“Hoje jogamos de igual para igual com qualquer time do Brasil”, afirma Jerson Testoni
Em entrevista, técnico do Brusque fala sobre carreira, força da equipe e primeira passagem pelo quadricolor
Antes de se destacar como técnico na era do melhor Brusque de todos os tempos, Jerson Testoni realizou trabalhos importantes nas categorias de base de diversos clubes de Santa Catarina. Após desempenhos mais que satisfatórios ao longo da carreira, o comandante recebeu, merecidamente, nova chance no Marreco. Com muita facilidade para fazer a gestão do elenco, o momento é excelente e se traduz em números. Nesta passagem, são 23 jogos, com 17 vitórias, três empates e três derrotas, e impressionantes 78,26% de aproveitamento.
O início de sua segunda passagem como técnico do Brusque foi construído com duas vitórias em clássicos contra o Marcílio Dias, então líder da Copa Santa Catarina de 2019, em menos de uma semana. Já era claro que a equipe começava uma recuperação para voltar aos trilhos em que esteve durante a Série D do Brasileiro. O título da Copa SC foi seguido pelo título da Recopa e por uma campanha no Catarinense que tem tudo para ser histórica, contrariando alguns conselhos que o treinador recebia.
“Alguns atletas, comissão, torcedor, falavam que não daria pra reproduzir o modelo da Copinha no estadual, por serem adversários mais fortes. Hoje jogamos de igual para igual com qualquer time do Brasil, e jogando ofensivo, buscando o gol. Claro que tem jogo que não vamos encaixar, faz parte. É do dia. Não somos máquinas. Mas jogamos dessa forma.”
O técnico afirma que o momento que vive vem do acúmulo de preparações e experiências desde os primeiros momentos da carreira, quando começou a trabalhar na base do Marcílio Dias em 2011. “Se não tivesse sido neste momento para assumir, seria em outro”, garante.
Às vésperas de um jogo importantíssimo diante do Brasil de Pelotas na Copa do Brasil, Jerson Testoni acredita em uma classificação e destaca a importância de uma partida anterior: contra o Sport, vitória por 2 a 1 no Augusto Bauer. “Aquela vitória nos mostrou nossa capacidade, por tudo que envolveu, aquele gol deles anulado no final. Fez com que soubéssemos que podemos conquistar algo. Chegar longe. Até mesmo na Série C, porque a ideia é manter o grupo. Aquela vitória mostrou o patamar em que estamos.”
Jogador
Após ter começado a levar o futebol a sério nas escolinhas Tupi, de Gaspar, Jerson Testoni conseguiu ingressar no time do Brusque em 1997, quando tinha 17 anos. “Meu pai foi no clube e pediu por uma avaliação para mim e para meu irmão, que tinha 25 anos. O primeiro teste foi no Paysandú”, lembra. E se não desse certo, seria o último teste. Se não desse certo, Jersinho começaria a trabalhar para ajudar na casa, e até já tinha um emprego acertado em uma estamparia.
“Meu irmão foi muito bem, e eu, muito novo, tive dificuldades.” Naquela quarta-feira, o técnico Joceli dos Santos era o técnico pediu para o irmão mais velho retornar no sábado. Quando perguntou “e ele, vem também?” A contragosto, Joceli concordou. No fim de semana, em treino realizado no Olaria, na Guabiruba Sul, Jersinho se destacou e chamou a atenção da comissão técnica.
O lateral-esquerdo revezava entre as categorias de base e o time profissional. Em 1999, se profissionalizou de fato. No ano seguinte, chamou a atenção do Criciúma. Foi o primeiro jogador a ser vendido na história do clube, em novembro de 2000.
Jersinho passou por Gama, Criciúma, Villa Nova (MG), Francana (SP), Botafogo-SP, Joinville, XV de Piracicaba, Metropolitano, Atlético de Ibirama, Tubarão, Marcílio Dias, Brasil de Farroupilha e CFZ Imbituba. Em 2008, pelo Brasil de Farroupilha, teve grave lesão no joelho, que o fez abreviar a carreira.
No CFZ, marcou o primeiro gol da história do estádio Emília Mendes Rodrigues, em Imbituba: o amistoso, disputado justamente contra o Brusque, terminou em 1 a 0 naquele 8 de junho de 2009. Sem condições de jogar por conta da lesão, encerrou a carreira em 2010, aos 29 anos, quando terminou seu último contrato com o CFZ Imbituba. Seu último técnico, por acaso do destino, foi Joceli dos Santos, quem o descobriu em 1997.
Fim de carreira
Encerrar uma carreira de jogador profissional sem sequer ter completado 30 anos foi um golpe duro para o gasparense, que já não queria saber de futebol. A falta de formação era um problema. Sem ter completado o Ensino Médio, o ex-atleta se viu perdido sobre que profissão tomar.
“Eu quis estudar. Eu tinha 16, 17 anos quando parei. Já tinha tentado voltar a estudar na época do Criciúma, mas era difícil por causa das viagens. O atleta acaba ficando muito relaxado. Sempre passei isto para os meninos quando trabalhava com categoria de base: tem que estudar, o futebol não é pra sempre. O jogador tem que ter algo, tem que ter uma base. E quanto parei de jogar, eu não tinha base nenhuma. Não tinha nada. Não sabia fazer nada.”
Jersinho conseguiu concluir o Ensino Médio e passou a cursar Educação Física na Univali, com o objetivo de ser professor.
Destino
Em junho de 2011, a relação com o futebol voltou a existir. Jerson Testoni estava em Itajaí, onde morava sua então esposa, desde os tempos em que jogou no Marcílio Dias. Ele fazia um lanche próximo ao estádio Dr. Hercílio Luz quando foi abordado por Paulinho Portugal, coordenador da base do Marinheiro, que fez um convite: ser professor em um núcleo da base do clube.
“Eu não queria mais saber de nada de futebol, mas eu aceitei. Eram poucos meninos, oito, nove. Duas, três semanas depois, tinha quase 30. E comecei a trabalhar com aquilo e eu senti que era algo certo para mim. Treinando aqueles garotos, percebi que seria o caminho.”
Ao fim daquele ano, o agora treinador passou a comandar o time Sub-15 do Marcílio Dias. “Eu pegava as roupas no estádio, as bolas do treino nas costas e saía em uma Biz pela cidade para chegar no campo do treino, lá no chamado Matadouro, em Itajaí”, conta.
O técnico
Após ter sido eliminado do estadual por ter escalado um garoto de 12 anos no time Sub-15 sem saber que era proibido, vieram duas conquistas: A Copa Santa Catarina e a Copa Três Coroas, no Rio Grande do Sul.
“Fui criando minha própria identidade, minha forma de trabalhar e percebendo que era o que eu gostava. Tenho referências, mas não acompanho o dia a dia. É sempre muito distante.”
Hoje, olhando para trás, o técnico do Brusque tem a humildade de reconhecer que, como diz em suas palavras, era “muito chato”. “Eu dizia para minha ex-mulher, para minha atual esposa que hoje nem eu me aturaria naquela época. De pegar no pé. Muito detalhista. Eu fazia eles treinarem em um nível muito grande de concentração, focado em evolução o tempo todo. Já tirei gente do treino, achando que não tava bom o bastante. A meninada da base tem que se agarrar na chance que tem.”
Jerson Testoni também passou pelo Atlético de Ibirama, clube pelo qual o gasparense-brusquense trata com enorme carinho, pela sua manutenção nas categorias de base em tempos de crise.
Uma característica do técnico foi mantida ao longo dos anos trabalhando em categorias de base foi a facilidade em lidar com os diversos elencos. Seu estilo e sua liderança tem conquistado jogadores e mantido grupos unidos e muito entrosados. Uma prova é o Brusque. “Isso é de mim. Os atletas falam que sou transparente. Olho no olho, eles entendem. O segredo do treinador é passar a ideia pro jogador e o jogador acreditar nessa ideia.”
Testoni define seu modo de trabalho como uma união entre treino com bola e treino físico, sempre voltados para o dia do jogo. Ele elogia os preparadores físicos Marcos Abella e Lamil Valêncio, que fizeram bem a integração dos trabalhos e não deixavam o técnico tirar foco da parte física nos treinos. Os trabalhos do Brusque com bola dificilmente ultrapassam os 40 minutos, integrando partes técnica e tática com a preparação física.
Os jogadores, segundo ele, chegam a conversar sobre a pré-temporada com os preparadores, falando sobre o quão diferente o trabalho foi. Alguns deles não esperavam chegar tão prontos para o primeiro jogo oficial, contra o Avaí, na Recopa Catarinense.
Houve o retorno em 2016 ao Brusque, sendo treinador e coordenador das categorias de base. “Eu fazia de tudo. Até a alimentação dos meninos no alojamento era eu que comprava. Súmula de jogo, recolhia documentação…”. Na sequência, foi auxiliar técnico de Mauro Ovelha, acumulando funções.
“Quando o Mauro saiu, os caras já cogitaram me colocar como técnico, em 2017, na terceira rodada do estadual. Trouxeram o Pingo, e pra mim foi tranquilo. Assumi depois que ele saiu, na Série D.”
Ao fim da Série D em 2017, Testoni voltou para a base, mas logo retornou para a Copa SC. “A gente tava muito quebrado, tinha jogadores chegando ainda.” Ele perdeu o cargo após uma derrota por 3 a 0 para o Tubarão. Os jogadores assumiram a responsabilidade pela derrota, mas era tarde demais. A diretoria já havia acertado com Picoli para assumir a equipe, para surpresa do treinador.
Na sequência, Jerson Testoni foi trabalhar no Joinville, onde ficou durante um ano e dois meses. Saiu para voltar ao Brusque, sendo o auxiliar técnico da comissão permanente do clube. O primeiro desafio era a Série D. A parceria com Waguinho Dias foi fundamental para o sucesso da equipe, no início de uma ascensão meteórica.