Delegado e comandante da PM avaliam medidas do pacote anticrime
Projeto elaborado pelo ministro Sérgio Moro altera 14 pontos da legislação
Projeto elaborado pelo ministro Sérgio Moro altera 14 pontos da legislação
No dia 19 de fevereiro foi encaminhado ao Congresso Nacional o “Pacote Anticrime”, elaborado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, sob o comando do ministro Sérgio Moro.
O pacote foi dividido em três projetos: um altera a competência da Justiça Eleitoral, outro trata sobre a tipificação do crime de caixa dois e o terceiro aborda as demais propostas de alteração legislativa.
As medidas só serão enviadas para a sanção do presidente Jair Bolsonaro depois de passarem por comissões do Congresso e serem aprovadas pelo plenário das duas Casas, por maioria simples.
A proposta altera 14 pontos do Código Penal, Código de Processo Penal, Lei de Execução Penal, Lei de Crimes Hediondos e Código Eleitoral.
Avaliação
O comandante do 18º Batalhão de Polícia Militar de Brusque, tenente-coronel Otávio Manoel Ferreira Filho, e o delegado da 17ª Delegacia Regional de Polícia Civil de Brusque, Fernando de Faveri, apoiam o pacote anticrime.
“Isso vem a contribuir para o desestímulo da prática criminal e facilitar o desempenho profissional e a atividade dos órgãos de segurança pública”, diz o tenente-coronel.
Ferreira Filho e Faveri deram um parecer sobre algumas das medidas sugeridas nos projetos.
Encarceramento
Como é: quando condenado, o acusado é recolhido apenas se houver requisitos para prisão preventiva.
O que muda: o acusado deve cumprir a sentença imediatamente após condenação pelo Tribunal do Júri.
O tenente-coronel concorda com a mudança proposta. “Seria frustrante você estar em um júri popular, como familiar de uma vítima, e saber que a pessoa foi condenada, muitas vezes de forma unânime, e a pessoa permanece respondendo em liberdade”, diz Ferreira Filho.
Legítima defesa
Como é: situação em que alguém “usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
O que muda: para os civis, o juiz poderia reduzir a pena em 50% ou não aplicá-la se o excesso decorrer de “medo, surpresa ou violenta emoção”. Para os policiais, torna explícita a legítima defesa quando os mesmos estão em conflito armado ou sob risco ou previne agressão contra si mesmo ou terceiros.
O tenente-coronel e o delegado acreditam que a mudança proposta é positiva e vai dar mais respaldo ao serviço dos profissionais da segurança pública.
“Nós estamos numa fase que o agente de segurança pública se sente limitado, se sente coagido a agir pois o respaldo é o mínimo possível, principalmente naquelas ocorrências onde é preciso tomar atitudes mais enérgicas”, avalia Ferreira Filho.
Faveri diz que a mudança também faz com que o criminoso tenha ciência de que o policial está legitimado a agir para defender a sua vida ou de terceiros.
“Você vai garantir uma segurança jurídica para o policial e também obviamente para aqueles que atuam defendendo sua família, patrimônio e vida, principalmente no caso dos agentes de segurança que acabam tendo confronto armado com criminosos”, comenta o delegado.
O oficial ainda diz que não acredita no aumento da violência policial ou no aumento do abuso. “Obviamente que o abuso tem que ser coibido, mas essas situações da lei, são situações de legítima defesa, que eu acredito que são importantíssimas para o policial”.
Organização criminosa
Como é: não se refere a grupos específicos. O critério atual, mantido no pacote, define como reunião de quatro ou mais pessoas com objetivo de obter vantagem mediante prática de infrações.
O que muda: acrescenta caracterização como associação que se vale da violência ou da força de intimidação para adquirir controle sobre atividade criminal ou atividade econômica. Cita exemplos, como o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Ferreira Filho comenta que as últimas prisões feitas pela polícia, principalmente de tráfico de drogas, estão ligadas ao crime organizado. “Qualquer ação que venha combater e desestimular essa prática, que cada vez mais tem crescido no nosso país, é bem vinda. O crime organizado está se enraizando em torno de nós e isso sim é uma ameaça para a sociedade”.
O delegado diz que grande parte dos crimes de homicídio e crimes violentos tem uma relação direta ou indireta com organizações criminosas. “Eu acho que o endurecimento dessas penas e do tratamento penal dos criminosos vinculados a organizações criminosas é imprescindível para reduzir a taxa de homicídios no Brasil”.
Soltura de criminosos
Como é: esses critérios não obrigam a negativa de liberdade provisória.
O que muda: o juiz deveria negar a liberdade provisória para presos em flagrante reincidentes ou membros de facções.
“Isso nada mais é do que diminuir a liberdade do juiz, principalmente na audiência de custodia, diminuindo assim o numero de marginais na rua e aumentando a sensação de punidade”, diz o tenente-coronel.
Ele ainda coloca que o grande problema desta medida é a falta de lugar nos presídios, pois estão sobrecarregados. No entanto, ressalta que apesar dessa dificuldade, “o problema fica maior mantendo os presos na rua cometendo crime”.
O delegado regional comenta que a medida vem em boa hora, principalmente por deixar mais rígido o tratamento aos integrantes de organizações criminosas, dificultando sua liberdade provisória após a prisão.
Prisão em 2ª instância
Como é: a detenção em 2ª instância não é obrigatória, mas pode ser determinada pela Justiça.
O que muda: cumprimento de pena de prisão ocorreria imediatamente após condenação em segunda instância.
O delegado diz que essa medida deixa clara a legalidade da prisão após condenação em segunda instância. Faveri explica que se aprovada a alteração na lei, o condenado poderá recorrer, mas deverá aguardar o recurso cumprindo a pena imposta.
“O que eu acredito que possa acontecer é um aumento na velocidade do cumprimento da pena, seja aumentando a quantidade de prisões, seja cumprindo penas que não sejam de prisão necessariamente. Vai acelerar o andamento do processo penal”.
Veja outros pontos que podem ser alterados se o pacote anticrime for aprovado.
Embargos infringentes
Como é: cabível em decisão não unânime, não necessariamente sobre absolvição ou condenação. É válido para divergência, por exemplo, sobre tamanho da pena.
O que muda: o recurso poderia ser usado em caso de divergência entre votos dos desembargadores e dos ministros sobre a condenação e absolvição do réu.
Cumprimento das penas
Como é: para condenados por crimes hediondos, é prevista progressão de regime após cumprimento de dois quintos da pena, se o apenado for primário, e de três quintos, se não for. Reincidentes não são obrigados a ingressar direto no regime fechado.
O que muda: ao condenado reincidente, o regime inicial seria fechado. O mesmo valeria para sentenciados por peculato, corrupção ativa ou passiva e roubo com arma de fogo, com explosivo ou se resultar em lesão grave ou morte. Em caso de crimes hediondos com morte de vítima, a progressão ocorreria após cumprimento de três quintos da pena. Iniciariam pena em prisões de segurança máxima os líderes de organizações criminosas. Condenados por integrá-las não poderiam progredir de regime.
Armas de fogo
Como é: Não está prevista condenação anterior como critério para aumento da pena. Atualmente, incide agravante em caso de reincidência que só ocorre quando o novo crime é posterior a uma condenação definitiva.
O que muda: pena para porte ilegal de arma de uso permitido, disparo, posse ou porte de armamento restrito, comércio ilegal e tráfico internacional será aumentada em 50% para quem já tenha sido condenado.
Produto do crime
Como é: prevê a perda do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito obtido com o fato criminoso. Mas não estabelece critérios detalhados. Estipula que os bens poderão ser leiloados em favor do poder público.
O que muda: em caso de condenação por infrações com pena máxima superior a seis anos de reclusão, poderia ser decretada a perda de bens que corresponderam à diferença de valor do patrimônio do condenado e aquele compatível com seu rendimento lícito. Obras de arte poderiam ser destinadas a museus públicos.
Uso de bens
Como é: juiz determina a avaliação e a venda dos bens em leilão público. A previsão de utilização pelos órgãos de segurança pública existe na Lei de Drogas.
O que muda: o juiz poderia autorizar a utilização do bem pelos órgãos de segurança pública. O órgão que participou da apreensão teria prioridade.
Evitar a prescrição
Como é: esse critério não está previsto na prescrição.
O que muda: prescrição não poderia ocorrer na pendência de embargos de declaração ou recursos a cortes superiores.
Crime de resistência
Como é: a pena prevista para resistência é a mesma, mas não há multa e especificação sobre morte.
O que muda: estabelece multa para o crime de resistência e passa a prever pena de seis a 30 anos, no caso que resultar em óbito ou risco de morte.
Soluções negociadas
Como é: só existe nos juizados especiais criminais, para crimes com pena até dois anos, com nome de transação penal.
O que muda: permite acordos entre Ministério Público e investigados confessos, nos quais o acusado se comprometa a cumprir medidas. A pena poderia ser diminuída até a metade. O acordo evitaria necessidade de processo ou julgamento.
Crimes com reflexos eleitorais
Como é: esse procedimento não está previsto na legislação atual.
O que muda: nos casos em que o juiz, durante instrução criminal, deparar com provas de crimes eleitorais, por exemplo, deveria remeter cópia ao tribunal competente para apuração.
Caixa 2
Como é: o caixa 2 não está explícito como crime no Código Eleitoral, embora possa ser penalizado por outras leis.
O que muda: tornaria crime arrecadar, receber, manter, movimentar ou utilizar qualquer recurso paralelamente à contabilidade exigida pela legislação eleitoral, na prática o caixa 2. A pena seria de dois a cinco anos de reclusão.
Videoconferência
Como é: prevê uso da videoconferência como ferramenta excepcional.
O que muda: autoriza o juiz a interrogar réu preso por videoconferência para prevenir custos com deslocamento ou escolta.
Prisões federais
Como é: o período não pode ser superior a 360 dias, mas pode ser renovado.
O que muda: permanência de presos seria por três anos, renováveis por mais três.
Banco genético
Como é: há obrigatoriedade para condenados por crimes dolosos com violência grave ou hediondos.
O que muda: condenados por crimes com intenção, mesmo sem trânsito em julgado, seriam submetidos obrigatoriamente à coleta de DNA na chegada à cadeia. Os já presos, durante o cumprimento da pena.
Informante do bem
Como é: é possível recompensar o relato de informações, mas não há critérios.
O que muda: quem relatar irregularidades na administração pública teria direito à preservação da identidade e poderia receber até 5% do valor recuperado. A condenação não poderia ocorrer somente com base no depoimento.