Editorial: O mosquito amigo do vírus
Depois de tanto tempo convivendo com uma pandemia causada por um vírus, aprendemos pelo menos uma coisa: nem sempre é possível curar uma doença causada por vírus, mas é sempre possível evitar a contaminação, tomando as medidas adequadas. No caso de um vírus que usa como transporte as gotículas aéreas que emitimos ao falar, espirrar, […]
Depois de tanto tempo convivendo com uma pandemia causada por um vírus, aprendemos pelo menos uma coisa: nem sempre é possível curar uma doença causada por vírus, mas é sempre possível evitar a contaminação, tomando as medidas adequadas.
No caso de um vírus que usa como transporte as gotículas aéreas que emitimos ao falar, espirrar, tossir ou gargalhar e como aeroporto as vias nasais e a boca (às vezes até os olhos) das pessoas das proximidades, não é difícil imaginar que se proteger de alguma forma a boca e o nariz, a aterrisagem do vírus aerotransportado fica mais difícil.
Agora Brusque e região volta a enfrentar um outro vírus que, embora não tenha causado uma pandemia, é velho conhecido dos brasileiros (chegou ao país em 1981): o que causa a doença infecciosa febril conhecida como dengue.
Diferentemente do vírus com que nos preocupamos mais nos últimos dois anos, o vírus da dengue usa, como transporte preferencial, a fêmea do mosquito Aedes aegypti. Esse mosquito precisa de sangue para maturar os seus ovos. E essa necessidade natural faz com que ela, ao sugar o sangue de alguém contaminado, sugue também o vírus. E o conduz, de carona, até a próxima pessoa que for picada. Lá o vírus desembarca e, dependendo dos anticorpos que encontrar (ou não encontrar), faz a festa.
E como se foge do mosquito? Como se evita a dengue? As tentativas de exterminar o mosquito (que tem comportamento estritamente urbano “sendo raro encontrar amostras de seus ovos ou larvas em reservatórios de água nas matas”, informa a Fiocruz), não têm funcionado. Ao longo do tempo o mosquito desenvolveu alguma resistência aos inseticidas e o número quase infinito de locais, nas cidades, que armazenam água (lixo, material descartável jogado de qualquer jeito, vasos, etc) faz com que todo verão eles se multipliquem incontrolavelmente.
E é aí que a coisa fica interessante: “incontrolavelmente” é figura de linguagem. É possível controlar ou reduzir a proliferação dos mosquitos. E, portanto, reduzir a chance de transmissão do vírus. Como em tantas outras epidemias, são medidas simples, relacionadas com saneamento básico, com higiene, com cuidados coletivos e com a conscientização, de toda a comunidade e das autoridades de diversas áreas, do que é preciso fazer.
O mosquito põe ovos milímetros acima de alguma água parada e limpa. Com a chuva, a água sobe um pouco e os ovos eclodem em minutos e, em até uma semana, a larva se transforma em novo mosquito. Então, toda água limpa que ficou sem ser trocada por vários dias, é um possível berçário de mosquitos. E não precisa ser um reservatório grande, como um pneu abandonado. Um potinho de plástico esquecido no fundo de um quintal, por exemplo, é um bom lugar.
Um esforço coletivo e organizado para identificar e eliminar esses criadouros ajudaria bastante. Não adianta contaminar tudo com inseticida. Isso prejudica a saúde humana e dos animais domésticos, mas não faz cócega na senhora Aedes aegypti. Adianta investir um tempo em olhar, na casa e nos quintais (aproveitando que a nossa região é famosa por seus jardins e quintais bem cuidados), os possíveis focos. E é fundamental que as prefeituras mantenham setores capazes de informar adequadamente o cidadão sobre o que fazer nos casos em dúvida.
E, principalmente, o poder público precisa estar sempre atento (e responder com agilidade) às denúncias que envolvem prédios, obras e residências abandonadas, terrenos baldios mal cuidados, áreas públicas. Não é impossível, não é complicado. Só exige solidariedade e interesse comunitário.