Denúncia de prática ilegal de medicina por optometristas de Brusque é investigada em inquérito
Associação Brusquense de Medicina afirma que profissionais estão prescrevendo lentes, atribuição que é vedada por lei
Associação Brusquense de Medicina afirma que profissionais estão prescrevendo lentes, atribuição que é vedada por lei
A Associação Brusquense de Medicina (ABM) apresentou ao Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) denúncia de que profissionais optometristas estariam exercendo ilegalmente a medicina no município, pelo fato de estarem prescrevendo receitas de óculos, atribuição que, segundo a ABM, é privativa de médicos.
A representação foi feita a Promotoria de Justiça, que solicitou a instauração de inquérito policial pela Polícia Civil de Brusque. A investigação está na fase de oitiva de testemunhas. Segundo o delegado Fernando de Farias, são diversas testemunhas e investigados a serem interrogados, e por isso é que a investigação ainda levará um tempo até ser concluída.
O advogado Marcos Paulo Andrade Júnior, que representa a ABM no caso, explica que chegou ao conhecimento de profissionais médicos a ocorrência, com grande assiduidade, de ofertas de “exame de visão” no Centro de Brusque, acompanhadas, ainda, de ofertas para confecção de lentes e armações.
A ABM apurou que esses exames estão sendo feito por profissionais optometristas, em vez de médicos oftalmologistas. A denúncia elencou que há pelo menos oito profissionais que “vêm praticando atividade exclusiva de médico oftalmologista, quais sejam a prescrição de lentes de grau, realizado de consultas, exames e diagnóstico”.
Segundo o advogado, a Lei do Ato Médico, editada em 2013, definiu que é competência exclusiva do profissional de medicina o diagnóstico da doença que acomete o paciente.
“Exames de fundo de olho, aplicação de colírios e outros procedimentos do exame de vista não podem ser considerados não invasivos. Daí, conclui-se que a capacitação técnica não pode estar limitada à execução do procedimento”, explica o advogado.
Ainda sob o ponto de vista legal, o advogado da ABM esclarece que há entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerando ilegal que optometristas prescrevam a utilização de lentes.
“Resta evidente, comprovado que optometristas não podem ter consultórios para atender clientes, realizar exames e consultas, prescrever lentes de grau ou adaptação de lentes de contato, colocando em risco a saúde da população”, explica, na petição enviada ao MP-SC.
Para Marcos Paulo Andrade Júnior, o optometrista tem legitimidade para, ao receber a receita médica, analisá-la e transformar a receita em um produto final. “Essa é a função, não é a função médica”. diz.
A ABM alega que, além da questão jurídica, há risco à saúde dos pacientes que fazem avaliação oftalmológica com optometristas.
A oftalmologista Maiara Dalcegio Favretto explica que, por exemplo, a consulta oftalmológica não se limita à verificação de acuidade visual e prescrição de lentes – que tem sido feito por optometristas -, mas envolve outros fatores.
Segundo ela, a consulta exige conhecimento especializado para uma análise acurada que pode detectar, por exemplo, glaucomas e descolamento de retina, entre outras patologias que não estão necessariamente relacionadas à dificuldade de enxergar, fato que motiva a maior parte dos pacientes a procurar uma consulta oftalmológica.
A médica afirma que já atendeu diversos pacientes, em seu consultório, que apresentavam doenças não tratadas por terem feito, anteriormente, apenas o exame de acuidade visual.
“Quando a pessoa vai ao oftalmologista com baixa visão, é avaliado muito mais. A parte do óculos é apenas uma das partes da consulta oftalmológica. São feitos rastreios, há casos de ceratocone inicial, que se não tratados podem levar a um transplante de córnea”, detalha a oftalmologista.
Maiara esclarece que há casos de glaucoma, por exemplo, que não podem ser detectados apenas no exame simples. “O glaucoma é irreversível, se a pessoa espera baixar a visão para procurar o oftalmologista, não tem mais volta”, alerta.
O Município procurou, na quarta-feira, 11, o Conselho Regional de Óptica, Optometria e Contatologia do Estado de Santa Catarina (CrOO-SC), para que o órgão pudesse comentar sobre as investigações e também dar seu ponto de vista sobre a questão jurídica levantada pela Associação Brusquense de Medicina.
O departamento jurídico do CrOO-SC informou, no entanto, que não havia tempo hábil para responder os questionamentos da reportagem, o que será feito posteriormente.