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Homem Maduro | Mulher Madura

HOMEM MADURO

Como seria se a vida tivesse lhe devolvido as carícias¿ Fizesse a ele todas as suas vontades¿ Como seria enriquecer, ter tudo o que quisesse e não desejar mais nada¿
Ah, não, ele não queria pagar esse preço. Ele podia até ser descabido, infernal, descontrolado. Intragável e petulante. Mas ele estava dentro de si. Daquele corpo fechado.
Alguns poderia pensar que ele estava acomodado. Mal sabiam o quanto ele caminhava por dentro de si mesmo e olhava, indiscreto, pelas janelas olhos, boca nariz…Olhava muito para fora de si mesmo…aliás, fizera isso a vida toda. Sempre acreditando que era lá fora de seu corpo que se encontraria.
Na infância era um desejo incandescente de ser melhor que os amigos, forte, desbravador, herói.
Na adolescência acreditou que deveria arriscar tudo, praticar uma revolução, açoitar-se, negar-se, recriar-se outro, distinto de si, separado do contexto em que era forçado a viver.
Na juventude, usou armas, praticou viagens exploratórias, ousou amores apaixonados e muitas mulheres em sua vida.
Mais maduro, casou-se. Pensava mesmo que criar uma família o afastasse daquela solidão de ser ele mesmo. Não durou muito, separou-se, com alguns filhos incompreendidos por ele, já que não dava conta de compreender a si mesmo.
Hoje está só. Mas não é sozinho. Olha para fora de si mesmo, mas sabe que não está lá. Hoje, apesar dos descompassos, da luta árdua para sair de si, encontra-se em lugares tão simples e óbvios, que chega a rir de si mesmo: na árvore enraizada em seu jardim, no livro aberto sobre seu travesseiro e que o aguarda todas as noites, no café acompanhado do charuto, e na música clássica tocando ao fundo, enquanto ele mira o céu, sem esperar nada, em paz consigo mesmo e com seu corpo. Nunca esteve tão bem acompanhado, pois está consigo mesmo.
Acende a lareira…e aguardo o ruído dos netos que logo abrirão a porta e pularão em cima dele, acreditando que ele é uma rocha, uma montanha, uma fortaleza. E ele é, pois descobriu-se.

 

MULHER MADURA

A mulher então resolve redescobrir-se. Se o tempo passou, não significa que foi em vão. Ou que hoje, com outra percepção, aquilo tudo que viveu ou sonhou deixou de ser algo importante. Somente, o grau de importância mudou. A questão da pele, do corpo, da aparência já não está em primeiro plano. Algo inescrutável, ainda na penumbra começa a assumir a frente. Colocada diante de seu destino, o silêncio já não atrai desatinos ou inquietações. É um estado, que a princípio assusta pela intensidade do vazio de respostas prontas. Mas, paciente, a mulher descobre que preparou-se para isso a vida toda. Então se acalma… Exerce, o melhor que pode, a parcimônia com suas emoções plácidas. São emoções difíceis de serem diagnosticadas, já que, diferente de como era antes, essas se mantém na margem. No entanto, são firmes, sabem que não precisam se apressar para entrarem em ação. Essas emoções, diferentes da paixão ensandecida das anteriores, não necessitam ganhar destaque para existirem. Elas simplesmente existem, concebidas com a árdua tarefa do viver.

O exercício mais difícil de agora, e a mulher sabe muito bem disso, é garantir que a calma e o silêncio não a deixem desesperada para ocupar esse espaço, pelo medo absurdo de encontrar-se consigo mesma. Então, paulatinamente, dia após dia, ela se aquieta. Tenta não se deixar seduzir pelas ilusões do entorno, pois sabe, que para ela o caminho já é outro. E não é, como a maioria das pessoas pensam e os slogans e a mídia anunciam, um caminho tosco, ou triste ou solitário. Mas sim, e graças, ela, essa mulher de meia idade, já está mais segura de si mesma, e tem uma caixa de pandora secreta, que ela já abriu, e linda em suas rugas e corpo fora do padrão, essa mulher sabe, que viveu tudo o que viveu para chegar ali, aqui, e deparar-se com o encantamento de ser quem ela é.

 

Silvia Teske – artista

Arte: Silvia Teske