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Brusque registra o maior número de mortes relacionadas ao AVC dos últimos cinco anos

Taxa de mortalidade aumentou 33% em comparação ao último ano de maior índice, 2022

Otávio Timm
otavio@omunicipio.com.br

Brusque registrou, em 2024, o maior número de mortes relacionadas ao AVC nos últimos cinco anos. Segundo dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), disponibilizados pela Secretaria de Saúde do município, foram contabilizadas, até 6 de dezembro, 44 mortes. Esse número representa um aumento de 33% em relação ao último ano de maior índice, 2022, quando foram registradas 33 mortes.

O Portal da Transparência do Registro Civil informou que, até novembro, o Brasil registrou 95,5 mil mortes por AVC em 2024. Destas, 3,6% (cerca de 3,4 mil) ocorreram em Santa Catarina, com 55 em Brusque até 2 de dezembro.

A diferença em relação aos dados da Secretaria de Saúde se deve ao fato de o SIM considerar apenas óbitos de residentes no município.

O AVC, caracterizado pela obstrução ou ruptura de vasos no cérebro, é uma das principais causas de morte e incapacidade no Brasil. Segundo o Ministério da Saúde, o país registra entre 232 e 344 mil novos casos anuais, ou cerca de 978 diagnósticos diários.

A incidência entre jovens também é preocupante: 18% das ocorrências afetam pessoas de 18 a 45 anos, segundo a Rede Brasil AVC.

Números do AVC em Brusque

A reportagem avaliou os números registrados nos últimos cinco anos, desde 2019. Os resultados revelaram um aumento significativo no número de óbitos em 2021 e 2022. No entanto, tanto os anos anteriores quanto os subsequentes mantiveram-se estabilizados. Os dados foram atualizados no dia 2 de dezembro.

Como efeito de comparação, também foram utilizados os dados do SIM, disponibilizado pela secretaria de Saúde do município. Ele contabiliza mortes por: AVC não especificado, outras doenças cerebrovasculares e sequelas do AVC.

Entre janeiro e outubro de 2024, 498 pessoas de 44 a 80 anos foram atendidas com suspeita de AVC no Hospital Azambuja, em Brusque, conforme dados da Secretaria de Saúde. Isso reflete, segundo os especialistas, a ocorrência frequente da doença na cidade.

“Nosso objetivo é reduzir e estabilizar os índices, aprimorando os serviços e a capacitação da equipe de saúde no atendimento às vítimas de AVC”, afirmou a secretária de Saúde, Thayse Rosa.

Mortes por AVC

  • 2019 – 58 mortes (19 eram residentes segundo o SIM);
  • 2020 – 64 mortes (26 eram residentes segundo o SIM);
  • 2021 – 79 mortes (22 eram residentes segundo o SIM);
  • 2022 – 76 mortes (33 eram residentes segundo o SIM);
  • 2023 – 54 mortes (31 eram residentes segundo o SIM);
  • *2024 – 55 mortes (**44 eram residentes segundo o SIM). 

* Dados obtidos até o dia 2 de dezembro.
** Dados obtidos até o dia 6 de dezembro. 

Fatores de risco e tipos de AVC

Os fatores de risco para o AVC, segundo o neurologista Osvaldo Quirino de Souza, são semelhantes aos de outras doenças cardiovasculares, com a pressão alta sendo a principal causa. Outros fatores incluem obesidade, distúrbios no colesterol, triglicerídeos e sedentarismo, relacionados ao estilo de vida moderno.

Ele acredita que esses fatores podem ter contribuído para o aumento dos casos em 2024, com a crescente dependência da tecnologia e menor atenção à saúde.

O neurologista José Sion Cantos destaca ainda que condições genéticas, como doenças hemorrágicas que aumentam a coagulação e malformações vasculares, elevam o risco de AVC.

Os médicos explicam que o AVC pode ser classificado em dois tipos principais: o AVC isquêmico e o AVC hemorrágico.

O AVC isquêmico ocorre quando há uma obstrução no fluxo sanguíneo, geralmente devido a um bloqueio causado por um fragmento de coágulo que se desloca para outras áreas.

“Essa obstrução impede que o sangue e o oxigênio cheguem a partes do cérebro, resultando em uma isquemia (falta de oxigenação) nas áreas afetadas”, detalha Osvaldo.

Já o AVC hemorrágico, segundo Sion, ocorre quando há uma ruptura de um vaso sanguíneo no cérebro, geralmente devido a uma crise de pressão arterial muito alta ou a um aneurisma cerebral.

“No aneurisma, o vaso sanguíneo apresenta uma deformidade na sua parede, formando uma espécie de ‘bolsa’ ou ‘saco’. Quando a pressão arterial sobe muito, esse saco pode se romper, resultando em um sangramento no interior do cérebro”, explica.

Importância do atendimento rápido

Especialistas concordam que a rapidez no atendimento é crucial em casos de AVC. Segundo Osvaldo, agir logo após o início dos sintomas é essencial para minimizar danos cerebrais e aumentar as chances de recuperação.

No AVC isquêmico, o “tempo de ouro” é vital para aplicar tratamentos trombolíticos que dissolvem o coágulo e restauram o fluxo sanguíneo. Já no AVC hemorrágico, pode ser necessária intervenção cirúrgica para controlar a pressão no crânio e realizar a hemostasia.

“O Samu, o pronto atendimento e o Hospital Azambuja estão preparados para oferecer socorro adequado desde o início”, afirma a secretária de Saúde de Brusque.

Aline Fagundes Cunha, enfermeira responsável pelo Samu de Brusque, explica que a Escala de Cincinnati é uma ferramenta útil para identificar rapidamente os sinais de um AVC.

A escala avalia três sinais clínicos: queda facial: ao sorrir, se um lado do rosto estiver caído ou paralisado, isso pode ser um sinal de AVC; fraqueza nos braços: peça para a pessoa fechar os olhos e estender os braços; se um dos braços cair ou não se mover, pode ser um indício de AVC; e fala alterada: dificuldade para falar, palavras embaralhadas ou fala incompreensível são sinais que podem indicar um AVC.

Até o dia 29 de novembro de 2024, o Samu de Brusque havia atendido 66 ocorrências com suspeita de AVC. 

“Muitas vezes a equipe é acionada por outros motivos e, durante a avaliação, identifica sinais de AVC que a família não havia notado. Por isso, os testes simples ajudam a identificar rapidamente possíveis casos de AVC em familiares”, conclui a enfermeira.

“O AVC me fez repensar hábitos”

Fábio Mendes de Jesus, 47 anos, é professor e atua em Brusque. Ele sofreu um AVC isquêmico em fevereiro de 2020, após sentir tontura ao levantar da cama.

“Deitei no sofá, tentei levantar, mas tive ânsia de vômito e comecei a suar muito. Fui levado ao hospital e perdi os movimentos do lado esquerdo, com a fala desconexa”, conta.

Arquivo pessoal

Inicialmente diagnosticado com labirintite, Fábio foi reavaliado e o diagnóstico foi alterado para AVC isquêmico. “Após exames, o médico confirmou o AVC e recomendou internação. Felizmente, me recuperei sem sequelas”, relembra.

Atualmente, Fabio diz que faz uso contínuo de medicamentos e realiza retornos médicos semestrais. Além disso, mudou hábitos alimentares, incluindo na dieta itens como peixe, aveia e saladas, que antes não consumia. “O AVC me fez repensar hábitos”, conclui.

“Nossos sistema de saúde negligencia a prevenção”

A pedagoga Sandra Freitas, moradora de Brusque, sofreu um AVC hemorrágico em 15 de novembro de 2021, surpreendendo-a após se sentir bem com a vida e sua carreira. Devido à gravidade, precisou de uma cirurgia urgente e enfrentou paralisia no lado esquerdo, dificuldades para engolir, problemas urinários e outras sequelas.

“Fiquei quatro dias na UTI e, depois, fui para o quarto. Surpreendentemente, recebi alta após dois dias, mesmo com limitações e sem poder me locomover. A alta foi precoce, e, após uma nova convulsão, fui internada novamente”, relata Sandra.

Arquivo pessoal

A única orientação recebida foi sobre a fisioterapia, o que gerou insegurança em Sandra e sua família. “Percebo que nosso sistema de saúde está muito focado nas emergências e negligencia a prevenção e a reabilitação”, critica.

Com o intuito de oferecer apoio e acolhimento, ela ajudou a fundar a Associação Brasil AVC: Brusque. Desde novembro de 2022, a associação realiza encontros mensais, com profissionais da saúde, oferecendo informações e apoio às famílias que enfrentam a mesma situação.

Prevenção, tratamentos e cuidados posteriores

Os médicos explicam que a maneira de reduzir o risco é adotar práticas saudáveis, tais como controle rigoroso da pressão arterial; alimentação balanceada com controle de colesterol, triglicerídeos e ácido úrico; prática de atividade física regular; controle do diabetes (se aplicável); e abstinência de fumo e álcool.

Já as formas de tratamento, segundo os especialistas, variam conforme o tipo e a gravidade do evento.

Para o AVC isquêmico, os tratamentos disponíveis incluem: Trombólise: administração de medicamentos para dissolver o coágulo e restaurar o fluxo sanguíneo; Trombectomia mecânica: procedimento em que um cateter é utilizado para remover o coágulo obstrutivo; e acompanhamento clínico e medicações anticoagulantes.

Já no caso do AVC hemorrágico, os tratamentos incluem: controle da pressão arterial; craniotomia ou drenagem de hematoma: cirurgia para drenar o hematoma e aliviar a pressão intracraniana; e tratamento de aneurismas: caso o AVC hemorrágico seja causado por um aneurisma (dilatação anormal de uma artéria), pode ser necessário uma cirurgia para reparar o vaso afetado.

Após os tratamentos iniciais, a reabilitação é fundamental para a recuperação do paciente. O processo pode incluir fisioterapia, acompanhamento psicológico e tratamentos personalizados.

Fisioterapia como aliada

A neuroplasticidade, a capacidade do cérebro de formar novos circuitos neuronais e reativar áreas com perda neuronal, é essencial para a recuperação de pacientes com AVC, segundo Cantos. Esse processo, que pode ser estimulado pela fisioterapia, é mais eficaz nos primeiros seis meses após o AVC.

A fisioterapeuta Fernanda Freitag Busnardo, especialista em gerontologia pela USP, aplica desde 2021 a neuromodulação, técnica que estimula a formação de novas conexões entre neurônios. Este ano, ela trouxe para Brusque um aparelho dinamarquês que amplia o tratamento de diversas patologias e sintomas.

“Esse método acelera significativamente a recuperação, mas deve ser associado a técnicas de reabilitação”, explica Fernanda, que já registrou melhorias em movimentos, fala e memória de pacientes.

Arquivo pessoal

Sion destaca que, apesar dos avanços tecnológicos, a prevenção ainda é a melhor estratégia. Especialistas também ressaltam o papel crucial de familiares, amigos e cuidadores na recuperação, criando um ambiente acolhedor e motivador.

Thayse Rosa reforça que Brusque investe em programas de educação em saúde, como grupos de caminhada, atividades nas academias de saúde e horários estendidos nas unidades básicas.


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