Em meio à pandemia, cooperativa cervejeira fomenta continuidade da produção artesanal em Brusque
Planos para montagem de fábrica própria foram adiados, mas pequenos produtores mantêm sonho de avançar nos negócios
Planos para montagem de fábrica própria foram adiados, mas pequenos produtores mantêm sonho de avançar nos negócios
O Vale do Itajaí se destaca quando o assunto é a produção de cerveja em Santa Catarina. A região concentra o maior número de cervejarias do estado, de acordo com o Anuário da Cerveja 2020, produzido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
É também no Vale do Itajaí, mais precisamente em Brusque, que foi criada a Cooperativa Cervejeira Sul Brasileira (Cocersul), a única do país em atividade atualmente, e cujo trabalho plantou uma semente de desenvolvimento dos pequenos cervejeiros.
Assim como em todo o mundo, a pandemia obrigou a cooperativa recém-criada a rever seus planos e trabalhar em um ritmo mais lento que o esperado. “A cooperativa não paralisou, mas reduziu a marcha. Agora estamos neste compasso, se estruturando à medida que as coisas vão voltando ao normal”, diz o presidente da cooperativa, Cícero Klas.
Ele afirma que o grande objetivo da cooperativa é a fábrica própria. Hoje, a Cocersul conta com 65 sócios de diversas cidades de Santa Catarina: Brusque, Guabiruba, São João Batista, Itajaí, Florianópolis, Blumenau e Joinville, mas o número ainda não é o suficiente para colocar o projeto da fábrica em prática.
“Já existe um projeto aprovado em assembleia, de uma estrutura mínima para começar nossas atividades, mas temos que avaliar o mercado. Não adianta investir e deixar a fábrica parada”.
De acordo com Cícero, a ideia é que, no futuro, a cooperativa instale fábricas em diversas cidades do país, para poder atender ao maior número possível de cooperados. “Nossa cooperativa é nacional. Qualquer cervejeiro do país pode entrar, mas por enquanto, o foco do nosso trabalho está na região Sul, que concentra o maior número de cervejeiros”.
Apesar da pandemia ter reduzido a marcha dos trabalhos da cooperativa, o associativismo mantém acesa a vontade de pequenos empreendedores se profissionalizarem e crescerem.
O gerente de vendas Carlos Roberto Ribeiro é um dos cooperados da Cocersul. Ele é cervejeiro há oito anos e viu na cooperativa uma oportunidade de empreender no ramo.
“A ideia de todo cervejeiro caseiro é um dia conseguir ter uma produção para poder vender. É muito caro montar uma produção independente e como a cooperativa pretende ter uma fábrica própria, acredito que no futuro vou realizar meu objetivo”.
Hoje, Carlos produz em pequena quantidade, apenas para consumo próprio e para alguns amigos. A meta, entretanto, é trabalhar para que a cooperativa possa tirar os planos da fábrica do papel, principalmente agora com a retomada dos eventos.
“A pandemia deu uma quebrada no nosso planejamento. Eu sabia que não ia crescer o quanto era esperado, mas mesmo assim decidi continuar e continuo acreditando em um futuro promissor para a cooperativa”.
Edson Diegoli tem a produção de cerveja artesanal como um hobby. Antes mesmo da Cocersul ser criada, ele e mais dois sócios – Diego de Novaes e Vilson Rangel – decidiram empreender no ramo e montaram a Cervejaria Agnus, que hoje está na fase final do processo de registro no Mapa.
Mesmo com a cervejaria já estabelecida e a marca própria, o sócio achou importante participar da cooperativa criada em Brusque.
“Faço parte da cooperativa porque acredito que ela vai ser bem importante para ajudar os cervejeiros a conseguirem o registro no Ministério da Agricultura, que é um processo bem burocrático. Além disso, vai contribuir com a melhora do produto e vai fomentar muito o setor. Acredito que todos só tem a ganhar com a cooperativa”.
O aposentado Roque Bambineti se interessou pela produção de cerveja há 10 anos. No início, se especializou para fabricar a bebida para o consumo próprio. Com o tempo, foi aumentando a produção para amigos e confraternizações.
Ele foi um dos cervejeiros que ajudou a fundar a Cocersul e está na expectativa para o próximo passo da entidade, que é o espaço para os cervejeiros cooperados produzirem suas receitas.
“A cooperativa só traz benefícios. Vamos produzir em um lugar só, diminuindo as despesas, legalizados e fomentando o setor. Agora com a redução da pandemia, acredito que estaremos mais próximos deste objetivo”.
O cervejeiro afirma que se formalizar dentro da atividade, por conta própria, não vale a pena, por isso, a importância da cooperativa para todo o segmento cervejeiro, não apenas de Brusque, mas de todo o país.
“Se eu for correr atrás para legalizar sozinho, eu paro de fazer, porque não compensa. O grande objetivo da cooperativa é que os cervejeiros se legalizem juntos para conseguirem investir em um ramo que está muito em alta e que dá retorno”.
Além dos eventos que os cervejeiros da cooperativa participam, a entidade também oferece cursos de capacitação e especialização para melhorar cada vez mais a qualidade do produto.
A cooperativa nasceu dentro do Núcleo de Cervejeiros Artesanais da Associação das Micro e Pequenas Empresas de Brusque (Ampebr), que foi criado com o objetivo de profissionalizar o setor para, a longo prazo, gerar emprego e renda.
Na época, alguns integrantes do núcleo demonstraram o desejo de se legalizar, vislumbrando transformar o hobby em uma atividade economicamente rentável, mas esbarraram na burocracia e nos custos da formalização. Foi então que em outubro de 2018 foi lançada a ideia de formar uma cooperativa.
“Apresentamos vários modelos de negócios, com diversas sugestões. Até que nas nossas pesquisas em parceria com o Sebrae identificamos que a cooperativa poderia ser um modelo de negócio interessante para nós”, recorda o presidente da cooperativa.
A Cocersul foi formalizada em 2019, com a missão de se tornar uma cooperativa de produção. A ideia é que cada cervejeiro cooperado produza sua cerveja na fábrica da Cocersul, com seu rótulo próprio e com a possibilidade de comercializar a cerveja, tudo de forma legalizada.
Os custos para investir em uma fábrica própria são bastante elevados, o que acaba dificultando para os cervejeiros caseiros que desejam empreender. Com a cooperativa, toda a parte técnica como engenheiro químico e laboratório, equipamentos e matéria-prima são diluídos entre os cooperados, reduzindo significativamente os custos de produção.
Outra alternativa para o cervejeiro caseiro, é utilizar a estrutura das fábricas já existentes para produzir seu produto, por exemplo, porém, desta forma, ele é obrigado a entrar em regras estabelecidas por estas fábricas, como a quantidade e também o preço.
Na cooperativa, como o lucro é do próprio cooperado, há uma margem diferenciada, com a produção mais em conta e em quantidades menores.
“A cooperativa é uma forma de ajudar o desenvolvimento tanto da sociedade quanto do próprio segmento. Hoje temos várias cooperativas, as mais fortes ligadas ao agronegócio, que mostram que é um ótimo modelo. A cooperativa é uma ferramenta balizadora de muitos negócios”, destaca Cícero.
Mesmo sem fábrica própria, a Cocersul já conta com uma marca: a Bierfest, cerveja que leva o nome do festival criado pela cooperativa em 2020 e que já tem sua segunda edição agendada para 2022.
A cerveja, que pode ser encontrada no estilo pilsen e IPA, é produzida em parceria com a Zehn Bier, fábrica de Brusque. De acordo com Cícero, são produzidas uma média de 150 garrafas mensalmente. Toda a receita da venda da Bierfest vai para a cooperativa.
O Anuário da Cerveja produzido pelo Ministério da Agricultura mostra que em 2020, o Brasil teve 204 novas cervejarias registradas, chegando ao total de 1.383 estabelecimentos do setor, um crescimento de 14,4% em relação ao ano anterior.
Deste total, 175 cervejarias ficam em Santa Catarina. De acordo com a pesquisa, o estado teve um crescimento de 31,3% no número de estabelecimentos no ano passado.
Quando analisada a densidade cervejeira por km² por estado, Santa Catarina lidera, com uma cervejaria para cada 41.443 habitantes.