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Editorial: Hino e identidade

Nesta semana houve grande repercussão em relação à proposta de mudança no hino de Santa Catarina, capitaneada pelo deputado Ivan Naatz, que foi tema de audiência pública na Assembleia Legislativa. A proposta tem polarizado opiniões no estado. A justificativa do deputado e proponente da audiência pública é que o hino atual, adotado por lei estadual […]

Nesta semana houve grande repercussão em relação à proposta de mudança no hino de Santa Catarina, capitaneada pelo deputado Ivan Naatz, que foi tema de audiência pública na Assembleia Legislativa.

A proposta tem polarizado opiniões no estado. A justificativa do deputado e proponente da audiência pública é que o hino atual, adotado por lei estadual em 1895, há 128 anos, não é representativo e é desconhecido da maioria da população. “Ele não retrata os valores cívicos e a história catarinense”, pontuou.

Uma ideia como essa sempre gera tipos previsíveis de reações. De um lado o conservadorismo argumenta que o hino é imutável e perene, de outro lado, há a corrente que defende a mudança e a modernização. Há, ainda, os que consideram o assunto desnecessário, sem relevância para mobilizar o debate público.

A discussão sobre o hino remete a uma questão histórica. Todo país tem seus símbolos, e no Brasil pouca gente sabe quais são eles. Aqui, são definidos por lei federal como símbolos da pátria a bandeira, o hino, as armas e o selo nacional. Existem debates constantes para mudar a ortografia, avançar em linguagem neutra, por exemplo, mas, na prática, quase ninguém sabe o básico sobre o próprio país.

Esses símbolos nos identificam. Desde a antiguidade, as pessoas matam e morrem por eles. Conquistadores fincam bandeiras no solo para indicar que um lugar foi conquistado, que uma nação se sobressaiu à outra. 

Trata-se de um hino feito para o Brasil, não para os moradores do estado, que não se veem representados na letra

Nessa linha de raciocínio, muitos conhecem a bandeira de Santa Catarina, talvez o brasão, mas poucos conhecem o hino. Talvez por não haver uma identificação com ele, que não reflete nossa história e nossa identidade. 

Essa falta de identificação tem uma razão lógica: o hino de Santa Catarina foi composto pelo maestro José Brazilício de Souza, com letra de Horácio Nunes Pires, para um concurso feito em 1890 para adoção de um novo hino nacional, logo após a Proclamação da República. Ou seja, trata-se de um hino feito para o Brasil, não para os moradores do estado, que não se veem representados na letra.

Um dos versos diz: “Quebrou-se a algema do escravo / E nesta grande nação / É cada homem um bravo / Cada bravo, um cidadão”. É um hino bonito, mas que não tem nada a ver com nossa cultura. Suas palavras foram feitas para abranger um sentimento nacional de libertação, mas não guardam nenhuma relação com a história do estado, e talvez por isso ninguém o cante.

A ideia, então, é capitanear a composição de um novo hino que represente de fato nossas raízes, que o povo catarinense se enxergue nos versos pronunciados. Logicamente, a sociedade precisa ser ouvida, os representantes das classes artística e cultural devem contribuir para o debate.

É uma discussão que vale a pena ser feita, ao falar das nossas origens e a da nossa identidade enquanto estado. Com isso, espera-se que o símbolo maior de nosso estado não exista apenas no papel, mas tenha aderência da sociedade, e se vincule aos seus valores e ideias.