Deputado pode doar parte do salário a entidades, mas não os “penduricalhos”
Especialistas alertam, no entanto, que candidato não pode fazer promessas a grupos específicos
Especialistas alertam, no entanto, que candidato não pode fazer promessas a grupos específicos
Esta campanha tem sido caracterizada pela promessa de candidatos de que doarão parte de seus salários para entidades e organizações beneficentes. Embora pareça eleitoreira, a prática é considera legal e não caracteriza compra de votos, conforme avaliação de advogados ouvidos por O Município.
Sérgio Bernardo Junior, advogado membro da Comissão de Direito Constitucional da OAB de Santa Catarina, explica que o candidato pode doar uma fatia dos seus rendimentos depois de eleito. Para isso, ele recebe o dinheiro na conta dele, depois o transfere para quem bem entender.
Bernardo Junior, que é especialista nas áreas Constitucional, Eleitoral e Tributária, esclarece que, neste caso, o dinheiro passa da esfera pública e passa à vida privada do político, que pode fazer doações à entidade que preferir.
É o mesmo entendimento do advogado José Carlos Schmitz, professor do curso de Direito da Unifebe. Ele avalia que “não há óbice” para que um deputado doe um fragmento do salário para uma entidade.
O advogado analisa que esse tipo de promessa não configura compra de votos desde que o político fale de modo geral, não a uma pessoa ou grupo em específico. Ou seja, ele pode dizer que irá para ONGs, mas não pode falar que enviará o dinheiro para a associação de tal bairro.
Schmitz destaca que o prefeito de Joinville, Udo Döhler, foi alvo de uma denúncia deste tipo na campanha de 2012 e foi inocentado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC).
Em 2012, Döhler anunciou que abriria mão do salário de prefeito e o doaria a entidades. O candidato opositor, Kennedy Nunes, moveu ação o acusando de compra de votos.
Mas, em julgamento no dia 21 de janeiro de 2014, o tribunal decidiu, por unanimidade, inocentá-lo. O entendimento do TRE-SC foi que a promessa não era uma compra de votos porque não havia “destinatário específico”.
Para o relator do caso, juiz Ivorí Luis da Silva Scheffer, a promessa de doação não pode ser considerada compra de votos, nem abuso de poder econômico. “Não há nenhuma ilicitude, ao contrário, é da essência das campanhas eleitorais a exteriorização de compromissos com os eleitores”, disse Scheffer.
O magistrado afirmou, ainda, que para ser considerada como compra de votos, a intenção de doar os salários deveria ter sido dirigida a um eleitor ou a um grupo de eleitores específicos, incluindo o pedido de votos.
Salários altos
Um deputado federal recebe R$ 33.763 por mês. Além disso, tem direito a dois salários no início e no fim da legislatura como ajuda de custos.
O congressista ainda tem direito ao auxílio-moradia de R$ 4.253 ou então pode morar num apartamento gratuito. O político também pode gastar até R$ 101 mil mensais para contratar até 25 assessores, além de outros benefícios.
Já o deputado estadual ganha R$ 25.322,25, valor equivalente a 75% do subsídio de deputado federal, conforme a lei estadual de 2010. Também recebem auxílio moradia, no valor mensal de R$ 4.377,73.
Renúncia a penduricalhos
Outra promessa comum é que, se eleito, o político renunciará aos penduricalhos que engordam as contas de deputados. São os famosos auxílio-moradia, reembolso de passagens, auxílio-paletó e outros tantos.
Bernardo Junior explica que o candidato pode renunciar a esses benefícios. “O parlamentar pode renunciar o direito tanto ao subsídio, total ou parcial, quanto aos chamados ‘privilégios’, desde que isso seja formalizado perante à mesa diretora [da Assembleia Legislativa ou Câmara dos Deputados]. A regra da irredutibilidade salarial não atinge os subsídios dos parlamentares, nem de qualquer outro agente político, conforme ressalva expressa no inciso 15º do artigo 37 da Constituição Federal”.
No entanto, no entendimento do advogado, o deputado estadual ou federal não pode doar o valor desses benefícios para entidades. “Esse proceder, na verdade, acaba por consolidar a imoralidade do próprio pagamento destes auxílios, como é o caso do auxílio-moradia, pois os únicos que poderiam encaminhar projetos tendentes a extingui-los, vão querer mantê-los para subvencionar entidades de sua preferência ou de seu interesse”.
No caso da simples renúncia, o dinheiro não volta para lugar nenhum. O valor simplesmente fica com a Câmara dos Deputados ou Assembleia Legislativa, que, no fim do exercício, faz a devolução das sobras do orçamento para o Executivo.