Como outras cidades lidaram com o fim do fundo de apoio à Polícia Militar
Jaraguá do Sul e São Bento do Sul já passaram pela situação de Brusque e hoje são exemplos
Brusque segue em busca de solução para evitar o fim do Fundo Municipal de Melhoramento da Polícia Militar (Fummpom). O instrumento é utilizado para repassar recursos arrecadados pela prefeitura ao 18º batalhão.
A extinção do fundo deve-se a um processo do Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC). Essa forma de repasse é considerada inconstitucional porque através dele o município custeia a segurança pública. Contudo, a Constituição Federal prevê que essa prerrogativa é exclusiva do governo do estado.
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A mesma medida já foi tomada pelo MP-SC em outras cidades que mantinham modelo semelhante, e não foi possível revertê-la.
Cientes disso, o comandante do 18º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Otávio Manoel Ferreira Filho, e o presidente da Associação Empresarial de Brusque (Acibr), Halisson Habitzreuter, estudam o que pode ser feito.
Uma possibilidade que surgiu vem do Norte de Santa Catarina. Jaraguá do Sul e São Bento do Sul já contam com alternativas para que a prefeitura continue a repassar dinheiro à PM de forma legal.
Habitzreuter e o tenente-coronel irão conhecer a experiência de Jaraguá do Sul no próximo dia 15. A Acibr tem encampado o esforço para que se encontre uma alternativa ao Fummpom, a fim de continuar a contribuir com a segurança pública.
O vice-prefeito de Brusque, Ari Vequi, afirma que os bons resultados do município na segurança pública estão diretamente ligados ao alto investimento por meio do Fummpom. O Atlas da Violência 2017, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apontou a cidade como a segunda mais segura do país com base em dados de mortes violentas.
“Não tenho dúvidas disso. A polícia bem equipada, bem armada, dá resultado”, diz Vequi. A avaliação é que onde não tem apoio do município, a PM precisa ficar com o pires na mão em busca de recursos estaduais.
Ele diz que é preciso criar um modelo novo em parceria com o MP-SC e outras entidades, ou copiar algum que já esteja dando certo, como o de Jaraguá do Sul.
De acordo com Vequi, a prefeitura tentará “até o fim” uma alternativa. Mas ele também pondera que o prefeito Jonas Paegle não pode desrespeitar a legislação, sob pena de cair na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Jaraguá do Sul: alto investimento que dá resultado
Desde a divulgação do Atlas da Violência, Jaraguá do Sul ganhou projeção nacional como a cidade mais segura do país. Com mais de 170 mil habitantes, registrou apenas sete homicídios em 2017. Só dois deles relacionados ao tráfico de drogas – o que é considerado mais grave.
“O serviço de segurança é caro, oneroso porque é presencial”
O comandante do 14º Batalhão da PM, tenente-coronel Gildo Martins de Andrade Filho, diz que os bons índices estão relacionados a dois fatores: investimento e envolvimento comunitário.
“Os índices também estão relacionados à questão financeira. O serviço de segurança é oneroso, porque é presencial, com viatura, armamento, fardamento, colete balístico, pneus, enfim. É um serviço diuturno, 24 horas”, afirma.
Entretanto, o comandante ressalta que o sucesso é também fruto do envolvimento da sociedade na segurança pública. “Vai também do envolvimento do poder público, Judiciário, imprensa, Câmara de Vereadores, Ministério Público, clubes de serviço e entidades formam um conjunto para a segurança pública ser aceitável em termos de índices”.
Extinção do fundo
O Fummpom acabou em Jaraguá do Sul há oito anos. Na época, também causou preocupação à PM. Andrade conta que foi preciso esforço e trabalho para superar.
Atualmente, a cidade tem várias fontes de receita para o custeio das atividades do batalhão. Uma das principais é o Convênio Radiopatrulha. Funciona como um convênio comum entre a prefeitura e uma organização. Os repasses mensais, atualmente, são de R$ 35 mil, mas já chegaram a R$ 43 mil.
De acordo com a lei do convênio, o recurso é destinado a vários objetivos, como “as despesas de reequipamento, reaparelhamento, aquisição de material permanente, de consumo, alimentação, serviços específicos de ordem geral e demais despesas correntes e de capital, aquisição de bens imóveis, construção, ampliação e conservação de instalações da Organização Policial Militar”.
No último aditivo, a prefeitura também delegou à PM o poder de polícia – de obrigar a alguma coisa, visando o bem-estar da coletividade – para a fiscalização de ambulantes, alvarás e Código de Posturas do Município, ainda no âmbito do radiopatrulha.
Esse tipo de convênio é diferente do Fummpom, por isso não é inconstitucional. No caso do fundo, a origem do dinheiro são dois impostos municipais. A Constituição proíbe que um tributo do município pague um serviço privativo do estado.
O convênio funciona da seguinte forma: a prefeitura repassa mensalmente um valor – oriundo do caixa geral, não de um imposto – à PM. Ele é aprovado pela Câmara de Vereadores, e a PM tem de prestar contas da aplicação dos recursos.
Segundo o tenente-coronel, com o dinheiro desse convênio foram comprados R$ 150 mil em armas em 2017. Neste ano, foram adquiridos mais fuzis e carabinas calibre 12, no valor de R$ 100 mil. A lista de aquisições e investimentos é grande.
Mais fontes de recursos
A Polícia Militar jaraguaense possui mais dois convênios com a prefeitura. Um deles refere-se ao repasse de verba para o videomonitoramento na cidade.
O município conta com 60 câmeras e outras dez já foram compradas. O tenente-coronel informa que o repasse mensal para a manutenção desse serviço é de R$ 18 mil.
O terceiro convênio diz respeito às multas de trânsito. É comum e outras cidades já contam com ele, inclusive Brusque. O valor repassado varia.
Além disso, a PM tem um funcionário civil dentro do batalhão especializado em buscar recursos nas justiças federal e estadual, por meio de projetos. Também é uma fonte importante de dividendos.
Sociedade unida
O modelo de custeio da segurança jaraguaense também é resultado da sociedade que abraçou a causa. A Associação Empresarial de Jaraguá do Sul (Acij) apoia a polícia nos seus pleitos, assim como outras entidades.
No ano passado, por exemplo, um dos Rotary Club da cidade repassou R$ 40 mil. A PM usou o dinheiro para comprar lanternas para as pistolas dos policiais.
Há também uma associação chamada “Somos 14º Batalhão”, que faz ações de arrecadação de dinheiro e de divulgação da organização. Exemplo do prestígio da corporação é o Baile de Gala, realizado anualmente e que tem registrado sucesso de público.
Andrade explica que quando a ideia do baile foi criada, era “pra não dar prejuízo”. Hoje, dá lucro. O deste ano deve gerar R$ 25 mil, que também serão destinados ao batalhão.
Alto investimento
Com todas as fontes de recurso, inclusive doações de empresários, a PM de Jaraguá do Sul conseguiu investir R$ 2 milhões em 2017. Neste ano, já foram investidos R$ 1,6 milhão.
O comandante ressalta que se trata de investimento, não de custeio. O dinheiro foi gasto na compra de armas, munições, fardas e até mesmo viaturas. Somente neste ano foram adquiridas dez SUVs, por exemplo.
São Bento Sul conta com apoio dos empresários
Localizada também no Norte do estado e com 83 mil habitantes, São Bento do Sul passou pelo mesmo drama que Brusque e hoje convive com bons índices na segurança pública. Foram somente quatro homicídios em 2016, conforme o Atlas da Violência.
O major José Luis Cavessin, do 23º Batalhão de Polícia Militar, diz que o investimento local é fundamental para que a segurança pública vá bem. “As cidades que se mobilizaram para investir tiveram ganhos em segurança”.
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O Convênio Radiopatrulha também existe em São Bento. Segundo o diretor de contabilidade da prefeitura, Ricardo Homechen, o repasse mensal ao batalhão é de R$ 21 mil.
Cota facultativa
Mas o grande diferencial de São Bento do Sul é o envolvimento da sociedade com o apoio da Associação Empresarial (Acisbs). A PM local criou a Cota de Contribuição Facultativa (CCF).
A CCF é como se fosse uma doação para o 23º BPM. Funciona da seguinte maneira: a polícia emite um boleto com valores sugeridos de contribuição e envia à pessoa jurídica.
Se a pessoa quiser – por isso é facultativa – paga. O major José Luis explica que quem não paga não vai para a dívida ativa, não é cobrado nem tem qualquer sanção. Funciona como uma doação.
Neste primeiro momento, são enviados boletos somente para pessoas jurídicas. A prefeitura foi parceira e cedeu o cadastro do município onde constam todos os CNPJs com registro na cidade.
A PM usa essa base de dados e emite os boletos. A parceria com a associação empresarial é importante porque em vez de entregar os boletos em cada porta, a polícia os envia aos contadores que fazem parte do núcleo da Acisbs.
Os boletos são emitidos sempre em setembro e outubro, com data de vencimento para o dia 15 do mês. Desta forma, o comando do batalhão já consegue saber quanto arrecadou quando o ano seguinte começa.
“As cidades que se mobilizaram para investir na segurança local tiveram ganho na segurança”
A comunidade tem abraçado a causa. “A nossa taxa de retorno é de 25% do total dos boletos emitidos para as pessoas jurídicas”, informa o major. O “tíquete médio” em São Bento é de R$ 66,82.
O projeto é considerado um sucesso e o 23º Batalhão considera expandi-lo para que as pessoas físicas também possam receber os boletos e doar à PM.
O major diz que o bom retorno é também fruto da transparência com a aplicação do recurso. Além disso, foram instalados outdoors pela cidade para informar sobre a CCF e como funciona.
O 14º BPM, de Jaraguá do Sul, copiou a CCF de São Bento do Sul, mas foi além. Segundo o tenente-coronel Andrade, a partir de setembro próximo também será possível que pessoas físicas contribuam através da conta de água do Samae.