O legado da pandemia, entre erros e acertos
No dia 5 de maio a Organização Mundial da Saúde (OMS) determinou o fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional referente à Covid-19.
Isso significa que a pesar de que casos e mortes pela Covid-19 continuam a acontecer na maioria dos países, os mesmos não tem a significância estatística necessária para manter as medidas preventivas e emergenciais para o controle da disseminação desta doença.
Três anos de pandemia deixam para o mundo muitas lições além dos milhões de casos, milhões de portadores de sequelas da Covid e mais de 7 milhões de mortos pela Covid-19 no mundo, 700 mil deles no Brasil.
Embora as lições mais importantes atingem os níveis governamentais e institucionais que se tivessem atuado de forma diferente poderiam ter atenuado significativamente os danos causados pela pandemia, há também lições a nível individual.
Todos temos que ter consciência do que fizemos certo e errado com relação à pandemia e qual é o aprendizado que a mesma deixa como herança.
Os especialistas são unânimes em afirmar que embora existisse um lapso de cem anos entre a pandemia da chamada gripe espanhola e a atual pandemia, a próxima pandemia poderá aparecer muito antes.
Há na atualidade uma maior quantidade de condições naturais e provocadas pelo homem que facilitariam o aparecimento de um novo agente infeccioso altamente contaminante.
Embora o vírus causador da Covid-19 tenha sido detectado pelas autoridades de saúde da China no fim de dezembro de 2019, somente em 11 de março de 2020 a OMS declarou o estado de pandemia, nessas alturas já existiam 4291 mortos e 120 mil casos em 114 países.
Há consenso que esse atraso em declarar o estado de emergência facilitou muito a expansão da pandemia e dificultou a implantação de estratégias tanto para prevenção como para tratamento dos afetados.
Há necessidade imperiosa de criar critérios rigorosos baseados em parâmetros objetivos para determinar a existência de uma emergência sanitária mundial.
Para que isto funcione há a necessidade de implementar melhores controles sanitários e epidemiológicos em todos os países, há que considerar que uma grande quantidade de países pobres não tem nenhuma estrutura neste sentido.
Pode ser que a próxima epidemia surja justamente em um pais que não tem nenhum sistema de vigilância sanitária ou epidemiológica.
Nesses primeiros meses de pandemia se viveu o pânico e a ansiedade de não dispormos de uma reserva de elementos necessários para conter o avanço da pandemia, houve falta de máscaras, outros equipamentos de proteção individual, medicamentos como anestésicos e relaxantes musculares, respiradores, oxigênio, etc.
Vamos permitir que a próxima pandemia cause o mesmo medo e pânico de saber que podemos morrer por falta de oxigênio ou de um respirador?
Infelizmente milhares de pessoas faleceram por estas circunstâncias, principalmente no primeiro ano da pandemia.
Há necessidade de criar reservas estratégicas de materiais e medicamentos e criar planos para conseguir uma resposta rápida de produção desses materiais no futuro.
A única possibilidade de conter os danos da Covid-19 no primeiro ano da pandemia consistia em prevenir a transmissão do vírus.
As medidas sanitárias e o grau de obediência civil às mesmas nos diferentes países do mundo provocaram resultados de morbilidade e mortalidade muito diferentes entre eles, mesmo comparando países com características socioeconômicas e demográficas semelhantes.
A falta de um discurso unificado das autoridades de saúde a nível federal, estadual e municipal foi um fator fundamental para que um país como o Brasil com menos de 3% da população mundial tenha 10 % de todas as mortes por Covid-19 no mundo.
Houve uma grande perda de tempo e recursos ao querer atribuir a uma série de medicamentos propriedades antivirais.
É bem conhecido em medicina que a busca por um novo antiviral é difícil e prolongada, até hoje em dia dispomos de medicamentos antivirais para pouquíssimos vírus.
Houve um grande erro em disseminar via fake news uma série de discursos antivacinas.
As vacinas que como um todo tem sido fundamentais em aumentar a sobrevida do ser humano.
Também neste caso em particular foi a verdadeira solução para conter a pandemia.
Se considera que 70% da população mundial está vacinada e que foram aplicadas ao redor de 14 bilhões de doses. É verdade que muitos laboratórios tiveram lucros gigantescos mas cabe aqui a pergunta: Quanto custa uma vida?
Daí a necessidade de aumentar os investimentos da pesquisa em saúde e em institutos como Fiocruz e Butantã.
É decepcionante que o Brasil, um país líder em programas de imunização, não tenha sido capaz de produzir sua própria vacina contra Covid-19, não foi por falta de cientistas e talento humano.
Falta investimento em infraestrutura e principalmente governos que acreditem que investir no desenvolvimento científico é fundamental para conseguir ser num futuro próximo um país desenvolvido.
Embora tenha terminado a pandemia, é necessário que continue a vigilância genômica, detectando precocemente variantes que possam ser altamente transmissíveis ou letais.
A nível pessoal há a esperança de que as pessoas tenham aprendido sobre a forma de contágio dos vírus respiratórios, que ao visitar um parente ou amigo debilitado decidam usar máscaras e higienizar as mãos, que usem máscaras para ir em lugares públicos quando estiverem com sintomas gripais. Cuidar dos outros também nos faz sentir bem.
É provável que agora demos mais valor às atividades ao ar livre e optemos por ambientes bem ventilados ao frequentar lugares públicos.
Nestes anos de pandemia, principalmente antes do aparecimento das vacinas, todos os médicos trataram pacientes, familiares e amigos atingidos pela Covid-19 usando como principal ferramenta a facilidade de comunicação pela internet.
A telemedicina sai fortalecida após a pandemia embora nada substitui o contato presencial e o exame físico do paciente.
Enfim, esta terrível pandemia deixa muitos aprendizados e devemos tomar medidas para não cometer os mesmos erros na próxima vez.