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Abacates de sangue

Quem poderia imaginar? Pior ainda, como não se escandalizar com a capacidade do ser humano em estragar tudo o que toca? Melhor nem tentar responder…

Vamos à historinha muito real. De uns anos para cá, houve uma paixão mundial em relação ao abacate. Até eu, que, brasileiríssima, sempre achei que abacate era aquela fruta que a gente batia com açúcar para comer no meio da tarde, acabei me rendendo aos conceitos mexicanos do uso da fruta, ou seja, comecei a perceber como o abacate é perfeito em receitas salgadas. Demorei. Cheguei em meio à febre mundial que rendeu até abacaterias nos principais centros do mundo. Abacate, ou melhor, aquela fruta menorzinha chamada avocado, é uma grande da alimentação do dia a dia, dos programas de TV internacionais que trazem receitas charmosas… isso, o avocado é um ingrediente de charme na alimentação contemporânea. E ainda tem gordura boa e é rico em nutrientes. Um alimento do bem. Vegano. Tem como ficar melhor?

Não. Mas tem muito como piorar. Vários portais andam trazendo notícias sobre como as plantações de pés de abacate mexicanas, as maiores e mais exportadoras do mundo, estão sendo, nos últimos anos, controladas pelas organizações criminosas ligadas ao tráfico de drogas. O lucro é tanto, o aumento na produção é tão intenso… que os grandes “empresários” do tráfico resolveram coletar sua parte, seja em dinheiro de “proteção”, seja assumindo diretamente o negócio.

Com esse novo perfil de “gestão”, quem trabalha nessas plantações viu seu emprego se transformar em algo bem mais precário: ganham por dia ou hora de trabalho, sem vínculo empregatício ou direitos, com aquela pressão diária de quem vive em um sistema comandado pelo crime.

Conforme essa realidade horrível é divulgada, restaurantes na Europa começam a tirar o avocado de seus cardápios e muita gente começa a se questionar se deve ou não fazer um boicote à fruta. É uma questão que precisa de muita análise e que exige que se saiba o caminho que os alimentos fazem, até chegar ao nosso prato. Não faz sentido deixar de consumir abacates ou avocados de produção nacional ou que venham de países em que essa contaminação pelos cartéis não exista.

Mas faz todo sentido levar em consideração outros fatores. Segundo a Época Negócios, em uma publicação de maio do ano passado, a cremosidade deliciosa do abacate tem um ônus ambiental: o consumo de água. O site da revista afirma que para produzir um quilo de abacate são necessários 2 mil litros de água e que o aumento mundial do consumo, levando à expansão da área plantada, pode ter sido responsável por uma seca que atingiu e pode continuar atingindo o Chile. Isso leva a consumo humano de água de pior qualidade e, consequentemente, a surtos de doenças.

Nada parece simples, nesse mundinho em que vivemos. E agora, o que faremos das nossas pastinhas verdes e do nosso guacamole?

 


10Claudia Bia
– jornalista momentaneamente alarmada