Brusquense contorna lago Titicaca de caiaque; conheça detalhes da aventura
Ele enfrentou temperaturas extremas, tempestades de granizo e ventania nos 400 km da travessia
Ele enfrentou temperaturas extremas, tempestades de granizo e ventania nos 400 km da travessia
Temperaturas extremas, tempestades de granizo e ventania. Esses foram alguns casos que o empresário e instrutor de canoagem Álvaro Walendowsky, 42 anos, relatou sobre a expedição no inóspito e icônico Lago Titicaca.
Protagonista de muitas histórias e lendas da América Latina, o lago é berço da cultura Inca, localizado entre o Peru e a Bolívia. Durante 12 dias, entre 19 e 30 de julho, Walendowsky o circum-navegou. Foram 400 quilômetros, sozinho, em um caiaque oceânico.
Apesar dos perrengues, a aventura proporcionou paisagens únicas e a experiência que ficará para sempre marcada na memória do brusquense.
Com dez anos de experiência com canoagem oceânica, Walendowsky é instrutor de canoagem há quatro anos.
Ele conta que a ideia veio após ler sobre o explorador belga Louis-Philippe Loncke, que fez a primeira cincum-navegação mundial do Lago Titicaca, junto com o peruano Gadiel Sánchez Rivera, em 2013. A possibilidade também havia sido levantada em conversa entre colegas, em um curso no Alasca, naquele ano.
Ver que alguém fez o trajeto motivou ao aventureiro a planejar a expedição. Na notícia, também conheceu a agência de viagens Edgar Adventures, localizada em Puno, no Peru, na costa do lago.
Ao entrar em contato com o Edgar para alugar um caiaque, Walendowsky recebeu a proposta de dar um curso em troca da locação. “Uma semana depois comprei a passagem e confirmei para ele. Troquei o ganho de dinheiro por experiência”, relata.
Ele chegou em Puno no dia 14 de julho. Da alimentação ao vestuário, entre equipamentos e força de vontade, ele cita dificuldades de logística na preparação.
Walendowsky conta que precisou comprar um gás específico para os tipos de fogareiro que utiliza, em Lima. Como não podia transportar o gás por avião, despachou-o por via terrestre até Puno.
Além disso, havia a possibilidade de não quererem transportar o gás. “Nesses dias que antecederam a expedição, tive um receio que resolvessem abrir e decidirem que não iriam trasportar. Em um ambiente frio, a cozinha era importante, precisava comer”, diz.
Felizmente, tudo deu certo. Álvaro, portanto, foi instrutor do curso por dois dias, como prometido, a primeira vez em outra língua. Assim, a expedição estava para começar.
Com base nas anotações feitas em um diário de bordo, ele partiu de Puno no dia 19 de julho, dentro do caiaque, no sentido anti-horário pela costa do lago.
Com águas geladas e território hostil, o Titicaca está situado acima de 3.800 metros sobre o nível do mar. Portanto, é considerado o maior lago navegável e de maior altitude da Terra.
São cerca de 8.300 km² de área, e a profundidade vai até 280 metros. Segundo Walendowsky, o Titicaca tem características de ondulação oceânica, por causa dos ventos. “O tempo é instável e o clima é severo. Não esperava tanta dificuldade técnica”, relata.
As temperaturas no local variam 7º a 11ºC, no entanto, o aventureiro registrou -6ºC em uma das noites de expedição. Dentro da água, segundo Walendowsky, vai de 5º a 7ºC durante o dia. “Lá, o corpo entra em hipotermia de dois a três minutos”, conta.
Walendowsky fez paradas para acampar, em dez pontos pela costa do lago, em praias desertas. O tempo hostil, com sol forte durante o dia e noites congelantes, forçaram o aventureiro a fazer as paradas após o entardecer.
“A palavra que remete toda a minha jornada é intensidade. Tudo é muito intenso, o frio, muitas horas de barraca, cai a temperatura bruscamente à noite”, diz.
Em uma das paradas, Álvaro passou por uma chuva de granizo enquanto montava acampamento. “Tudo lá é muito incerto, pois passam tempestades de raios há metros de você, que não chega a te afetar”, comenta.
A maior parada durou dois dias, entre 22 e 24 de julho, em Yunguyo. No dia 23, ficou parado para passar na imigração, entre os dois países.
Também decidiu parar no dia 24 por segurança, pois havia a previsão de muito vento. O que de fato aconteceu, pois as rajadas passaram de 80 km/h. De acordo com o aventureiro, a ventania pode ser efeito colateral da explosão do vulcão Ubinas, próximo a Arequipa, cidade no sul do Peru.
“Esses ventos causaram muitos estragos, eu estava numa vila de pescadores. Durante 23 horas dentro da barraca, fiquei por cinco horas segurando ela para garantir a estrutura”, relata.
Walendowsky presenciou o naufrágio de três botes de pesca. Segundo ele, em outros locais, como em Puno, teve o registro de que cinco embarcações de grande porte com turistas afundaram e que três pescadores desapareceram.
Outra parada foi em uma praia na cidade Copacabana, na Bolívia, no dia 25. Ali, ele precisou reportar a passagem, após sair do Peru, para a Armada Boliviana (como chamam por lá a Marinha). Além disso, foi em busca de mais alimentação.
Ao chegar no Estreito de Tiquina, no dia 27, o aventureiro decidiu continuar o caminho no lago maior, sem entrar no lago menor. A falta de alimentação e a dificuldade de se reabastecer motivaram a escolha, pois poucas localidades na costa do lago tinham mercados e vendas de comida.
“Era em um dia que estava me sentindo muito fraco, vai abalando o psicológico também”, recorda.
Ele lembra que, na literatura, muitos navegadores e exploradores, que se aventuravam em ambiente frios, padeciam e morriam de escorbuto, causado pela falta de vitamina C. Por serem locais com falta de frutas, o alerta fez Álvaro ir em busca do alimento.
“No estreito, encontrei suco e frutas em vendas de rua, e realmente deu um upgrade, melhorei”, diz. Como não crescem frutas no local, por causa do clima frio e seco, Walendowsky explica que muitas das que são encontradas por lá são da Amazônia peruana.
Para lidar com a solidão, quando não podia entrar em contato com a esposa Sarita Walendowsky, Álvaro tinha a companhia de um livro: Os Segredos dos Incas, Astecas e Maias, de Philippe Aziz.
Com experiência em expedição em outros países, o Lago Titicaca se destaca. Ele conta que a parte cultural desta aventura o marcou muito, pela cultura Inca.
“O próprio livro conta a lenda que os incas saíram de dentro do lago. Estar remando, em um ambiente desses, lendo sobre a cultura e os mistérios do lago, é muito mais do que a própria expedição, é remar dentro da história”, diz.
Locais históricos, contados no livro, fizeram parte do caminho. Como a Ilha do Sol, local onde, segundo a lenda, os Incas foram após saírem do lago por ordem do Deus Sol, para iniciarem o grande Império.
Com toda a intensidade da expedição, Walendowsky chegou novamente em Puno no dia 30 de julho, após a circum-navegação. Chegava ao fim da aventura e de uma grande experiência.
Em uma avaliação, Álvaro diz que está acostumado a remar sozinho, pois é difícil encontrar alguém com a agenda disponível para grandes aventuras e também com a mesma habilidade que ele. “Eu não costumo esperar por esse tipo de coisa, embarco e vou embora”, diz.
Quando fala de canoagem de expedição, ele explica que é preciso ter conhecimento técnico, pois o próprio caiaque é um equipamento técnico. Existem práticas e tecnicidades que garantem o bom aproveitamento da canoa.
Além disso, ele conta que precisa de uma boa resistência física e habilidades ao ar livre. “Dias depois, vi em redes sociais pessoas comentando que a barraca que eu usei não era boa. Mas ela aguentou vento de mais de 80 km/h, ou seja, você tem que saber usar o equipamento. Não é só montar o negócio e deu, ela passava por reparos constantes”, explica.
A dica para quem tem interesse neste tipo de expedição é começar por águas mais tranquilas, como baías. Também participar de atividades de experiência e cursos, em ambientes controlados.