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Editorial: O salário do prefeito

A curiosidade é inerente ao ser humano e fica ainda mais aguçada quando se trata de saber a vida alheia (que o digam as mídias sociais). Um destes interesses mais comuns é saber a vida financeira do vizinho e medir o seu “sucesso” em relação a nós e ao padrão de nossa sociedade. Neste contexto, […]

A curiosidade é inerente ao ser humano e fica ainda mais aguçada quando se trata de saber a vida alheia (que o digam as mídias sociais). Um destes interesses mais comuns é saber a vida financeira do vizinho e medir o seu “sucesso” em relação a nós e ao padrão de nossa sociedade.

Neste contexto, se o salário do vizinho interessa, imagina o do prefeito. Para satisfazer esta curiosidade e atualizar o leitor, o jornal O Municipio trouxe uma matéria na terça-feira, 24, comparando o salário do prefeito de Brusque em relação aos seus pares estaduais. No ranking, seu salário é de R$ 27.682,88, o quarto maior das cidades pesquisadas. Somente R$ 3.251,82 reais a menos que o presidente da República, que é de R$ 30.934,70.

A matéria teve uma grande repercussão, sendo uma das mais acessadas no mês. No site, foi a quinta mais acessada do mês e no Facebook alcançou mais de 25 mil pessoas até esta quarta-feira, 25. O tema divide opiniões entre aqueles que acham o valor abusivo e outros que acham justo o valor.

Dependendo do ângulo que se vê, os dois lados podem estar com a razão e podemos exercitar um pouco nossa mente pensando em possibilidades. A primeira delas seria um extremo, com remuneração zero. Neste cenário o prefeito faria um trabalho voluntário, sem custos ao erário.

Nesta hipótese a disputa pela prefeitura poderia atrair um perfil de pessoas honestas, éticas, afeitas a trabalhos sociais que encarariam o desafio como uma causa. Também poderia atrair oportunistas, que para compensar a falta de remuneração poderiam utilizar práticas espúrias e se locupletar, como muitos fazem hoje.

No outro extremo poderíamos pensar até numa remuneração maior, com vistas a atrair grandes executivos, capazes e preparados para os grandes desafios de uma gestão pública. Os salários, neste caso, poderiam utilizar como referências os da iniciativa privada.

Nesta hipótese podemos compará-lo com um levantamento da revista Exame realizado em 2013. Naquela ocasião, um presidente de empresa que fatura de R$ 100 milhões a R$ 500 milhões recebia em torno de R$ 940 mil anuais (R$ 78,3 mil mensais).

Já uma empresa que fatura mais de R$ 500 milhões recebia R$ 1.134 milhão anual (média de R$ 94,5 mil mensais). Como a prefeitura de Brusque tem um faturamento entre estas duas faixas, o salário do prefeito poderia aumentar entre 2,8 vezes no primeiro caso e 3,4 no segundo, se o critério fosse o mesmo da iniciativa privada.

É claro que neste cenário não seriam somente executivos que iriam pleitear o cargo. Muito mais barnabés do que hoje se habilitariam, visando esses supersalários. Outro obstáculo é que nesta hipótese ele estaria acima do teto constitucional, o que é proibido.

Mesmo que fosse possível, existe ainda um outro agravante: o efeito cascata que influenciaria todo o funcionalismo, afinal, no setor público, a maioria dos índios quer ganhar igual ao cacique.

Até seria justo que o prefeito ganhasse mais, se praticasse uma gestão competente, capaz de dar eficiência aos serviços públicos e obter superávit para fazer investimentos

Para definir o que seria um bom salário precisamos ver qual é a função a ser exercida, o tamanho da responsabilidade. A prefeitura é a organização com maior número de funcionários de Brusque, com mais de 3.5 mil contratados, em funções e regimes de trabalho diferentes, atuando em áreas distintas e complexas, como saúde, educação, meio ambiente, logística, infraestrutura, turismo, etc.

Cada uma com diretrizes e legislações próprias. Além disso, tem que prestar contas para Ministério Público, Câmara de Vereadores, Tribunal de Contas e por aí afora.

Com todos estes elementos e dada a complexidade da função, até seria justo que o prefeito ganhasse mais, se praticasse uma gestão competente, capaz de dar eficiência aos serviços públicos e obter superávit para fazer investimentos.

Mas como a função pende mais para o lado político do que técnico a lógica é diferente, privilegiando o empreguismo e leniência com algumas situações.

Em mundos com direcionamentos tão distantes fica difícil saber se o prefeito afinal ganha muito ou pouco, pois depende muito de critério subjetivo e da percepção da população em relação ao seu trabalho.

Se for um prefeito que tenha o conhecimento e vocação para fazer a gestão pública o valor é mais que merecido. Mas se ele se esconde neste mar de complexidade e vai empurrando com a barriga, até a remuneração zero é cara.