E bem depois do trecentésimo sexagésimo quinto dia do período, quis o destino (que você também pode chamar de Claudia Bia) que me coubesse um espaço para falarmos deste ano que se encerrou. Ano vertiginoso, repleto de acontecimentos de toda natureza: desde os mais ternos aos mais brutais, passando pelos surreais. Ao menos, mostramos ao mundo que disto entendemos muito, do “surrealismo”; e isso tanto no plano municipal como no plano federal: fomos insuperáveis, podem ficar “tranquilos”.
Mas, para além da temporada de praias que se inicia, fica o gosto da temporada de vestibulares, que, para nós, se acaba. Depois de submetermos nossa juventude a uma prova de quatro horas para avaliarmos seus quatorze anos de escolaridade – e depois de convencermos a todos que esse é o meio de avaliação mais apropriado – é hora de celebrar os heróis que, apesar de tudo, conseguiram passar; isso sempre é muito prazeroso. Meus parabéns, muitas felicitações aos heroicos aprovados deste ano que se encerra: vocês passaram com todo o mérito; superaram o cansaço, o desânimo, a Ritalina e, por vezes, até mesmo alguma falta de confiança em si mesmos. Bravo!! Faço votos que esses anos de universidade sejam os mais ricos da vida de vocês. Anos de muito aprendizado, de muitas experiências novas, anos em que cada minuto traga um sabor de novidade. Bravo!!
No entanto, na alma de cada professor animado por uma alma (Sim, amiguinhos!! Isso existe! Não se trata de um paradoxo. São poucos, cada vez mais raros, é certo; mas existem.), também resta uma sensação de desalento pelos reprovados. E esses, injustiçados pelos prazos curtos para resolver aquela questão de matemática ou incapazes de selecionar melhor os argumentos de uma redação, esses que não são aprovados, “Deixam a gente comovido como o Diabo”, como dizia Drummond, o maior poeta brasileiro, expulso do colégio mineiro onde estudava, aos dezessete anos. Não tem como ser um professor dotado de alma e não comover-se com aqueles que verdadeiramente se esforçaram, que deram o seu melhor e, mesmo assim, foram reprovados. Em meu socorro, tenho aqui alguns versos do falecido Ferreira Gullar, do poema “Vestibular”:
Paulo Roberto Parreiras
desapareceu de casa
trajava calças cinza e camisa branca
e tinha dezesseis anos.
Parecia com teu filho, teu irmão,
teu sobrinho, parecia
com o filho do vizinho
mas não era. Era Paulo
Roberto Parreiras
que não passou no vestibular
(…)
Não tenho nenhum poder,
nada posso assegurar.
Tudo que posso dizer-lhe
é que a gente não foge
da vida,
é que não adianta fugir.
Nem adianta endoidar.
é que você tem o direito de estudar.
É justa a sua revolta:
seu outro vestibular.
Estamos juntos, “meus reprovados” de 2016. Vamos ao 2017; que ele nos traga paciência nas horas de confrontar a estupidez; mas que ele também nos traga firmeza nas horas em que ser firme se fizer necessário; que ele nos traga vergonha na cara pra mudar o que precisa ser mudado; e que ele também nos traga a coragem pra revolucionar o que já não cabe mais. Estamos juntos, “meus reprovados” de 2016. Havemos de lembrar, em um futuro não muito distante, que o mesmo ano que nos trouxe a nossa reprovação, também nos ofertou a inigualável voz da preciosa Jade Baraldo. 2017 nos aguarda, não vamos fazer com que nos espere.
Professor Deschamps