Consumo ou não consumo?
São bem brilhantes, basicamente nas versões prata e ouro, os pretos me parecem mais úteis, pois já me encontro num lugar do tempo e reconhecimento sobre as coisas que de fato me serão proveitosas, atendendo minhas limitações financeiras e minha moral autossustentável que vem crescendo – refiro-me às sandálias e aos sapatos do momento. Sabe? Os brilhantes? Eu não os adquiri, eu ainda não sei se gosto deles. Virei bicho grilo?
Os óculos voltaram a ser uns aí que eu tinha aos 13? Acho. Me arrependi de não ter guardado um, ao menos. Logo “desarrependi” porque é preciso desapegar, reutilizar, reciclar, assim palpita uma voz que consola sempre que me frustro na impossibilidade do consumo.
Os colares búzios de repente morderam como vampiros os pescoços de uma em cada sei lá quantas eu encontro nas redes ou na vida. As conchinhas, não de hoje e sim desde que lembro fitá-las nas praias, pontilhadas na areia, são lindas e do mesmo modo como enfeite, adornos femininos. Mas, perderão razão no próximo verão.
Quando populariza, quando vende feito balde, perde o código de originalidade e nesse ritmo, outras conchas ou pedras ou cordas ou flores ou nada para pescoços e sim para os pés ou o dedinho da mão, viralizará nossos corpos. Não é maldizer, é constatar.
Ainda paira uma confusão. Desejo ter pois admiro as tendências como expressões sociais ou eu as rejeito porque simbolizam a sujeição e o consumo? A interrogação faz compreender ou nos ofende? O momento que passo a curtir o que irrompe pendurado nas pessoas é um mistério, embora seja sabido que as estações do ano são sinais, ecoa:
– Contemplem o hemisfério norte, percebam o que ele diz. Isso mesmo, jaquetas gigantes “streetwear” para o frio que chegará. Se vestires comunicarás o quão munido és.
Como assim jaquetas gigantes? É feio, não? Prestando mais atenção, na versão atual e com tais detalhes ficam bacanas. Eu quero, desejo. Preciso. De duas.
A fugacidade da moda é pegajosa, aspira nossos olhos por corredores urbanos e virtuais. Está cada vez mais difícil ficar inerte a ela. É preciso vender e comprar, é preciso comprar muito para dar conta da paz instantânea que a vaidade promove ao eu, é preciso comunicar que podemos dizer sem voz que a cor do batom é essa, o lenço é esse, o biquíni é esse. E não até isso tudo deixar de servir ou envelhecer, talvez nem até a próxima estação, o limiar da troca está no acesso. A intenção é que os anéis fininhos que são o etilo agora, por exemplo, ou a maquiagem pesada, sejam desejados e vendidos a rodo; assim que chegarem ao orgasmo de boa parte do povo, acaba, vira-se para o lado e anseia-se por algo que nem todos tenham.
Tenho uma correntinha que ganhei de minha mãe, um peixe dourado. Costumam dizer que é bonita. Ela comprou quando eu era criança. Tenho três calças jeans que comprei em brechó, são de marca, e fazem jus à qualidade, ufa! Só os botões não estão mais tão “in”. Blusinhas brancas eu troco vez e outra, amarelam. Gosto de anéis grandes, prata geralmente. Já me senti esquisita em usar muitos de uma vez só, como eu costumava. No entanto os fininhos me sinto ainda mais bizarra. Minhas bolsas são sacolas. Eu colecionava várias cores. Uma linda e boa é tão mais livre. Não faz mais sentido ter tanto.
A ditadura do consumo, minha gente. Desviem-se, empresas não fecharão por isso, nem nos tornaremos sem graça. Encontrarmos belezuras em uma vitrine com saias vermelhas curtas, tem nada de errado, não. Mas nos sentirmos despreparados para encarar as ruas pela falta delas, e das brancas, e das longas, e das com babadinhos, e as que as blogueiras ou os blogueiros disseram ser item necessário, aí acredito que nos perdemos de nós mesmos. A cultura do que vestir anda em direção a uma união planetária, corrijam-me os entendidos. Talvez nos tornemos uma grande tribo – uma ingenuidade, será? Depois de posicionamentos como da ilha inglesa? Enfim, eu mesma curti usar calças saruel após visitar a África, enfeitarmo-nos pode expressar identidade, mas entupir nossos armários com etiquetas nem arrancadas, mal saber o que temos ou comprarmos o que nem gostamos tanto, “over and over again” sabendo do mínimo que está pegando ao nosso redor, para mim isso é grave.
Não é maldizer, é constatar. Incomoda?
Karline Beber Branco – professora