As terapias alternativas têm utilidade?
Médicos e outros profissionais da saúde recebem com certa frequência pacientes que, na sua desesperada busca pela cura, acabaram sendo vítimas dos praticantes de uma série de terapias empíricas que tem se tornado conhecidas e populares aproveitando a facilidade de divulgação através das redes sociais.
Há pouco tempo recebi um paciente que, durante vários meses, vinha realizando tratamento com ozônio visando resolver uma fraqueza muscular generalizada. Durante esse período o paciente teve piora do seu quadro clínico.
A investigação diagnóstica confirmou que o paciente era portador de polineuropatía por hanseníase (doença causada pelo mycobacterium leprae). Trata-se de uma doença que acomete os nervos de braços e pernas e que tem tratamento medicamentoso. O paciente, ao perder tempo com uma terapia sem eficácia, agravou os sintomas e ficou com sequelas.
Lembro também de uma paciente jovem que, ao ser diagnosticada de câncer de mama, decidiu fazer um tratamento com uma terapeuta que prescrevia e vendia uma série de produtos feitos de ervas. Ao voltar ao oncologista após um ano, o câncer já tinha provocado metástases e a paciente tinha perdido a oportunidade de se curar. Infelizmente veio a falecer em poucos meses.
Um grupo de pacientes particularmente expostos à sedução de terapias alternativas são aqueles com alguma disfunção da saúde mental, no jargão popular, as chamadas doenças do sistema nervoso.
Os transtornos mentais, além de ser de uma variedade enorme, também têm graus de acometimento diferentes. Por essas terapias não terem eficácia cientificamente comprovada sequer para casos leves, podemos ter certeza que a tentativa de tratar casos moderados e graves são uma tragédia anunciada.
Entre essas técnicas de cura mental e física podemos citar a chamada ThetaHealing. Esta promete a cura mediante a meditação que leva a um estado cerebral de ondas theta, essa meditação permite você se comunicar diretamente com o criador e até reprogramar seu DNA. Não há nenhuma evidencia científica da sua eficácia, embora saibamos que algumas técnicas de meditação possam nos fazer sentir bem, isso não significa que sejam eficazes para tratar doenças mentais.
Outro método que tem se tornado popular, embora não tenha nenhuma validação científica, é o denominado “constelações familiares”, criado por um ex-militar nazista que posteriormente se tornou sacerdote chamado Bert Hellinger.
Uma sessão típica de constelação familiar é coletiva, existe o terapeuta constelador, o paciente e os outros participantes que assumem o papel de parentes vivos ou mortos, então se inicia uma espécie de teatro onde se colocam as emoções e traumas para fora.
Segundo Hellinger, os participantes que simulam ser os familiares passam a ter pensamentos e sensações muito semelhantes aos dos verdadeiros parentes, fazendo que a interação seja muito realística. Como podem perceber, parece coisa de mágica. Quando não é possível realizar sessões coletivas, o constelador utiliza bonequinhos que representam paciente e familiares, uma nova modalidade usa esses bonequinhos na água!
Uma das falácias do método é que o amor e o perdão curam qualquer transtorno. No caso de incesto, por exemplo, Bellinger defende que acontece como uma tentativa de equilibrar o “dar e receber” dentro da família, o pai incestuoso é vitima da falta de amor e interesse da esposa e procura esse amor físico na própria filha.
Os fundamentos desta prática se originam em crenças do autor, é definitivamente uma teoria machista, sexista e nociva.
A alta carga emocional das sessões pode ser explicada pela forma em que o assunto é tratado: subitamente você coloca seus traumas, seus segredos, seus medos para serem discutidos e sujeitos ao palpite aleatório de desconhecidos sem nenhuma formação em saúde mental.
Ao leitor que quiser ter uma visão básica sobre as constelações familiares recomendo o artigo “Bert Hellinger e a farsa da constelação familiar” do filósofo e escritor Robert Todd Carroll, que pode ser encontrado no site www.universoracionalista.org
Atualmente, cursa no Senado uma consulta pública para banir essa prática na esfera pública, já que, infelizmente, há alguns anos, as varas da família do nosso judiciário encaminham pessoas com conflitos familiares para este tipo de tratamento empírico.
Esta pseudoterapia consta também como parte das práticas integrativas e complementares do Sistema Único de Saúde (SUS), junto a uma dúzia de outras práticas que não tem eficácia cientificamente comprovadas.
A saúde pública, que na maioria de municípios tem imensas dificuldades para atender a grande demanda em saúde básica, saúde materno-infantil, doenças oncológicas e outras, teria ainda que desperdiçar recursos em terapias inócuas e que são banidas em diversos países do primeiro mundo.
Na recente pandemia, a ciência deu suas respostas e agiu rapidamente identificando todas as características da doença, transmissibilidade, variantes, prevenção, tratamentos e as vacinas, que finalmente conseguiram conter a expansão da epidemia.
Não nos deixemos enganar com métodos pseudocientíficos. Informe-se bem e aproveite que nunca antes a informação esteve tão ao alcance das pessoas.