Brusque, riscos geodinâmicos e planejamento
Por Geraldo Mario Rohde
Geólogo, Dr. em Ciências Ambientais
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Priscila Strenzel
Professora de Português e de Redação
e-mail: [email protected]
Se comparamos as catástrofes geológicas e climáticas que assolam outros lugares do planeta Terra – o nosso popular “mundo” – com as que ocorrem no Brasil, torna-se clara a constatação da situação de que o nosso país, se não é isento de eventos geodinâmicos, constitui local benévolo quanto a esse aspecto.
De fato, se confrontarmos os recentes terremotos ocorridos na Síria e Turquia e os eventos de deslizamentos no Paraná e em Santa Catarina em novembro e dezembro de 2022, há uma enorme diferença de potencial de destruição material e de mortandade humana.
Enquanto os terremotos rasgam estradas e rodovias, destroem prédios inteiros e matam milhares, os deslizamentos e inundações ocorridos no Brasil apenas interditam temporariamente rodovias, ruas e causam poucas mortes. Os eventos ocorridos em Brusque no mês de julho de 2021, por exemplo, causaram apenas 22 mortes, se comparados com os atuais terremotos da Síria e Turquia que provocaram mais de 50 mil mortos.
O Brasil não tem terremotos destrutivos, não possui registro de tsunamis, não há ocorrência de tornados e furacões em escala significativa. Os riscos geodinâmicos brasileiros possuem origem na dinâmica externa, da ação da gravidade e da água nos materiais rochosos, suas decomposições e nos solos, além da intervenção humana ao construir rodovias, estradas, cidades e plantas industriais. Os deslizamentos de solo, as quedas de blocos, as enxurradas, inundações e alagamentos são as causas principais das catástrofes geodinâmicas brasileiras.
Em recente artigo publicado, “Brusque é uma das cidades com mais áreas de risco para deslizamento do Brasil” (Sales, O Município, v. 68, n. 7693, 18 jan. 2023, p. 5), a autora aponta, de maneira elucidativa, fatos e dados elaborados pelo Serviço Geológico do Brasil, sobre Brusque e Santa Catarina. Nesse estudo feito pelo SGB fica estabelecido que Brusque é a terceira cidade do país em números de ocorrências de deslizamentos, inundações e enxurradas mapeadas no Brasil (199 áreas), ficando apenas atrás de Ouro Preto-MG (313 áreas) e Nova Friburgo-RJ (254 áreas).
O artigo também registra que há cerca de 4,8 mil domicílios particulares e coletivos localizados em áreas de risco geológico alto ou muito alto em Brusque, que estão sujeitas a perdas e danos decorrentes de deslizamentos, inundações e enxurradas. Assim, a partir do fato de que, da população estimada de 140597 pessoas (IBGE, 2012) para Brusque, existem 15 mil pessoas em áreas de risco quanto a deslizamentos, inundações e enxurradas, pode-se extrair três conclusões bem consistentes:
1 – existe uma cidade de urbanização formal segura, razoavelmente imune aos riscos geodinâmicos;
2 – torna-se nítida a percepção de que há outra cidade “informal” na qual se encontra mais de 10% dos habitantes, podendo essa receber muitos sinônimos, alguns eufemísticos e outros jurídicos, tais como ilegal, clandestina, escondida, invadida, irregular, “ao arrepio da Lei”, anômala, distópica, injusta, desigual, dissonante, incerta, desregrada, ilícita, etc.;
3 – há um enorme descompasso entre o Plano Diretor de Brusque, a Lei Complementar 135/2008, que previu código de zoneamento, uso e ocupação do solo, regularização fundiária, redução de riscos, mapeamento geotécnico, uso da resolução CONAMA 303/2002, determinação de áreas non edificandi, com o Art 64-II – “usos desconformes: aqueles inadequados e proibidos, sumariamente vedados” com a realidade dos fatos atuais.
A mudança para uma situação mais segura e socialmente aceitável aponta para várias providências e atividades:
1 – organizar a revisão do Plano Diretor com ferramentas técnicas e sociais que o tornem um instrumento de gestão, ao invés de simples carta de intenções;
2 – revisar o Plano Diretor com um novo enfoque que incorpore a noção de risco geodinâmico e encare o Rio Itajaí-Mirim e os fenômenos hídricos como oportunidades e ameaças;
3 – realizar a cartografia geológico-ambiental e geotécnica do xisto que constitui o embasamento geológico da maior parte do município, para melhor conhecer os riscos de deslizamentos que ele apresenta;
4 – inserir o município em redes de conhecimento sobre as mudanças climáticas que acarretam em eventos climáticos extremos, prevendo aqueles que o atingirão;
5 – incorporar os instrumentos de Inteligência Artificial – IA já disponíveis, tal como o ChatGPT, Truth GPT e sucessores, para identificar e aplicar as melhores práticas disponíveis quanto aos riscos geodinâmicos que afetam Brusque.
A boçoroca que se formou, no início de dezembro de 2022 na colina em que está localizada a Prefeitura Municipal de Brusque, é um expressivo e permanente aviso geodinâmico para uma ação proativa.