“Fiquei feliz que pegaram ele”: ex-pacientes de clínica fechada relatam como eram atendimentos em Joinville
Reportagem do jornal O Município Joinville conversou com duas mulheres que já foram atendidas na clínica F Coaching
“Fiquei feliz que pegaram ele”. Esse é o relato de uma mulher que já foi atendida na clínica F Coaching, fechada em Joinville, suspeita de venda ilegal de medicamentos e exercício irregular de profissões. O dono, Felipe Francisco, foi preso em uma operação que envolveu diversos órgãos e policiais.
A reportagem do jornal O Município Joinville conversou exclusivamente com duas pacientes que já foram atendidos na clínica. Os nomes apresentados na reportagem são fictícios, a fim de preservar a identidade das pacientes.
As duas relatam que tiveram reações aos medicamentos prescritos nos atendimentos e que foram vítimas da venda casada, pois não recebiam a receita e não podiam comprar os remédios em outros locais, apenas com a clínica.
Joana*, de 29 anos, conheceu a clínica por meio das redes sociais e por pessoas próximas que frequentavam o local. Ela buscou por um nutricionista no ano passado, com objetivo de emagrecer.
A ex-paciente conta que engordou quase 10 quilos devido à depressão e fazia uso de três medicamentos indicados pelo psiquiatra, sendo eles ansiolítico, antidepressivo e remédio para dormir.
“Na primeira consulta eles pediram uma série de exames e realizei, mas antes do resultado ele já me indicou um manipulado para inibir o apetite e me dar mais energia. Deixei claro os medicamentos que tomava e ele falou que estava tudo bem, que não fazia mal tomar junto. Na receita tinha o nome de outro médico, já não era o mesmo que me consultei”, relata Joana.
Ela conta que quando foi pagar, o valor era absurdo. “Falei que eu mesma queria mandar manipular e eles alegaram que não podia porque era “receita deles”. Como eu conhecia pessoas que estavam emagrecendo um monte, aceitei e paguei”, diz.
Joana diz que o medicamento levou cerca de três semanas para chegar. “Me indicou tomar quatro cápsulas em jejum todos os dias, achei meio absurdo e decidi esperar pela segunda consulta pra tirar a dúvida”, recorda. Já na segunda consulta, ela questionou o nutricionista se a quantidade estava correta e ele disse que sim.
Nesse mesmo atendimento, ela já tinha o resultado dos exames, que acusaram vitaminas D e B12 baixas. “Me deu mais receita pra isso. Cheguei na recepção, pedi a receita e me falaram que só podia comprar com eles, que não entregavam a receita. Foi a vitamina mais superfaturada que comprei. Juntando as vitaminas e o primeiro remédio, deu quase R$ 1,2 mil”, conta.
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Reações aos medicamentos
O nutricionista indicou o uso de quatro cápsulas do medicamento inibidor de apetite e que dava energia. Joana relata que começou tomando uma cápsula por semana e depois aumentou para duas.
“Um dia tomei duas cápsulas e estava no mercado na praia com a minha mãe e caí no chão do mercado. Pedi pra ir para o banheiro, estava sem energia alguma, ela me levou, eu pedi água e fiquei sentada no chão com taquicardia, suando frio, ânsia de vômito, uma sensação horrível, não conseguia me manter em pé. Durou uns 15 minutos e não era crise de pânico, porque já tive isso no passado e sabia diferenciar”, recorda.
Joana diz que uma enfermeira estava por perto e viu a situação. Ela falou que não era uma crise de pânico e começou a fazer perguntas para Joana. Quando contou que fazia uso de remédio para emagrecer, a enfermeira disse que poderia ser uma reação.
“Assim que voltei da praia fui ao psiquiatra e levei o tal do suplemento. Na mesma hora ele leu o rótulo e falou que foi uma crise seretoninérgica”, conta a ex-paciente. O psiquiatra explicou pra ela que o suplemento e os remédios que ela já fazia uso, que ela mencionou para o nutricionista e ele anotou e disse que não tinha problema ingerir junto ao suplemento, continham os mesmos componentes que elevam a serotonina. Conforme o médico, os medicamentos nunca poderiam ser tomados juntos, pois causariam uma superdosagem.
“E nunca vou esquecer que ele disse que tive “sorte” de não ter tomado a dosagem recomendada (4 cápsulas) porque poderia ter sido bem pior e em alguns casos leva a morte”, relata. “Meu psiquiatra é bem renomado e faço acompanhamento há bastante tempo, confio nele e ele falou que não fui a primeira paciente dele a chegar lá com esses relatos”, complementa.
A mesma situação aconteceu com Olívia, de 30 anos. No ano passado, vendo um anúncio no Instagram, ela buscou atendimento com a nutricionista e depois com a biomédica.
No atendimento, recebeu prescrição para medicamento injetável e manipulado. “Não me deixaram sair com a receita para pesquisar em outros lugares”, conta.
Ela teve reações ao medicamento injetável. “Sentia passar o líquido por toda a perna e depois sentia tontura e enjoo. Estava de carro e tinha que parar o carro para passar o efeito e assim continuar”, recorda.
Olívia contou para a biomédica, mas ela seguia com as aplicações. Ela também conta que a nutricionista prescreveu testosterona e outros hormônios que desregularam o ciclo menstrual. “Fez com que me desse muitas cólicas e fluxo intenso, de sair coágulos. Relatei isso e simplesmente ela aumentou a testosterona e outros manipulados”.
Quando soube da prisão do dono e do fechamento da clínica nesta terça-feira, 15, a ficha de Olívia caiu. “Realmente fui enganada”, finaliza.
Justiça
Comentando sobre o caso com algumas pessoas próximas, Joana foi orientada a mover uma ação judicial contra a empresa. “Mas com todo o dinheiro que ele tem, a pessoa mais prejudicada seria eu. Fiquei com medo”, diz a ex-paciente.
Ela tem consultas em aberto, mas não retornou aos atendimentos. “Nunca mais volto lá”.
Julgamentos
Joana diz que quando contou para algumas pessoas próximas, questionaram como ela teve coragem de gastar tanto com a clínica. “Eles te convencem de que você precisa deles e quando nossa autoestima tá baixa, eu era bem vulnerável na época, a gente faz o que for preciso, nem pensa direito e assim eles vendem que vamos ter um corpo perfeito”, finaliza.
A reportagem busca contato com a defesa de Felipe Francisco, mas até a publicação desta notícia não obteve sucesso. O espaço segue aberto para contraponto.
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