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Por motivos religiosos, hospitais de Brusque não realizam abortos; entenda o que diz a lei

Apesar de permitido por lei, duas maternidades do município confirmaram que não fazem o procedimento

Permitido por lei em casos específicos, o aborto legal é autorizado e disponibilizado gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para gestações que colocam em risco a vida da mulher, decorrentes de estupro ou em ocorrências de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto). No entanto, dois dos três hospitais com maternidades em Brusque confirmaram que não realizam o procedimento.

A reportagem do jornal O Município questionou os hospitais Azambuja, Imigrantes e Dom Joaquim para entender o posicionamento sobre a questão.

O Hospital Azambuja, que realiza partos pelo SUS, afirma que não faz o aborto legal “independentemente das circunstâncias, em total alinhamento com a doutrina católica e conforme previsto em nossos estatutos”.

Além disso, a direção do estabelecimento se posiciona contra o aborto. “O aborto é um ato contrário à valorização da vida, sendo tratado como um crime à luz de nossos princípios éticos e religiosos”, informa a instituição, em nota enviada à reportagem.

Já a diretoria do Hospital Dom Joaquim alega que “reconhece que a temática constitui uma discussão que envolve uma série de nuances e pontos de vista, porém não realiza qualquer procedimento abortivo, bem como não incentiva sua prática”.

O Hospital Imigrantes, por sua vez, garante que “segue rigorosamente a legislação vigente no país” e que acompanha “as discussões acerca do aborto legal, assim como fazemos com todas as questões técnicas, jurídicas e humanas que tangem a área da saúde”.

No entanto, ao ser questionado se, de fato, realiza o aborto legal, em virtude do seguimento rigoroso à legislação, o Imigrantes informou apenas que “conforme a resposta enviada anteriormente, o hospital segue o que diz a lei em vigência sobre o tema” (confira notas completas ao final da reportagem).

Hospitais podem negar o aborto legal, mas tem obrigações

A advogada criminalista e membro da Comissão da Mulher da Subseção de Brusque da OAB, Camila Henle, explica que embora os hospitais privados possam negar o aborto legal baseado em suas diretrizes, devem seguir algumas normas.

“A recusa motivada seria invocar a objeção de consciência, recusando-se a realizar o procedimento legal por razões éticas ou religiosas, porém devem imediatamente encaminhar a paciente para outra instituição que faça o procedimento.”

Ela também esclarece que, mesmo diante de seus preceitos, em casos de risco à vida da gestante, o estabelecimento é obrigado a executar o procedimento. “Como nenhuma regra é absoluta, caso se constatar risco de vida para à gestante, em casos emergenciais devem prestar de imediato o serviço, não podendo negar atendimento.”

Além disso, podem sofrer penalidades. “Seja ele [o hospital] público ou privado, em caso de recusa injustificada ou não encaminhamento da paciente a outro hospital por recusa com base na objeção de consciência, o hospital poderá vir a sofrer sanções legais, como multas, perdas da licença de operação, serem responsabilizados administrativamente, civilmente e até penalmente.”

Já os hospitais públicos, que não existem no município, têm a obrigação de oferecê-lo nos casos permitidos por lei.

Médicos podem recusar, mas devem encaminhar pacientes

Para os médicos, a situação é semelhante. Eles podem se recusar a fazer o aborto legal, mas devem encaminhar a paciente para outro profissional ou instituição que o realize.

“A recusa poderá ser baseada na objeção de consciência, devido a suas convicções pessoais, religiosas ou éticas, mas, imediatamente deve encaminhar a paciente para outro profissional ou instituição que realize o procedimento. Apenas não pode recusar em caso de risco de vida da gestante, já que a prioridade é salvar a vida”, enfatiza a advogada.

A reportagem procurou o Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina (CRM-SC), para obter uma posição do órgão a respeito das explicações dos hospitais brusquenses, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para respostas.

Em caso de negativa, mulheres podem recorrer

Se a paciente procurar atendimento para o aborto legal e não conseguir realizá-lo, ela pode, além de relatar na ouvidoria do local, denunciar o hospital ao Ministério Público, ao CRM ou até ingressar com ações judiciais contra a unidade hospitalar para conseguir acesso ao procedimento.

“A paciente que teve negativa de realização do procedimento, deve solicitar por escrito a recusa e os motivos dados pelo hospital. Primeiramente, pode registrar uma reclamação na ouvidoria do local, depois, pode denunciar o hospital ao Ministério Público, Conselho Regional de Medicina, ou até ingressar ações judiciais contra o estabelecimento de saúde para que consiga realizar o procedimento”, detalha Camila.

Aborto e legalidade

A discussão sobre o aborto legal voltou a ser intensificada nas últimas semanas, após a aprovação de um projeto de lei que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio.

Atualmente, a legislação brasileira permite o aborto em três casos: quando a gravidez é decorrente de estupro, quando a gestação representa risco à vida da mulher e em casos de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto).

O aborto legal é disponibilizado de forma gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo o Mapa Aborto Legal, da ONG Artigo 19, qualquer hospital que tenha serviços de ginecologia e obstetrícia deve ter equipamento adequado e equipe treinada para realizar o aborto legal.

Confira as notas enviadas pelos hospitais na íntegra: 

Azambuja:

“O Hospital Arquidiocesano Cônsul Carlos Renaux – Hospital Azambuja é uma instituição comprometida com os princípios da Igreja Católica, que defende a vida desde a concepção até o seu fim natural. Em conformidade com esses princípios, que constam nas diretrizes estabelecidas em nossos Estatutos, o hospital se posiciona de forma clara e firme contra qualquer forma de aborto.

Para o Hospital Azambuja, o aborto é um ato contrário à valorização da vida, sendo tratado como um crime à luz de nossos princípios éticos e religiosos.

O Hospital Azambuja se mantém firme em seus valores e não realiza abortos, independentemente das circunstâncias, em total alinhamento com a doutrina católica e conforme previsto em nossos estatutos.

Atenciosamente,

Direção do Hospital Arquidiocesano Cônsul Carlos Renaux – Hospital Azambuja”

Imigrantes:

“O Hospital IMAS/imigrantes de Brusque segue rigorosamente a legislação vigente no país. Nossa prioridade é sempre o cuidado e o bem-estar dos pacientes, garantindo que todos os serviços prestados estejam em conformidade com a lei e com os mais altos padrões éticos e médicos.

Nossa instituição está sempre comprometida em fornecer informações claras e suporte adequado aos pacientes sobre os seus direitos e opções de saúde, com respeito e acolhimento necessário em cada situação. 

Acompanhamos as discussões acerca do Aborto Legal, assim como fazemos com todas as questões técnicas, jurídicas e humanas que tangem a área da saúde.”

Dom Joaquim:

“O Hospital Dom Joaquim, como uma instituição intimamente ligada à Igreja Católica, reafirma seus valores e posições com relação à defesa da vida. 

Neste contexto, por seu turno, reconhece que a temática constitui uma discussão que envolve uma série de nuances e pontos de vista.

Porém, não realiza qualquer procedimento abortivo, bem como não incentiva sua prática.”


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