Após denúncia, MP-SC investiga irregularidades na fila de consultas e exames do SUS em Brusque
Acusação é de que secretário de Saúde teria beneficiado parentes de secretários municipais e servidores públicos em 2017
O Ministério Público (MP-SC) investiga, em inquérito, o secretário de Saúde de Brusque, Humberto Fornari, após acusação de uso indevido do Sistema Nacional de Regulação (Sisreg) para supostamente beneficiar colegas e parentes.
A denúncia à 3ª Promotoria de Justiça foi feita pelo vereador Paulo Sestrem, em abril de 2019, inicialmente de forma anônima, solicitando investigação sobre o caso.
De acordo com a denúncia do vereador ao MP-SC, o secretário, à época, estaria assediando servidores para alterar a ordem sequencial da fila do Sisreg, que controla o sistema de exames, consultas e cirurgias eletivas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), visando “favorecer interesses pessoais”.
Ainda de acordo com a denúncia, com o intuito de afastar a responsabilidade dos operadores, foi criado no Sisreg o usuário ‘Gestao1720’, cadastrado com o CPF de Fornari.
Por meio deste usuário, o vereador constatou a existência do que considerou fraude no sistema, como a solicitação de consultas e exames e aprovação no mesmo dia, com o agendamento desses procedimentos com um intervalo curto, diferente do que comumente acontece, já que dependendo da especialidade, a fila de espera para o agendamento da consulta pode levar mais de um ano.
Segundo a denúncia do vereador, pelo menos seis pessoas foram beneficiadas e incluídas no sistema pelo usuário Gestao1720. Todas em 2017.
Conforme descrito na denúncia do vereador, a primeira beneficiada foi Nazira Maria Chanan Kappler, sogra de Fornari, que solicitou consulta com reumatologista no dia 14 de setembro de 2017, teve o procedimento aprovado no mesmo dia e agendado para o dia 18 de setembro, ou seja, quatro dias depois da solicitação.
Além dela, também teria sido beneficiada Mariana Burger Beuting, filha do ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, João Beuting, que solicitou um ultrassom no dia 25 de outubro de 2017 e teve o procedimento agendado para o dia 9 de novembro, 15 dias depois.
A diretora de Recursos Humanos da Prefeitura de Brusque, Anelise Nagel Ketzer de Souza, também teria sido beneficiada, segundo a denúncia. O documento enviado por Sestrem ao MP-SC informa que o usuário Gestao1720 solicitou exames de sangue para ela em 23 de novembro, e o procedimento foi agendado para o dia 7 de dezembro de 2017 – 14 dias após o pedido.
Também teriam sido beneficiadas com a inclusão no sistema pelo usuário Gestao1720, Rita Pereira de Souza e Riane Pereira de Souza, esposa e filha do secretário de Obras, Ricardo de Souza, e também a suplente de vereadora Keila Taise Kuhn, que é servidora efetiva da Secretaria de Educação.
Sestrem afirma que além da denúncia ao MP-SC, fez também dois pedidos de informações à Secretaria de Saúde sobre o Sisreg, em que, segundo ele, é possível comprovar a irregularidade.
“Com as fichas do Sisreg consegui verificar que tinha parentes de secretários e servidores com pedidos aprovados no mesmo dia, sendo que as pessoas ficam na fila meses para fazer exames e consultas com especialistas. Todo tipo de corrupção é repugnante, mas quando se trata de roubar a saúde das pessoas, não tenho nem palavras”.
O Município solicitou informações ao MP-SC, já que desde 2019, o inquérito tramita em segredo de Justiça, mas até o fechamento da edição, não obteve resposta sobre o andamento do caso.
Citados refutam irregularidades
O Município entrou em contato com todos os citados na denúncia do vereador. O secretário Humberto Fornari afirmou que não há irregularidades no sistema. De acordo com ele, todas as pessoas que aparecem na denúncia passaram por procedimento médico, que solicitou exames ou consultas com especialista. “Com avaliação médica realizada, não tem como pensar em irregularidade”, diz.
Sobre o usuário criado vinculado ao seu CPF, Fornari explicou que, como secretário, tem sua própria senha para poder usar o sistema quando o auditor não está disponível. “Naquela época, o auditor trabalhava quatro horas, então as outras quatro, ficava sem auditoria. Mas agora temos auditor as oito horas”.
Sobre o curto intervalo de tempo entre a solicitação das consultas e exames e o agendamento, o secretário disse que “depende muito da quantidade de médicos existentes na rede o tempo de agendamento”. Ele cita ainda que hoje, com o modelo de acesso avançado, “as pessoas vão em busca da consulta e são consultadas no mesmo dia”. O secretário diz ainda que aguarda a conclusão da investigação do Ministério Público.
Ricardo de Souza, secretário de Obras, diz que já deu todas as informações ao MP-SC e, por isso, prefere não se manifestar.
A diretora de Recursos Humanos da prefeitura, Anelise Nagel Ketzer de Souza, que também é citada na denúncia, informou a O Município que já prestou esclarecimentos ao MP-SC e, de acordo com ela, o seu caso já foi arquivado, por ausência de irregularidades.
A suplente de vereadora pelo PT e servidora efetiva da Secretaria de Educação, Keila Taise Kuhn, é citada na denúncia como beneficiária de uma consulta com ortopedista. Ainda segundo o texto da denúncia enviado ao MP-SC, Keila foi incluída no sistema na tentativa de estancar os comentários negativos sobre a atual administração municipal que ela fazia nas redes sociais, por integrar partido de oposição ao governo.
Em nota enviada ao jornal O Município, Keila critica a postura do secretário de Saúde denunciada ao Ministério Público, classificando como “politicagem algo tão sério como é a saúde das pessoas”.
Keila diz ainda que o fato dela “incomodar o governo nas redes sociais, como narrado, se deve justamente pelo questionável trabalho que a atual administração da Prefeitura de Brusque realiza em diferentes áreas, principalmente na Saúde, onde centenas e milhares de pessoas sofrem diariamente à espera de atendimento digno e de qualidade”.
Na nota, Keila diz ainda que “o serviço público não pode servir para beneficiar compadres políticos, nem para amansar oposicionistas. Se o que a denúncia narra, for verídico, trata-se de ato de improbidade administrativa que merece e deve ser investigado e, se confirmado, deve ser aplicada a cabível punição”.
A reportagem também procurou o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, João Beuting, para comentar o caso, mas as ligações não foram atendidas durante todo o dia.