Conheça o grupo de ajuda mútua de pais de Brusque que enfrentam a morte dos filhos
Encontros ecumênicos são realizados a cada 15 dias no Centro Evangélico
Há 16 anos, uma tragédia marcou a vida do pastor Claudio Schefer. Durante um retiro de catequese em Bombinhas, dois adolescentes de Brusque, que eram primos, morreram afogados.
O acidente entristeceu a cidade e mais ainda o pastor, que foi quem levou os adolescentes na viagem. “Foi um baque na minha vida. Eu tive que procurar ajuda pois não conseguia superar o que aconteceu. Perdi dois filhos espirituais”, conta.
Pastor Claudio foi fazer pós-graduação em Psicologia Pastoral e durante as aulas conheceu a Logoterapia, ciência que estuda o sentido da vida. Com isso, decidiu se aprofundar e fez uma pós-graduação específica em Logoterapia. As aulas aconteciam à distância, já que a escola ficava em Lima, no Peru.
Em 2013, quando participava em um congresso em Lima, o pastor conheceu o casal Gustavo e Alícia Berti, fundadores do Grupo Renascer. Durante o evento, eles fizeram um seminário sobre o grupo que é para ajuda mútua de pais que enfrentam a morte de filhos. O grupo surgiu em Córdoba, na Argentina, e se espalhou por vários países da América Latina.
Ainda sofrendo com a perda dos seus alunos na tragédia, pastor Claudio se interessou pela proposta do grupo e decidiu procurar por casais que enfrentavam a dor do luto pela perda de um filho em Brusque.
No início, não teve sucesso, já que o assunto é bastante delicado e nem todos se sentiam à vontade para falar sobre este sofrimento, por isso, a ideia de montar um Grupo Renascer em Brusque ficou parada por algum tempo.
Até que em 2015, em uma festa de casamento, o pastor conheceu o casal Haroldo e Margarida Tormena. Conversando durante a festa, Margarida comentou que havia perdido um filho. Foi então que o pastor falou sobre a proposta do Grupo Renascer e ela se interessou.
O casal Oscar e Sueli Lauritzen também foram indicados para participar e assim, em maio de 2015, com o pastor Claudio e os dois casais foi dado início ao Grupo Renascer em Brusque, o primeiro do Brasil.
A primeira reunião foi realizada em junho de 2015. Desde então, o grupo se reúne às quartas-feiras, de 15 em 15 dias, no Centro Evangélico Luterano. Atualmente, a média é de 20 a 25 participantes por encontro.
“A proposta é a ajuda mútua. Não tem especialista, religião, pessoas de qualquer crença podem participar. Ainda existe resistência, mas aos poucos vamos quebrando isso. Aqui contamos as histórias uns para os outros. Quando entram pais novos, nós nos vemos neles e eles também conseguem ver em nós como estarão daqui a pouco, com a transcendência do sofrimento”, diz o pastor.
O grupo não tem cunho religioso e é aberto a todos aqueles que sofrem com a perda de um filho, não importa o tempo. Os encontros recebem casais, mas também pais e mães que preferem frequentá-lo sozinho.
“Às vezes a mãe quer participar, mas o pai não quer, não tem problema. Pode ir sozinha tranquilamente, todos serão muito bem recebidos. Se engana quem pensa que é um grupo para chorar, temos nossos momentos, mas também temos música e descontração”, destaca o pastor Claudio.
“Dá medo de tocar naquilo que não queremos mexer”
Quando decidiu auxiliar o pastor Claudio na fundação do Grupo Renascer, fazia 19 anos que um dos filhos de Margarida havia partido, vítima de um acidente de trânsito. Ele tinha 17 anos na época. Mesmo passados quase 20 anos, o sofrimento permanecia igual e o seu luto ainda não estava elaborado.
“Quando o pastor me falou sobre o Renascer e eu li o material, eu me encontrei nele. No início deu medo de tocar naquilo que eu não queria mexer. Mas já no começo vi que foi a decisão mais positiva que eu poderia ter tomado”, conta.
Foi com o compartilhamento das histórias e dos sentimentos em comum, que Margarida conseguiu elaborar o seu luto pela partida do filho. “Depois da partida dele, eu consegui tocar a família, sabia que a vida tinha que continuar, mas eu percebia que não estava curada. Foi depois do grupo que comecei a me sentir melhor. Não é que não dói mais, dói, mas ficamos mais fortalecidos e saramos aos poucos”.
Durante os encontros, os participantes compartilham suas histórias, e ouvem depoimentos de pessoas que passam pelo mesmo sofrimento. O diálogo também está sempre muito presente. “A conversa é diferente aqui, porque quem nunca passou por isso não consegue entender o que sentimos. Aqui todo mundo se entende. São situações iguais. As partidas podem ter sido diferentes, mas a dor é igual”, destaca.
Com o passar dos anos, Margarida foi se fortalecendo e com a transformação que o grupo fez em sua vida, foi motivada a iniciar um novo desafio. Hoje, aos 61 anos, está cursando a faculdade de Psicologia, na Unifebe. “Graças ao grupo eu retomei os estudos. Antes, eu me sentia despreparada para estar presente aqui e fazer o acolhimento dos novos pais que chegavam, por isso, decidi fazer Psicologia, para ter esse olhar empático sobre a dor humana. Isso é o que me mantém”.
“Eu não tinha dúvida que seria uma coisa boa”
Quando Luciana Raimundo Marcos decidiu entrar no Grupo Renascer, fazia 11 anos que seu filho do meio, então com 12 anos, havia partido vítima de câncer. Ela conta que depois da morte do filho procurou diversas formas de ajuda, mas seu marido ainda tinha resistência de falar sobre o assunto, o que de alguma forma acabava atrapalhando o relacionamento do casal.
Ela recebeu o convite para participar do grupo e conseguiu convencer o marido a participar também. “Eu não tinha dúvida que seria uma coisa boa”, diz.
O fato de ter muitos homens participando do grupo facilitou a entrada do marido de Luciana. “Deu uma segurança pra ele. Depois que começamos a participar, melhoramos muito nossa relação, conseguimos conversar e acessar coisas que estavam escondidas lá no fundo”, afirma.
Luciana destaca que o ambiente do grupo é sem julgamento, já que todos compartilham dos mesmos sentimentos. Às vezes, os encontros são marcados pelo choro de saudade, em outras, tudo transcorre de uma forma tranquila e descontraída. “Tem encontros que choramos muito, isso faz parte do processo. É um ambiente confortável para colocar tudo para fora”.
“Cada encontro eu saía mais forte”
Passado apenas um mês da perda precoce e repentina do pequeno Tiago, de 3 anos e oito meses, que Roberta Baumgartner começou a frequentar o Grupo Renascer.
O menino partiu no dia 1 de janeiro de 2017, após contrair uma bactéria. A perda do único filho foi um grande choque para Roberta e o marido. “Eu perdi o meu chão”, diz.
Semanas após a morte do filho, Roberta foi procurada por uma sobrinha de Margarida Tormena que lhe falou sobre o Grupo Renascer e perguntou se ela gostaria de participar. Roberta se interessou e dias depois recebeu a visita da própria Margarida em seu trabalho a incentivando a participar. A partir de então, ela e o marido decidiram frequentar os encontros.
“Comecei em fevereiro de 2017, fazia só um mês da perda. Eu só chorava, passei meses indo aos encontros e só chorando, mas a cada encontro eu percebia que saía mais forte”, conta.
Com o passar do tempo, Roberta foi se sentindo mais confiante e retomando a alegria de viver. Foi com a participação nos encontros que ela e o marido ganharam forças para tentar uma nova gravidez. Em dezembro de 2017, 10 meses após perder Tiago, o casal ganhou Téo, que vai fazer dois anos em 2019.
“O grupo nos acolheu e foi o que nos deu força para continuar. Em 2017 eu perdi um filho e em dezembro recebi outro”.
Roberta e o marido ainda frequentam os encontros e sempre vão acompanhados do pequeno Téo. Ela diz que o grupo foi extremamente importante para aprender a administrar a dor pela perda do filho.
“Hoje quando chegam pais novos eu me vejo neles. Me coloco no lugar deles porque já estive lá. Nós precisamos dessa ajuda, dos textos, das conversas. Aqui é onde podemos descarregar e é onde arrumamos forças para continuar. Nós entendemos a dor um do outro, só quem passa por isso sabe como é”.
Grupo Renascer
Encontros nas primeiras e terceiras quartas-feiras de cada mês, no Centro Evangélico Luterano, das 19h30 às 21h. Mais informações: (47) 9 9997-0564 ou (47) 9 9246-4054.