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Folha de pagamento da Prefeitura de Brusque cresce 350% em nove anos

Inflação no mesmo período foi de 69,9%; governo e sindicato divergem sobre causas de aumento dos custos

Dados solicitados por O Município à Prefeitura de Brusque revelam que os gastos do município com folha de pagamento aumentaram 349,91% entre 2009 e 2017. A elevação constante dos custos com o pagamento do funcionalismo tem sido uma dor de cabeça para o governo, o qual afirma que, a continuar assim, as próximas administrações podem ser “inviabilizadas”.

A preocupação principal é o fato de que, conforme estudo feito pela Secretaria de Governo e Gestão e Estratégica, as receitas da prefeitura, no mesmo período, não cresceram no mesmo patamar. A elevação registrada foi de 169,86% durante os últimos nove anos.

Além disso, o crescimento do custo total da folha tem sido bastante superior ao crescimento da inflação, que serve como base para a reposição salarial do funcionalismo. Entre 2009 e 2017, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acumulado foi de 69,99%.

O cenário atual não diverge: nos últimos 25 meses, de acordo com dados apresentados pela prefeitura, em apenas dois o aumento do gasto com pessoal foi inferior à inflação registrada.

Em valores brutos, as despesas também têm aumentado constantemente. O gasto com pessoal dobrou entre 2009 e 2013, passando de R$ 52 milhões para R$ 106 milhões. A estimativa da prefeitura é que dobre novamente em 2018, passando a R$ 216 milhões.

“Se a cada quatro anos nossa folha dobrar, vamos virar um Rio de Janeiro, não vai pagar a folha de pagamento, porque o plano de cargos e salários feito em 2009 veio em uma proporção de crescimento de receitas cuja realidade era outra”, afirma William Molina, secretário de Governo e Gestão Estratégica.

Prefeitura vê necessidade de revisar
plano de cargos e salários

Molina afirma que é fundamental uma revisão do plano de cargos e salários para reduzir, a longo prazo, o índice de comprometimento das receitas com folha de pagamento.

“O plano de cargos e salários está inviabilizando a prefeitura, a olhos nus. Temos que avisar a comunidade. Estamos mostrando que, se manter esse cenário, não vai inviabilizar o Dr. Jonas, que termina o mandato em 2020. Mas, e depois, como é que vão ficar os prefeitos?”, questiona Molina.

Ele afirma que o servidor público “não tem culpa nenhuma” sobre o fato da folha ter chegado a valores elevados, mas precisa, junto à prefeitura, colaborar para que se encontre formas de tornar esse crescimento da folha sustentável.

Molina atribui a elevação da folha acima da inflação e das receitas do município nos últimos anos ao chamado crescimento vegetativo, que é registrado com o adicional por tempo de serviço, de 2% ao ano, e as progressões na carreira – servidores que são promovidos ou realizam aperfeiçoamento, tendo direito a ganhar mais.

No ano passado, por exemplo, os servidores receberam 2% a mais no pagamento, além do reajuste de 4,19% acertado durante a negociação coletiva. Para Molina, o comprometimento com a folha não pode crescer tanto a ponto de inviabilizar investimentos.

“É praticamente impossível se dar conta desse parâmetro. No ano passado a folha cresceu 8,69% a mais do que cresceu a receita da prefeitura”, diz.

Ele diz que o problema pode ser contornado pela administração Jonas Paegle, mas irá causar grandes problemas às próximas gestões. “O próximo prefeito vai estar numa situação de precariedade econômica, sem dar conta de gerir o município”.

O secretário avalia que, conforme os estudos feitos pela prefeitura, somente uma redução do crescimento vegetativo ajudaria a tornar o crescimento sustentável, uma vez que os dados do governo indicam que, mesmo reduzindo-se comissionados e fazendo outros cortes, logo a folha volta a crescer novamente.

Sindicato dos servidores aponta
causas 
para aumento da folha

Na avaliação do Sindicato dos Servidores Públicos de Brusque (Sinseb), o crescimento da folha de pagamento não se trata apenas do plano de carreira dos servidores, mas há outras despesas envolvidas

O presidente do Sinseb, Orlando Soares Filho, ressalta que, até o ano passado, a negociação coletiva acontecia com um índice de comprometimento da folha pela prefeitura entre 45% a 52% da receita líquida, o que não ocorreu em 2018.

O sindicato também realiza seus estudos sobre a folha de pagamento da prefeitura, levados todos os anos para a mesa de negociação do reajuste salarial, e, neste ano, apresenta dados de 2017 analisados por seu economista.

Segundo João Batista Medeiros, assessor econômico do Sinseb, o plano de carreira não pode ser considerado o maior vilão do inchaço na folha de pagamento. Ele faz uma defesa do documento, já que, na avaliação do sindicato, é o fato de ter uma perspectiva de crescimento na carreira que faz com que funcionários permaneçam por mais tempo na prefeitura.

Permanecendo no cargo, eles ficam cada vez mais experientes no serviço executado, o que torna, hoje, a prefeitura totalmente administrável mesmo se não tivesse prefeito, opina o economista.

Um dos fatores apontados pelo sindicato para que a prefeitura esteja com o comprometimento da receita com a folha acima de 54% é a inclusão de 200 aposentadorias neste cálculo.

Membros do Sinseb explicam que, durante o primeiro mandato do ex-prefeito Ciro Roza, em 2004, foi extinto o antigo instituto de previdência dos servidores, o PreviBrusque, com o dinheiro indo para o caixa da prefeitura. Conforme a lei, quando um instituto é extinto, a prefeitura assume sua folha de pagamento.

Com isso, os 200 aposentados que recebiam seus benefícios pelo PreviBrusque passaram a constar na folha de pagamento da prefeitura. Atualmente, essas aposentadorias custam cerca de R$ 600 mil por mês à prefeitura, e são computadas no cálculo das despesas com pessoal.

Até 2017 essas aposentadorias não compunham a folha de pagamento, porque eram abastecidas por um fundo que repassava os recursos, após a criação, no governo Paulo Eccel, do novo instituto de previdência, o Ibprev. Mas, em 2016, o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu que essa operação fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, e determinou ao município que arque diretamente com os custos das aposentadorias.

O sindicato reconhece que não é possível, hoje, a prefeitura excluir da folha de pagamento os aposentados. Porém, acredita que o governo não pode considerar as despesas com eles, estimadas em R$ 7,6 milhões por ano, como um crescimento natural da folha.

Isso porque, na avaliação do Sinseb, o fato da prefeitura ter que computar esses aposentados em sua folha de pagamento foi criado pela própria prefeitura, em 2004, ao se apropriar dos recursos do PreviBrusque.

“A lei não permite tirar os aposentados [do cálculo da folha]. Mas o ônus de pagar os aposentados é do município. Não pode ser computado como crescimento vegetativo da folha”, afirma o assessor econômico.

Em 2017, de acordo com os cálculos do Sinseb, as 200 aposentadorias representaram 2,2% da receita líquida da prefeitura.

De acordo com os mesmos cálculos, se o município não tivesse criado esse problema em 2004 e, posteriormente, sido obrigado a assumir a conta, a prefeitura teria fechado o ano passado com 52% da receita comprometida com o funcionalismo, dentro do limite estabelecido por lei.

Em que pese o governo municipal indicar que a demissão dos comissionados não ser a solução para reduzir a folha de pagamento, o sindicato acredita que se trata de uma medida apropriada para o momento.

Representantes do Sinseb dizem que o sindicato não se furta em discutir a questão do plano de carreira e do adicional por tempo de serviço, mas avalia que a prefeitura ainda não adotou medidas possíveis para conter o crescimento da folha.

O assessor econômico da entidade cita números de estudos feitos sobre a folha de pagamento para justificar essa opinião.

Segundo esse estudo, uma folha de pagamento sem comissionados comprometeria, em 2017, 48,9% da receita líquida da prefeitura. Considerando-se uma folha com efetivos, temporários e agentes políticos, o comprometimento seria de 49% no ano passado.

Além disso, se o município tivesse trabalhado, em 2017, com metade dos comissionados existentes, o ano teria fechado com comprometimento de 52,95% da receita, de acordo com os dados apurados pelo sindicato. Na avaliação do Sinseb, isso já seria suficiente para que, neste ano, a negociação salarial iniciasse com índices menores do que os atuais 54,63% de comprometimento.

Cenários possíveis para a folha
de pagamento em 2018

A prefeitura elaborou estimativas sobre a folha em 2018 com base em três possibilidades: não dar nenhum reajuste, dar o valor pedido pelo sindicato: 6,81%; e dar o reajuste oferecido pelo governo: 1,81%.

No primeiro cenário, caso o governo optasse por não fazer reajuste, o que segundo Molina é uma prerrogativa da prefeitura, já que o município extrapolou os limites previstos em lei, seria possível baixar a folha para 52% da receita, de forma imediata.

No entanto, ele diz que em dezembro deste ano, conforme as planilhas estimativas, a prefeitura já voltaria atingir 54%.

Se o governo der o reajuste pedido pelo sindicato, a estimativa é chegar ao fim de 2018 com 59,2% da receita comprometida com folha de pagamento. Nesse caso, a avaliação é de que não seria mais possível retornar ao limite de 54%.

O cenário intermediário, e mais realista neste momento segundo o governo, leva em consideração um reajuste de 1,81% a ser aplicado neste ano. Nesse caso, a prefeitura conseguiria manter-se abaixo dos 54% de comprometimento até julho, quando novamente será ultrapassado o limite, se nenhuma medida for tomada.

O que pode ser feito pelo governo, avalia Molina, é cortar gratificação de servidores e mexer na estrutura de cargos comissionados. Se nada for feito, 2018 terminará, nesse cenário, com comprometimento de 56,5% da receita com folha de pagamento.

Por isso, o governo propôs ao sindicato dar o reajuste em duas parcelas, para jogar para frente o iminente aumento da folha de pagamento. A proposta, entretanto, foi inicialmente rechaçada pelos servidores públicos.

Governo trabalha com projeções até 2023

A equipe da Secretaria de Governo e Gestão Estratégica também elaborou estimativas do crescimento da folha até 2023. A perspectiva é de que, se nada for feito para reduzir consideravelmente a folha, a prefeitura só consegue se manter com 54% do comprometimento da receita com funcionalismo se houver reajuste zero, em todos esses anos.

Como isso é praticamente impossível, o município simulou também como ficaria a folha de acordo com o crescimento médio registrado nos últimos anos: há três cenários possíveis, levando-se em consideração as médias registradas nos últimos dois, quatro e seis anos.

Esses cenários revelam, em qualquer um dos casos, um comprometimento ainda maior da folha, se nada for feito para reduzi-la. Há estimativas de que em 2023 o índice de comprometimento da folha possa ser de 64%, 75% e até 80%, a depender do crescimento da arrecadação ser maior ou menor.

Também foi simulado um cenário levando em consideração a extinção total dos comissionados, que é uma das bandeiras do sindicato. De acordo com o governo, a folha passaria imediatamente aos 53% de comprometimento, mas voltaria a ultrapassar o índice em alguns anos.