X
X

Buscar

Adeus, terra do nunca

Como era de se esperar, o efeito está sendo forte. O desmonte da imagem de Michael Jackson, por conta do documentário Leaving Neverland, parece não ter volta. A primeira onde, depois da exibição do doc no Sundance Festival, já mostrava que a coisa não era mais do mesmo. Os depoimentos foram levados a sério por todos os que viram a exibição.

Mas, agora, a coisa toda ficou mais… horizontal. O documentário foi exibido, semana passada, na HBO norte-americana. Dividido em dois dias consecutivos, assim como será na exibição nacional – agende-se para os dias 16 e 17, próximo final de semana, às 20 horas, também na HBO, o conteúdo do filme parece não deixar muita dúvida em quem o assiste. É isso o que faz toda a diferença: fãs e não fãs precisam assistir ao documentário antes de aderir ou jogar pedras nele. É cada vez mais importante, nesses tempos de pós verdades, fake news e “opiniões inquestionáveis”, que a gente reaprenda a observar, absorver e pensar por si. Sem isso, a gente não sobrevive enquanto seres inteligentes. Discorda?

O que vimos, nestes dias pós estreia televisiva de Deixando Neverland? Emissoras de rádio, no Canadá e Nova Zelândia, anunciando a retirada do repertório do cantor de suas programações, sob alegação de pedido dos ouvintes.

A produção dos Simpsons também anunciou que deixará de reprisar um episódio – original de 1991 – que contava com a participação de Jackson. Pelo menos duas estátuas em homenagem a ele foram retiradas de seus locais de exibição pública.

Mesmo o sempre defensor Corey Feldman declarou que não se sente mais à vontade para manter seu papel, já que, segundo declarou, fica difícil ignorar o que está sendo dito pelas vítimas. Desqualificar vítimas, a gente sabe, é um jogo perigoso.

A velha questão ressurge: o que fazer com a obra, com a memória afetiva, com o papel no universo da cultura pop… exercido por alguém cuja reputação é manchada pelos piores tipos de acusação, que incluem assédio e pedofilia? Complicadíssimo.

Michael Jackson continuará a ter fãs dispostos a defendê-lo, sempre. Dispostos a atacar quem denuncia, especialmente sob o argumento de que se ele foi absolvido em vida (desconsiderando os acordos extrajudiciais que foram fechados, bem fechados, nos tempos dos processos), deve ser deixado em paz depois de morto. Infelizmente, isso não parece ser o suficiente.

Pode ser doloroso, pode até não ser muito útil, mas não podemos deixar de dar atenção a Leaving Neverland. Se não aproveitarmos essas chances para evoluir “enquanto” seres humanos, estaremos só abraçando a barbárie.