X
X

Buscar

Após nota de desabafo de comandante da PM, OAB de Brusque se manifesta

Para a OAB, a manifestação do comandante provoca insegurança e induz ao preconceito contra pedintes, artistas de rua, vendedores e estrangeiros de semáforo

Nesta quinta-feira, 8, a Subseção de Brusque da OAB-SC divulgou uma nota pública na qual critica a manifestação de desabafo do comandante do 18º Batalhão de Polícia Militar do município, tenente-coronel Otávio Manoel Ferreira Filho, sobre o caso da menina de 14 anos que foi atacada em casa.

A menina foi atacada por um homem que pedia doações de roupas na tarde de quarta-feira, 30, no bairro Poço Fundo. A polícia investiga a suspeita de estupro.

Após a ocorrência, o comandante divulgou a nota de desabafo. Confira parte dela abaixo:

“Se nós observarmos com um pouco mais de critério, NOSSA BRUSQUE está a cada dia ficando mais DOENTE, doente com os MORADORES DE RUA ou ANDARILHOS em toda a cidade e que a cada dia aparecem em maior número, doente com PEDINTES de ruas, esquinas e ou semáfaros, doente com os “ARTISTAS DE RUA” (malabares, estátuas, etc), VENDEDORES e ESTRANGEIROS de semáfaros, doente com o número de DEPENDENTES QUÍMICOS que aumentam a cada dia mais, enfim, uma variedade de pessoas que na sua imensa maioria são jovens (20 a 40 anos de idade), saudáveis (com pernas, braços, etc) e com pleno vigor físico, mas que, devido o famigerado EXCESSO de DIREITOS HUMANOS, do amplo DIREITO DE IR e VIR, e principalmente A BONDADE DO POVO BRUSQUENSE, que na verdade entendo como maldade além de estarmos fazendo papel de trouxas (“quem tem pena de despena”, “não dê o peixe, ensine a pescar”), estamos lhes tirando os estímulos de vida (necessidade de verdadeiramente trabalhar) para viverem dignamente”, diz. Confira nota do comandante na íntegra aqui.

A nota da OAB, assinado pela Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Subseção, respondeu a posição do comandante. “Em primeiro lugar, nos solidarizamos com a adolescente vítima e seus familiares, nos colocando à disposição, ao mesmo tempo em que repudiamos o covarde e hediondo crime cometido contra a adolescente”, inicia.

A OAB aponta que o comandante Otávio, na nota de desabafo, traz destaque aos “dependentes químicos e moradores de rua”. Portanto, em um contexto em que os liga ao “hediondo ato praticado contra a adolescente, e, de forma generalizada, desinforma a população, fazendo crer que todos os “dependentes químicos e moradores de rua” são criminosos – estupradores”, afirma.

Assim, segundo a nota, a manifestação do comandante teria demonstrado “enorme intolerância a essas pessoas e, pior, instigando o preconceito a dependentes químicos e a pessoas em situação de rua”, continua.

Para a OAB, esse preconceito é estendido ao pedintes de rua, aos artistas de rua, que são os malabares, estátuas, etc., e aos vendedores e estrangeiros de semáforo.

“Incluindo-os todos num mesmo contexto em que fala do estupro da adolescente. É dever da autoridade solucionar conflitos, buscar a paz social e o bem-estar da comunidade, preservar a ordem pública e a integridade das pessoas e do patrimônio, e não aviltar, acirrar ânimos contra “pedintes, artistas de rua, vendedores, estrangeiros e pessoas em situação de rua””, complementa a nota.

“A bondade do povo brusquense”

A nota da OAB também se manifesta sobre a avaliação do comandante sobre “a bondade do povo brusquense”. Esta, que o comandante entende como “maldade além de estarmos fazendo papel de trouxas”, referindo-se as esmolas que poderiam tirar “os estímulos de vida (necessidade de verdadeiramente trabalhar) para viverem dignamente”.

Neste caso, a nota afirma que o comandante se equivoca: “Não somos “trouxas”! Todos aqueles que ajudam, apoiam os que estão em situação de fragilidade, o fazem imbuídos de misericórdia e compaixão, educados que foram em suas famílias e nas suas religiões para assim proceder, “fazendo o bem sem olhar a quem”. Sem pretensão de querer tirar a “oportunidade delas”, muito menos “incentivando várias outras a entrarem nesse mundo” de “pedintes, artistas de rua, vendedores, estrangeiros, e pessoas em situação de rua”. Tal falácia é despida de qualquer lógica, baseado no “achismo” e em malfadado preconceito”, diz.

Pontuações

A nota da OAB ainda questiona a parte que o comandante cita “EXCESSO de DIREITOS HUMANOS, do amplo DIREITO DE IR E VIR”: “Os direitos humanos são para todos os seres humanos pelo simples fato de serem humanos”, pontua a OAB, ao dizer que a PM é uma instituição “promotora dos direitos humanos”.

Também, questiona o comandante sobre o significado de estrangeiros, que ele cita na nota.

“A cidade de Brusque, pelo menos a metade da sua população, é formada por imigrantes de todos os Estados do Brasil. Ou os “estrangeiros” que cita seriam os haitianos, venezuelanos, colombianos, argentinos etc., que, ficando nos semáforos, seriam perigosos? Evidencia-se de forma cristalina no “manifesto”, a prática de xenofobia. Demonstra ainda, não conhecer, ou ignorar, a história da cidade de Brusque, que foi construída com a chegada de estrangeiros: alemães, italianos, poloneses, ingleses e tantos outros”, diz.

Pedidos

Para a OAB, a manifestação do comandante provoca insegurança e induz ao preconceito contra os grupos citados. “Neste sentido fazemos um apelo à população para que não faça justiça com as próprias mãos e nem pratique violência, assim como não se deixe levar pelo preconceito e não pratique crime de xenofobia, em razão do “manifesto” do Tenente Coronel Otávio – Comandante da Polícia Militar em Brusque”.

Por fim, a OAB cobra que o Comando Geral da Polícia Militar de Santa Catarina apure a violação à ética policial-militar do comandante. “(…) face o uso de redes sociais e da imprensa, causando instabilidade na população, insegurança e incitação ao preconceito, inclusive apurando eventual prática de crime de xenofobia”, completa.


Quer receber notícias diretamente no seu celular? Clique aqui e entre no grupo de WhatsApp do jornal

Prefere ficar bem informado pelo Telegram? O jornal tem um canal de notícias lá. Clique aqui para participar