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Com migração, menores de idade sem documentos geram demanda para Conselho Tutelar de Brusque

Falta de RG, CPF e certidão de nascimento causam problemas burocráticos na hora matrícula escolar

Com o grande fluxo de migrantes que vêm tentar a vida em Brusque, é cada vez mais comum que o Conselho Tutelar seja acionado porque menores de idade não possuem documentos básicos para a matrícula escolar.

De acordo com o órgão de proteção à criança e ao adolescente, foram atendidas 203 ocorrências de convívio familiar irregular entre 2013 e o primeiro semestre deste ano. Nesse tipo de situação, estão casos de menores de idade que vêm morar em Brusque com tios, padrinhos ou namorados, mas não trazem documentos.

A princípio, esse detalhe pode parecer algo meramente burocrático. Contudo, um adolescente sem responsável legal e desacompanhado gera uma série de implicações para Conselho Tutelar, Ministério Público e Polícia Civil.

Os conselheiros Nathan Krieger, Arilson Fagundes, Norberto Boos, Maria Zucco e Neide Dalmolin concederam entrevista em conjunto ao Município Dia a Dia para comentar sobre esta situação.

Os dados relativos ao trabalho do Conselho Tutelar foram compilados pelo próprio órgão, a pedido do Observatório Social de Brusque (OSBr).
De acordo com os conselheiros, o convívio familiar irregular não é crime.“É uma situação que tem aparecido, uma parte em razão do grande fluxo migratório para o município de pessoas que vêm de outros estados. Vem um adolescente e está morando com o tio ou amigo, não há uma situação jurídica regular. O tio ou padrinho quer matricular ele na escola, mas não tem documentos”, afirma o conselheiro Krieger.

O conselheiro Boos diz que os casos de adolescentes sem documentos, na sua vasta maioria migrantes, têm crescido recentemente. Segundo ele, a estatística cresceu consideravelmente neste semestre – que não está nos dados do Observatório Social.

Questão cultural

Enviar os filhos para tentar uma vida melhor em outras regiões é algo praticamente cultural em alguns pontos do país, dentre os quais o Nordeste, de onde vêm muitos migrantes que hoje vivem em Brusque.

“Me parece que existe uma questão cultural em outras regiões de mandar o filho morar em outro lugar em busca de emprego. Aqui, isso não é tão forte. Mas a gente precisa compreender a situação”, diz Krieger.

Boos conta que, em muitos casos, os adolescentes contam que a mãe autorizou a vinda deles desacompanhados. É comum que, na conversa com os conselheiros, os jovens comentem que os pais os levaram à rodoviária para ir morar noutro lugar.

De modo geral, não existe o cuidado com a parte burocrática, ou seja, trazer os documentos pessoais. Autorização por escrito para a matrícula escolar está longe da realidade de muitos.

As escolas, sejam estaduais ou municipais, não podem aceitar que uma pessoa que não é responsável nem tem autorização por escrito dos pais matriculem um jovem. O Conselho Tutelar pode auxiliar nessas situações.

“A escola matricula um jovem desse e ele começa a incomodar. Vai chamar quem? Chama a pessoa [que mora junto], e a pessoa não vai”, exemplifica Krieger.

O Conselho Tutelar tem que agir nesses casos porque desde 2014 o Ensino Médio também é obrigatório a todos os jovens. O órgão tem o dever legal de auxiliar para que nenhum adolescente fique sem estudo. Os conselheiros analisam caso a caso para encontrar uma solução.

Relacionamentos

O conselheiro Fagundes diz que, além dos casos de menores vivendo “ilegalmente” com tios ou padrinhos, há ocorrências nas quais adolescentes de 14, 15 ou 16 anos vieram de outros estados para viver com o namorado.

Esse tipo de situação também se enquadra como convívio familiar irregular porque eles não são maiores de idade, portanto, responsáveis por si perante a lei. Embora tenham vida de adultos, eles dependem de autorização dos pais para estudar, bem como amparo.

“Aí chega aqui, não dá certo com o namorado, onde vai ficar? Isso cria um problema para a gente conduzir essa questão. Está aqui sem um responsável, sem documentos, sem ir à escola”, indaga o conselheiro Boos.

Consequências legais

A vinda de jovens desacompanhados para Brusque também tem consequências mais graves na esfera policial. “Tivemos casos de adolescentes que cometeram atos infracionais e os pais estavam longe daqui. Não há um responsável legal, então o conselho tem que se virar, movimentar toda uma rede”, afirma o conselheiro Fagundes.

O problema para o Conselho Tutelar é que, como não tem responsável legal, o adolescente migrante não tem para onde ir. O órgão tem de acolhê-lo e buscar uma solução, dando encaminhamento para garantir os direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Bons exemplos

A migração de menores também pode dar certo. Há casos de pessoas que comunicaram o Conselho Tutelar que o sobrinho ou irmão mais novo ficaria por aqui. Não houve consequências e a matrícula ocorreu naturalmente.

Bons exemplos devem inspirar os jovens. O procedimento correto para um menor ir morar com um tio é que a mãe ou faça a matrícula dele na rede escolar ou faça uma procuração em cartório dando os poderes à outra pessoa. Desta forma, a escola pode aceitar a matrícula e não existe empecilho na vida do adolescente.


Demanda por documentos é alta na Assistência Social

A assistente social Fátima Machado, da proteção básica da Secretaria de Assistência Social, diz que é bastante comum que migrantes cheguem a Brusque sem documentos. A pasta fornece a certidão de nascimento – de qualquer lugar do país – gratuitamente.

A secretaria também provê uma declaração para que a pessoa possa fazer a carteira de identidade e o CPF sem pagar nada. O auxílio está aberto a todos.

A demanda por documentos é bastante grande, conforme Fátima. Apenas nesta terça-feira, 29, foram solicitadas 22 certidões de nascimento. “São benefícios eventuais concedidos pela Assistência Social”, diz.