiola, mas é um carrinho americano. A moto é um esporte gostoso, mas também tem alguns riscos. Enxerguei no UTV a mesma adrenalina. Agora vou para as competições e ela sabe que volto inteiro.