Centenário de nascimento de padre Reitz

Centenário de nascimento de padre Reitz

Por Aloisius Carlos Lauth
Sócio do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina

O fenômeno do desmatamento e das queimadas anônimas da Amazônia, que ocuparam o noticiário e fez emergir o artifício da soberania nacional, repercutiram nesta semana com o novo incêndio na Serra do Tabuleiro.

Idêntica tragédia ambiental colocou frente a frente o General Geisel e o brusquense Padre Reitz, que é homenageado pelo Centenário de Nascimento. Raulino Reitz (1919-1990), cidadão honorário de Brusque, ganhou destaque nacional por ocasião do flagelo da malária que atingiu o litoral de Santa Catarina nos anos 40.

Foi convidado a integrar a equipe de controle da epidemia pelo Ministério da Saúde, que se estabeleceu em Brusque, com a finalidade de determinar o agente causador da doença, pois havia a hipótese de que as bromélias, conhecidas como gravatás, eram as responsáveis.

Seu trabalho consistiu em determinar as espécies de bromélias e avaliar as condições dos fatores de pesquisa das seis Estações de Coleta em Brusque: Ribeirão do Ouro; Maluche; São Pedro; Müller, localizado no Limoeiro; Azambuja, nos fundos do Seminário; e a Fazenda Willy Hoffmann, hoje RPPN Chácara Edith.

O resultado confirmou que nenhuma das 42 espécies de gravatás analisadas eram criadouros exclusivos do mosquito subgênero Kerteszia, que transmite o protozoário Plasmodium, como vetor da malária.

A projeção nacional do padre alcançará em 1971 a indicação para o cargo de Diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. A inteligência do governo militar de 1964 entendia que a abertura da Rodovia Transamazônica, em plena floresta do Xingu, cortando o Brasil de Nordeste ao Pará, levaria prejuízos à imagem do governo revolucionário.

A solução arquitetada foi projetar o Jardim Botânico como o melhor do mundo, e nada mais conveniente de que um padre com formação botânica nos Estados Unidos e que já realizava o levantamento da vegetação de Santa Catarina e a publicava na enciclopédia ‘Flora Ilustrada Catarinense’.

Reitz e Geisel tiveram momentos comuns no Jardim e se manifestaram em posições contrárias quanto à preservação da floresta, como veremos. O diretor passou a defender a política de criação de parques nacionais enquanto Geisel planejava o crescimento econômico com base no uso dos recursos nacionais.

Ele transferiu o comando militar para a residência oficial do Ministério da Agricultura, no interior do Jardim Botânico, bem perto da Casa do Diretor. Geisel vinha de gestão bem sucedida na Petrobrás durante o Governo Médici, tendo modernizado a Refinaria Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.

Escolheu o isolamento do Jardim para preparar o Plano Nacional de Desenvolvimento de 1974-79, tempo em que conviveu com o vizinho padre Reitz por mais de seis meses. Ambos se encontraram diversas vezes em datas festivas, numa das quais o general plantou uma mudinha de Pau-Brasil, a árvore símbolo nacional à época.

A relação de Reitz com Geisel foi tipicamente de vizinhos, não tão próximos para serem considerados amigos, e não tão distantes para se avistarem em ocasiões especiais e se vigiarem. Um sabia, praticamente, da vida do outro; pelo menos, diziam saber! Serão poucas as ocasiões de intimidade.

Em setembro de 1973, Ernesto Geisel aceitou participar da comemoração da Festa das Árvores, largando o esconderijo para as primeiras aparições públicas no Rio.

Foi recebido cordialmente por padre Reitz na inauguração do Bosque de Pau-Brasil, acompanhado de Joaquim de Carvalho – presidente do IBDF; o arquiteto Lúcio Costa; Fernando Barata, Secretário de Cultura do Estado; Edmundo Campelo, Secretário de Agricultura; Luis Edmundo Paes, vice-presidente do IBDF; o conselheiro Augusto Ruschi; o embaixador Afrânio de Melo Franco, e José Piquet Carneiro, da Fundação Brasileira para Conservação da Natureza.

As autoridades plantaram 32 mudas de Pau-Brasil, das 50 trazidas de Porto Seguro, na Bahia, para os festejos do Marco do Descobrimento do Brasil. Na conversa do grupo, Carvalho comentou a possibilidade de exploração das florestas artificiais por parte do governo militar, pois a demanda por matéria prima para a indústria papeleira concentra-se sobre a mata nativa, enquanto as florestas exóticas, mais homogêneas, apresentavam rendimento superior.

Ele deu apoio incondicional ao reflorestamento por pinus e eucaliptos. E lembrou que o comércio mundial de madeira e celulose atingia a cifra de 110 bilhões de dólares, tendo o Brasil apenas 20% de participação, o que foi considerado baixo pela extensão territorial.

Porém, Reitz afirmou aos presentes, cordialmente, que dois grandes flagelos ameaçavam o mundo da época: a poluição e a fome. A salvação estaria na conservação das áreas verdes nativas, não associadas à agricultura de grande extensão, que deveriam privilegiar o uso de tecnologias.

Um jornalista escreveu que o general Geisel teria se manifestado preocupado com a restrição de áreas de plantio pela criação de parques nacionais e reivindicou o apoio de todos para que nada impedisse o progresso do Brasil, referindo-se aos movimentos protetores das florestas brasileiras.

O progresso da nação não poderia sujeitar-se a grupos ecologistas, segundo Geisel. Muito menos à proposta de criação de parques florestais nativos de padre Reitz. Piquet tentou dissuadir o general que era preciso criar uma consciência geral da preservação da natureza, fato importante para a sobrevivência no planeta. Mas o general não mediu palavras, dizendo estar atento ao problema ambiental, desde que não afetasse o desenvolvimento econômico.

‘Vou promover avanços de progresso no Brasil, mas não sei onde isto vai parar. Espero que a Natureza agüente’, pensando na compra futura da Usina Nuclear de Angra dos Reis, sucateada na Alemanha e vendida ao Brasil pela quantia de 10 bilhões de dólares. O resultado das conversas é visto atualmente.

Ao comemorarmos o Centenário de Nascimento de Padre Reitz no dia 19 de setembro corrente, o dilema do progresso frente à natureza permanece vigente. O impacto da destruição das florestas pode gerar consequencias irreversíveis à humanidade, basta observar nossos hábitos de controle do lixo, a preservação das águas, a necessidade de áreas verdes em Brusque e o potencial de enchentes no Vale do Itajaí-mirim.

Quanto ao progresso gerado, ainda inexiste uma política de redistribuição de renda!

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