As imagens não saem da memória, fotos sobre a mesa remontam e ajudam a entender o presente. Lembranças de um período de ouro do ciclismo catarinense, representado por atletas brusquenses que pela terceira vez se reuniram na cidade para compartilhar emoções de momentos mágicos sobre as duas rodas.
Galeria
Da geração de André Eduardo Gohr, revelação da nova safra de talentos, a veteranos que fizeram história além das fronteiras brasileiras, como Márcio May. O atleta que veio de Salete e passou a integrar a equipe brusquense em 1988 foi quatro vezes campeão da volta de Santa Catarina e venceu também o pan-americano. Sua brilhante trajetória inclui participações nas Olimpíadas de Barcelona (1992), Atlanta (1996) e Atenas (2004).
“É muito bacana estar aqui com outros ciclistas porque a gente viveu muitas coisas juntos. Alguns competiram na mesma equipe e depois viraram adversários. É muita história, viajamos, moramos na mesma casa e cada um seguiu seu rumo. Hoje, a gente se encontra novamente e vê o que cada um está fazendo”.
O encontro
Além de Gohr e May, vários outros nomes de peso estiveram presentes neste sábado (18), no 3º encontro de ex-ciclistas da Schlosser, entre eles Fábio da Luz, que em 1989 desbancou o campeoníssimo Marcelo Greuerl do trono do ciclismo catarinense ao levar os Jogos Abertos de Santa Catarina.
Assim como nos dois anos anteriores, o evento foi realizado em uma residência no bairro Cedro Alto, sob a iniciativa de Glauco Vanolli, ciclista de uma das primeiras gerações. Para o próximo ano, a ideia de Vanolli é contar com atletas de equipes adversárias.
O primeiro deles já esteve presente neste encontro. “Ter conosco o Osni Safanelli, da Tigre, adversário da época da Schlosser, é uma satisfação. No próximo, queremos trazer outros como Marcelo Greuerl, Edmilson Senff, Evanio Zimmermann. Esses caras, se aparecerem, será muito show, mesmo que tenham perdido pra gente brinca”, brinca Vanolli.
Anos dourados
A história de ouro do ciclismo brusquense começou entre os anos de 1982 e 1983 fruto do apoio de Marcus Schlosser, então diretor da empresa de mesmo sobrenome, esta na época uma potência econômica e industrial.
Os primeiros competidores foram Irineu Ernani de Souza e Silva, Francisco Hermann e Cosme Damião. Operários que disputavam provas e ficaram encarregados de treinar um grupo de jovens brusquenses. A primeira disputa organizada foi uma prova do Sesc, vencida por Luiz Fernando Pantaleão, em janeiro de 1983. Os 15 primeiros da corrida foram então convidados a formar a equipe da Schlosser. Outros jovens passaram a ser chamados na sequência.
Os resultados apareceram logo nos anos seguintes, com Pantaleão, Ubiratan Visconti e Vornei de Oliveira, além de outros ciclistas brusquenses que a cada ano se destacavam no estadual. “A partir do segundo ano que competimos pela categoria estreante ganhamos tudo”, conta Luiz Fernando Pantaleão, que nos anos seguintes ganhou a companhia do irmão Maurício nas corridas.
Posteriormente ambos brilharam juntos, ganhando destaque também no Uruguai, país que era visto como uma referência para o ciclismo. Foi lá que Maurício, pela primeira vez, bateu o irmão numa prova. Chegou em terceiro, segundos à frente de Luiz Fernando.
“Durante muito tempo, ficou eu e ele, como primeiro e segundo colocados das provas disputadas no Uruguai. Aquilo era muito gratificante e nos rendeu o apelido nos periódicos de os Irmãos Pantaleão”, recorda Maurício.
O papel dos uruguaios
Os talentos da cidade e o apoio da administração municipal e da grande companhia brusquense foram essenciais na época para o fortalecimento da modalidade, mas duas pessoas, em especial, também são vistas como fundamentais para o desenvolvimento do esporte em Brusque.
Foi com os uruguaios Carlito Clavijo e Pedro Medina que os brasileiros passaram a ter noção de profissionalização. O primeiro hoje tem uma loja especializada em bicicletas em Brusque, enquanto o segundo vive com a família em Gravataí (RS).
Clavijo chegou a cidade em 1983, após ser descoberto em uma competição em São Paulo. No início desempenhava a função de técnico, mecânico, massagista entre outras atribuições. Foi fundamental também para a equipe ao trazer materiais de primeira qualidade do país vizinho.
“O grande enriquecimento que teve para a equipe foi a vinda dos uruguaios. Foi com eles que tivemos noção de massagem, alongamento, como se posicionar dentro do pelotão e o que comer. Isso foi muito importante para criarmos uma geração competitiva”, afirma Luiz Fernando Pantaleão.
Medina chegou a cidade a convite de Clavijo no ano seguinte. O primeiro entrou para a equipe Schlosser e então assumiu o comando técnico dos atletas, enquanto o segundo ficou responsável pela parte mecânica.
“Eles comentam que eu era o segundo pai deles. E de repente fui mesmo. Conto para as pessoas que não conheceram minha história que eu era google daquela época. Eu vinha de uma cultura rica de cuidados, disciplina, alimentação e consegui transmitir isso. Hoje, a gente se emociona porque o ciclismo está enraizado em Brusque”.
Passadas mais de três décadas, a cidade ainda colhe resultados da investida empresarial da Schlosser. Com problemas financeiros no início da década de 1990, a empresa se viu obrigada a cortar o investimento no esporte, mas deixou consolidado um trabalho que tem se difundido entre várias gerações.
Todo o ano surgem novas promessas que tentam seguir os passos de Márcio May, Murilo Fischer, Soelito Gohr (campeão mundial paraolímpico), entre outros atletas que marcaram época. Os dois últimos ainda competem oficialmente.