Conheça o trabalho do Alcoólicos Anônimos, que há mais de quatro décadas atua em Brusque

Grupo Novo Lar dá apoio e salva vidas afetadas pelo abuso da bebida alcoólica

Conheça o trabalho do Alcoólicos Anônimos, que há mais de quatro décadas atua em Brusque

Grupo Novo Lar dá apoio e salva vidas afetadas pelo abuso da bebida alcoólica

É noite de missa na Igreja Matriz São Luiz Gonzaga, no centro de Brusque. O som dos cantos ecoa pelas estruturas e é audível para quem chega no salão paroquial. No primeiro andar do prédio, na sala 10, um grupo de pessoas se reúne três vezes por semana, nas segundas, quartas e sextas-feiras, das 20h às 22h. É o Grupo Novo Lar, de apoio para alcoólicos anônimos em busca pela recuperação, que atua na cidade por mais de quatro décadas. 

Antes de começarem as partilhas, a reunião é introduzida com uma oração especial. A primeira pessoa a falar é uma mulher, que informa o primeiro nome e se apresenta como alcoólatra em recuperação. 

“O alcoólatra não está na rua, não tem raça, discriminação, distinção econômica ou idade. O alcoolismo pode atingir a todos”, diz em uma parte. 

O próximo a falar é um homem, de aproximadamente 60 anos de idade; destes, está há 20 sem ingerir bebida alcoólica. Ele fala do desafio de evitar o primeiro gole e do medo da recaída. 

Alguns decidem ficar em silêncio, mas todos escutam e agradecem pela confiança dada, resultado do anonimato. O desejo, após a partilha, é ter mais 24 horas de serenidade e sobriedade.

A partilha segue, entre homens e mulheres, de diversas idades, histórias e desabafos. São anos sem beber, recaídas no fim de semana, arrependimentos, perdas, mas também histórias de redenção. A volta por cima. 

Todos ali têm o mesmo propósito: livrar-se do alcoolismo, considerado doença pela Organização Mundial da Saúde.

Luiz Antonello

O primeiro passo

O cansaço, a euforia ou a depressão são gatilhos para o temível primeiro gole. É o que explica o aposentado Adalberto, de 77 anos de idade, que participa do grupo há mais de 30 anos.

“O alcoolismo é uma doença e o álcool é mais forte do que nós. Ou você bebe para morrer ou para de beber para viver”, comenta.

Alguns integrantes até citam que, quando começaram a frequentar as reuniões, foi um choque descobrir que o alcoolismo era de fato uma doença. “É uma que não tem cura, ela fica estabilizada”, conta um deles.

Adalberto, que é um alcoólatra em recuperação, relata que o grupo de A. A., Alcoólicos Anônimos, foi a melhor saída para ele. Recorda que quando ingeria bebidas alcoólicas perdia o domínio da própria vida. “Eu sabia que era um alcoólatra, mas não admitia. Negava para as pessoas e para mim mesmo”, admite.

Ele conta que bebia para ter coragem, até para conversar com a esposa, pois não tinha uma comunicação adequada. Achava que poderia “arrumar” ela. “Eu achava que eles tinham que me aceitar e não cobrar. Quando falavam para não beber aí era quando eu bebia muito”, continua.

Após uma noitada, chegou a pensar que não iria mais sair do alcoolismo. Foi quando pediu ajuda para a esposa. Ela sugeriu o A. A. e ele veio para uma reunião.

“A doença é física, mental e espiritual. Nas duas primeiras, o alcoólatra pode procurar por um profissional, mas a parte espiritual ele precisa buscar. Hoje vivo em paz”, completa.

Luiz Antonello

Problemas do álcool

Entre as falas dos integrantes estão as desconfortáveis motivações de conhecidos, que, em alguns casos, até fazem o convite para beber uma cerveja a fim de comemorar a sobriedade.  “Sabemos que não é por mal, eles não fazem ideia de como é passar pelo alcoolismo”, diz um homem.

O abuso do álcool vai além. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a OMS, em todo o mundo 3,3 milhões de homens e mulheres morrem anualmente pelo uso nocivo de bebidas alcoólicas. Para se ter uma ideia, quase 6% das doenças mundiais são causadas pelo álcool. 

Ainda de acordo com o relatório da OMS, divulgado em 2018, 28% das mortes provocadas pelo consumo de álcool são resultado de lesões, como acidentes de trânsito. 

Outras 21% são distúrbios digestivos graves, 19% são doenças cardiovasculares e o restante doenças infecciosas, câncer e transtornos mentais.

Cura possível

Com reuniões e o efeito terapêutico, o A. A. é um programa de reabilitação e recuperação. Criado em 1935, nos Estados Unidos, o alcoólicos anônimos é uma comunidade internacional. Em Brusque, o Grupo Novo Lar completou 41 anos de existência em 2 de outubro de 2019.

No programa, é possível encontrar formas de se manter sóbrio, com 36 princípios: 12 passos, 12 tradições e 12 conceitos. 

Adalberto explica que são os passos o maior foco do trabalho, pois se baseiam muito na espiritualidade. “As tradições também, mais na ordem de manter a irmandade e o anonimato. Os conceitos falam de trabalhos mundiais, mas tudo começa no grupo”, aprofunda.

Luiz Antonello

Vidas mudadas

No grupo está a pedagoga Márcia, 54. Ela relata que chegou no grupo para aprender a beber corretamente. Com o programa, viu que precisava ser tratada e parar de vez com a ingestão do álcool.

“Aqui é o caminho para esse tratamento, esse é o remédio. A frequência nas reuniões. As pessoas que estão aqui têm a mesma doença que eu, isso dá a liberdade para falar tudo o que preciso falar”, diz. 

Ela conta que perdeu um irmão de apenas 47 anos para um câncer no esôfago, relacionado ao abuso do álcool. Com o luto, ela bebeu cada vez mais, tornou-se agressiva e passou a mentir para a família.

Para se livrar do alcoolismo, ela ressalta a importância das pessoas próximas, principalmente dos familiares. Foi com o apoio das irmãs e do marido que ela veio para a primeira reunião, em 2016.  “A recuperação é pior quando solitária”, comenta.

Hoje, Márcia está há três anos no grupo e o mesmo período sem beber. “Eu voltei a ter a confiança da minha família. Tens que plantar a sementinha, falar que existe a doença e grupos de apoio, que dá certo tratar”, indica. 

Outra integrante é a autônoma Cristiane Fagundes, 51. Ela conta que aos 17 anos começou a sair para festas. Envergonhada, bebia para ter coragem de dançar. 

A bebida alcoólica se tornou um problema. Aos 36 anos de idade, depois de alguns apagões de memória, percebeu os danos. Com a ajuda de uma irmã e da mãe, Cristiane começou a participar do grupo, o qual frequenta até hoje. 

Entre recaídas e momentos de sobriedade, ela frequentava as reuniões, mas não se dedicava ao programa de recuperação. 

Em 26 de dezembro de 2009, após uma discussão de família, Cristiane sofreu com uma bebedeira. De acordo com ela, foi a última recaída. Então, voltou a frequentar as reuniões, iniciou o programa de reabilitação e o trabalho voluntário.

“O grupo é tudo. Se eu tenho uma casa e dois filhos formados, um adolescente crescendo, comida dentro de casa, é por causa do grupo. Se eu to viva, é pelo alcoólicos anônimos, eu dirigia bêbada, eu brigava. Hoje, dez anos depois, estou bem”, finaliza.

Grupo de A. A. Novo Lar
Salão Paroquial Igreja Matriz São Luiz Gonzaga, sala 10
Rua Padre Gatone, 75 – Centro de Brusque
Reuniões nas segundas, quartas e sextas-feiras, das 20h às 22h

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