Entenda como está a investigação de denúncias de irregularidades no Samae de Brusque
Procuradoria-Geral e MP-SC realizam procedimentos preliminares
Procuradoria-Geral e MP-SC realizam procedimentos preliminares
O Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto (Samae) de Brusque está sob investigação da Procuradoria-Geral do Município e do Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) após receberem denúncias de possíveis irregularidades.
Inclusive, na última sessão da Câmara de Brusque, na terça-feira, 8, os vereadores aprovaram um pedido de informação da vereadora Marlina Oliveira (PT) por conta das denúncias.
Ex-servidor da autarquia, Paulo Cézar Moreira Nogueira acusa Juliano Pereira, coordenador-geral da área técnica, de ter cedido gabarito e acessórios para realização de prova prática para processo seletivo.
Em audiência administrativa com a Procuradoria-Geral de Brusque, Paulo relatou que foi à casa de Juliano e recebeu equipamento para que tivesse conhecimento das peças na prova prática.
O denunciante afirmou em entrevista ao jornal O Município que não tinha nenhuma experiência com o trabalho e que Juliano teria enviado para ele o gabarito da prova prática pelo telefone. A avaliação consiste na realização de atividades ligadas ao serviço a ser desenvolvido pelo candidato, como reconhecimento de conexão hidráulicas e utilização de peças e conexões.
Segundo Paulo, ele foi indicado para o Samae por Jones Bosio, atual presidente do PTB de Brusque. O ex-servidor da autarquia conta que concorreu a vereador a pedido de Jones em 2016 e que sempre teve amizade com ele.
Em 2020, ele foi convidado outra vez, mas decidiu apenas ajudar a campanha do partido – na época, Jones era presidente do DEM de Brusque.
“Eu ajudei na campanha e ele me disse que conseguiria um cargo comissionado, mas não teve cargo para todos. Eu questionei ele sobre o meu trabalho, e ele disse que não tinha, até que ele falou que ia pedir no Samae. Então, eu fui até lá, falei com o Luciano Camargo (diretor-presidente), que disse que ia conseguir”.
Paulo afirma que Juliano ligou para ele um dia e disse para ir até sua casa. “Chegando lá, ele me deu hidrômetro, o relógio, alguns equipamentos para eu conhecer. Eu não conhecia quase nada. Ele me disse o que eu precisava levar, me explicou, deu os macetes. Eu questionei ele sobre o que eu faria quando entrasse lá, porque não sabia nada. Me disse que me colocaria com um cara experiente que ia me ensinar. E foi o que aconteceu”.
A prova que PC realizou para conseguir o cargo no Samae é prática. Segundo ele, Juliano ensinou o que tinha que fazer e falar. “Ele disse que estaria lá quando eu fosse fazer, mas que não poderia fazer contato nenhum”.
Segundo Paulo, após alguns meses, ele começou a se indispor com seus superiores por não aceitar fazer algumas coisas que lhe pediam.
“Ele (Juliano) dá hora extra para quem ele quiser lá dentro, coloca plantão para quem quer. Fui questionar e foi ali que ele me mandou aquela mensagem. Eu andava com a moto e gastava 10 litros de combustível e tinha que assinar como se fosse 200 todo dia. Disse que não iria assinar mais nada. A gente estava em festa todo dia (com Luciano e Jones), mas quando me recusei a fazer essas coisas, a relação acabou. Eles colocam a gente lá e querem que faça o que mandam, e eu falei que não queria mais, não precisava daquilo”.
Paulo afirma que foi demitido após alguns colegas dele serem pegos dormindo por Luciano. Um vídeo circulou nas redes sociais com o diretor-presidente do Samae entrando na autarquia e flagrando alguns servidores.
“Ele pegou o pessoal dormindo, mas eu não estava dormindo. Estava na sala e me tranquei, porque eu sei como ele é, que ia brigar. Ele perguntou por mim, me chamou, mas eu só respondi e ele foi atrás de outras pessoas. Ele fez os vídeos dos caras e, logo após, me mandou embora por justa causa, mas eu não estava dormindo, estava trancado na sala. Eu fui demitido, enquanto outros voltaram a trabalhar. Na verdade, ele queria me eliminar”, afirma Paulo.
“Eu fui demitido, enquanto outros voltaram a trabalhar. Na verdade, ele queria me eliminar”
A única evidência que a reportagem teve acesso é um print de uma conversa de Paulo com Juliano. O coordenador-geral confirmou à reportagem de O Município a veracidade do print.
Nela, Paulo diz a Juliano que ele prometeu ajudá-lo. Em resposta, Juliano afirma que ajudava sempre que podia, como Jones teria pedido, e cita o gabarito da prova e a mudança de cargo de Paulo.
Outra audiência administrativa foi realizada na Procuradoria-Geral com o servidor Altair Pacheco, que acredita que foi trocado de função por perseguição após fazer denúncia. Ele relata ao procurador-geral do município Rogério Ristow que há comércio de drogas no Samae, desvio de função e compra de licença-prêmio, que colegas dele bebem em serviço e acusa o diretor-presidente de lavagem de dinheiro em uma pizzaria.
“Eu trabalho há 31 anos no Samae e, depois que eu denunciei os caras dormindo, o Luciano e o Juliano começaram a me perseguir e me humilhar, me tiraram do cargo de motorista”.
Altair chegou a fazer um post em uma rede social afirmando que o Samae era “uma quadrilha” e, depois disso, afirma que recebeu uma advertência e também que foi instaurado um processo administrativo contra ele.
“Até caí em depressão. Sempre vesti a camisa do Samae e, de repente, me colocaram lá embaixo, disseram que meu salário iria diminuir. Mas não tem problema. A verdade veio à tona. Denunciei no MP-SC e na Procuradoria e a investigação está acontecendo. Não me arrependo”.
“Até caí em depressão, sempre vesti a camisa do Samae e, de repente, me colocaram lá embaixo”
Ele segue como funcionário do Samae, mas foi afastado por 60 dias. Ele deve voltar ao trabalho no próximo dia 25 de abril. “Espero que melhore, porque está ruim lá naquela área técnica. Vou ficar trabalhando até o fim do ano, mas, se continuar essa perseguição, vou pedir aposentadoria”.
À reportagem, Juliano disse que não pode se manifestar sobre a denúncia porque a questão está sendo tratada pelo jurídico do Samae. Ele confirma que a troca de mensagens com Paulo é verdadeira, mas que a prova realizada foi prática e que não tinha gabarito.
O promotor Daniel Westphal Taylor confirma que existem dois procedimentos iniciados no Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) a partir de reclamações de servidores e ex-servidores do Samae. Os dois ainda estão na fase de investigação preliminar, longe de apresentar qualquer conclusão definitiva.
Um ofício enviado à Câmara de Brusque assinado por Luciano Camargo relata que “intervenções feitas pelo procurador Edson Ristow causam estranheza e percalços desnecessários, ferindo a autonomia do Samae e causa uma regressão na qualidade dos serviços”.
“intervenções feitas pelo procurador Edson Ristow causam estranheza e percalços desnecessários, ferindo a autonomia do Samae e causa uma regressão na qualidade dos serviços”, diz samae
Ele ressalta que a intenção não é inibir a observação dos atos pela Procuradoria, mas que eles sejam feitos sem cunho pessoal.
A reportagem consultou a assessoria do Samae para manifestação do presidente Luciano Camargo, que está de férias, sobre o assunto. A autarquia decidiu fazer uma manifestação institucional.
O Samae informa que todas as denúncias e questionamentos atualmente já foram devidamente respondidos pela autarquia, em procedimentos administrativos perante o MP-SC. Segundo o comunicado, não existe “qualquer irregularidade por parte do Samae”.
O presidente e o assessor jurídico do Samae estiveram presentes na Câmara de Brusque, onde se reuniram com todos os vereadores, “esclarecendo as dúvidas dos mesmos e os pormenores das divergências existentes”.
A autarquia apresentou aos vereadores, informalmente, documentos que comprovariam que todas as denúncias que aportam estão sendo verificadas e analisadas ou respondidas dentro do que preconiza a legislação.
“O Samae responderá de maneira muito tranquila e transparente a todos os pedidos de informação da Câmara de Vereadores, mesmo por já ter exposto o caso de antemão”.
Por fim, o Samae afirma que o processo “irá transformar-se em uma oportunidade ímpar de se colocar luz sobre narrativas inverídicas”.
A reportagem entrou em contato com Jones Bosio, mas não obteve resposta.
Em áudio que circula nas redes sociais, o procurador-geral do município, Edson Ristow, afirma que o Samae está um “chapéu virado do avesso” e uma “terra de ninguém”. Edson confirma à reportagem que ele enviou essa mensagem de voz e destaca que está agindo de acordo com o que o prefeito Ari Vequi solicita.
“Esclareço que a expressão é uma linguagem corrente da nossa terra, usada para situações um pouco descompassadas. Não usei com maldade, mas confirmo ter usado. Por expressa determinação do prefeito e pelo que ele sempre exige do procurador, estou investigando essas questões, ouvindo pessoas”.
Segundo Ristow, a Procuradoria está investigando as várias denúncias que chegaram até ele, mas que o processo ainda é preliminar
“Não há identificação de pessoas no momento, porque recebemos várias denúncias, sobre fatos variados de irregularidades, ainda não falo em tipificação criminal. Trata-se de uma investigação preliminar para obtenção de fatos”.
Após a investigação preliminar, o próximo passo seria tomar uma decisão administrativa e fazer os encaminhamentos para comissões processantes, instauração de tomada de conta especial, envio de acervo para MP-SC e Tribunal de Contas do Estado. “Não estou prejulgando, apenas colocando o curso que a coisa está tomando”.
De acordo com o procurador, o Samae não fornece documentos solicitados e teria impedido dois funcionários de comparecerem ao seu gabinete.
“Tenho a documentação impeditiva aqui assinada. Não converso com quem está sendo investigado (sobre Luciano Camargo), convoco para prestar depoimento. Se não quiser vir, não venha, e aí responda pelos seus atos”.
“Dois funcionários do Samae foram impedidos de comparecer ao meu gabinete e a instituição não fornece documentos que eu requisito”
Edson ressalta o papel da Procuradoria em investigar denúncias que chegam até ele em relação aos órgãos municipais.
“Não sei quem são as pessoas que estão descontentes com o meu trabalho, mas estou no estrito exercício do meu dever legal e estrita obediência às determinações do prefeito. Qualquer denúncia que chegue à Procuradoria, em relação à qualquer secretaria, fundação, instituto e inclusive do Samae, que é subordinado ao procurador-geral, eu vou investigar, gostem ou não. Não vamos deixar que atos de irregularidade manchem a nossa administração”.
“Se há alguma discordância, essa pessoa deve cumprir as emanações da Procuradoria-Geral, apresentar documentos, justificativas e demonstrar que o exercício da atividade está regular. Se alguém se sentir prejudicado pela minha intervenção profissional, tem toda a liberdade de pegar o chapéu e ir para casa. O mesmo chapéu velho”, finaliza.
O prefeito Ari Vequi destaca que prometeu independência aos setores desde que assumiu a administração, mas que também deixou claro que todas as denúncias de possíveis irregularidades seriam apuradas.
“De minha parte, sempre vai ser assim, não vou passar a mão na cabeça de ninguém. O procedimento que o procurador está fazendo já existiu outras vezes, em outras áreas. Nesse momento, não haverá mudanças. O trabalho do Luciano e do Samae é espetacular, reconhecido pela sociedade. Temos que ver se é verdadeiro, se há provas e temos que dar o direito ao contraditório”.
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