Editorial: Nossa personalidade no Carnaval
Esta semana foi marcada pelo Carnaval e pela quarta-feira de cinzas, duas datas ambíguas, comemoradas quase juntas, mostrando a dualidade do comportamento humano. O Carnaval foi uma das tradições pagãs que, no século lV, a Igreja acabou permitindo como “válvula de escape” diante das exigências impostas aos medievos no período da Quaresma. Assim, as pessoas […]
Esta semana foi marcada pelo Carnaval e pela quarta-feira de cinzas, duas datas ambíguas, comemoradas quase juntas, mostrando a dualidade do comportamento humano.
O Carnaval foi uma das tradições pagãs que, no século lV, a Igreja acabou permitindo como “válvula de escape” diante das exigências impostas aos medievos no período da Quaresma. Assim, as pessoas poderiam se esbaldar em comidas, festas, bebidas e prostituição como forma de compensar o período de penitências e abstinências dos 40 dias que antecediam a Páscoa.
Com o passar dos anos a comemoração destas datas mudou muito e sofreu a influência de acordo com o lugar e cultura. O Carnaval de Veneza é diferente do nosso, assim como as tradições da Páscoa também mudam de país para país.
E justamente por sofrer esta influência da cultura de cada local que se molda estas festas com personalidades próprias, únicas. No Brasil, o Carnaval foi assimilado de tal forma que se transformou na maior festa popular do mundo.
Mas como toda personalidade não é só do bem ou mal, o Carnaval também expõe todas as características que marcam o nosso cotidiano. Não somos só alegria, mas também violência. Arrastões em SP, brigas em Salvador, tumulto em Curitiba são só alguns dos vários casos registrados em todo Brasil neste ano.
Estamos mais para quarta-feira de cinzas do que para o Carnaval, descolando mais uma vez nossa personalidade do resto do país
Nos desfiles de nosso Carnaval mostramos um show de organização e criatividade, que explode nos enredos e fantasias, mas que também muitas vezes ultrapassa o limite da crítica social, profanando temas religiosos, como aconteceu nos desfiles do Rio e São Paulo.
O próprio funcionamento do Carnaval é um retrato da sociedade, com muita informalidade e origem de recursos duvidosos, vindos inclusive de contravenção, como demonstrado em 2011 com a Operação Dedo de Deus e em 2018 com a Operação Mala da Fortuna, que prendeu bicheiros e dirigentes de escolas de samba que usavam esquema criminoso para lavagem de dinheiro.
O Carnaval também mostra nosso baixo nível de educação e respeito. Basta olhar a quantidade de lixo que se fica nas concentrações das festas e também nos dejetos humanos espalhados pelas ruas e vielas de lugares históricos, mostrando o descaso com o meio ambiente e com o patrimônio histórico cultural brasileiro.
Neste vale tudo em nome da diversão e alegria a grande imprensa também embarca, dando a ideia que o Brasil inteiro está pulando como Salvador ou desfilando como no Rio de Janeiro. Suas exaustivas transmissões monopolizam a programação com foco nestas manifestações regionais, intensificando sua importância.
Mas se este é o retrato do Brasil, não se pode dizer que Brusque está inserido nele. Por aqui as pessoas até gostam de um feriado e de festas, mas o Carnaval não está contemplado em nosso calendário. Não houve nenhuma manifestação carnavalesca na cidade.
Nenhum clube, grupo ou mesmo o poder municipal se interessou na folia e também não se tem o registro de reclamações por esta ausência. Por aqui o caricato folião brasileiro, sambista e malandro dá lugar ao pai de família, trabalhador e religioso, mostrando que no quesito Carnaval nosso interesse é mínimo. Estamos mais para quarta-feira de cinzas do que para o Carnaval, descolando mais uma vez nossa personalidade do resto do país.