Idas e vindas: como a migração transformou Brusque em uma cidade plural
Cidade passou de exportadora de talentos e se tornou um lugar atrativo para quem quer prosperar
Com o passar dos anos, a agricultura já não bastava para o sustento das famílias, que cresciam. Os lotes dos pequenos agricultores, da segunda e terceira geração dos colonizadores que trabalhavam na terra, não comportavam os filhos que se casavam e formavam novas famílias. As plantações de milho, aipim, batata, entre outros, não eram mais suficientes para uma vida confortável. Como nessas localidades não havia emprego, filhos e netos começaram a sair do interior em busca de uma vida melhor.
A região central de Brusque era o destino dessas famílias, pois as indústrias Renaux, Schlösser e Buettner estavam em pleno crescimento
A região central de Brusque era o destino dessas famílias, pois as indústrias Renaux, Schlösser e Buettner estavam em pleno crescimento e eram vistas como uma ótima oportunidade de melhorar as condições de vida.
O emprego com carteira assinada nas fábricas têxteis, na condição de operários, atraia os mais jovens. O historiador Aloisius Lauth lembra que naquela época não havia necessidade de conhecimento técnico. “Bastava o treinamento no próprio local de trabalho, que consistia em operar uma máquina de abridor de algodão, uma fiandeira, um tear ou um tanque de tinturaria”.
Desta forma, a estrutura do município de Brusque começou a mudar. De acordo com Lauth, em 1940, a população da zona rural da cidade correspondia a 74,5%, enquanto que a urbana era de apenas 25,5% da total. A partir de 1940 a 1960, a estrutura demográfica de Brusque se inverteu. A população urbana atingiu 84,5%, devido ao êxodo rural no próprio município gerado pelo esgotamento da atividade agrícola.
Como impacto do êxodo rural em Brusque, Lauth destaca a urbanização crescente e desenfreada da área central da cidade, especialmente em torno das três grandes indústrias.
“Acompanha o movimento da migração interna, do Sul para o Centro-Oeste brasileiro. Fenômeno semelhante ao anterior, porém a atratividade será agora as regiões mais distantes, como o Norte do Paraná e o Sul do Mato Grosso”.
Conforme Lauth, a migração originária de Brusque se deu a partir da procura por terras, salário e renda nas lavouras do Norte. O atrativo era terra barata no entorno de Londrina e Maringá.
A sociedade se tornou, na virada do século, mais aberta para o mundo, menos folclórica e tradicionalista
A migração tem como destino também a região, com a saída de pessoas para se empregar em Jaraguá do Sul, Joinville e Blumenau. Neste período, em Jaraguá, há o crescimento da WEG. Em Joinville, a atração da mão de obra se dá para a empresa Tupi e a nova fábrica da Consul. Em Blumenau, o atrativo é a Cia Hering e a Souza Cruz.
“Para Blumenau, em 1968, a ‘Rodoviária Expresso Brusquense’ abre linhas com ônibus direto de ida e volta para as fábricas da Hering e Sul Fabril, com saídas às 5h, 5h30, 6h e 6h30, quase sempre com assentos todos ocupados”.
Outro fenômeno observado pelo historiador é o que ocorreu em 1970, quando a classe média e a elite enviavam os filhos para estudar na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Curitiba e Florianópolis.
Os jovens que se formavam fora não retornavam mais à cidade porque não havia mercado para tanta gente.
Para Lauth, a migração de parte da população de Brusque para outros centros favoreceu a abertura da cidade para novas culturas, contribuindo para a busca por melhores padrões de vida. “A sociedade se tornou, na virada do século, mais aberta para o mundo, menos folclórica e tradicionalista. Assumimos o modelo de vida do neoliberalismo econômico mais depressa”, diz.
Essa abertura citada pelo historiador possibilitou a readequação do cenário migratório, e o início de um fluxo inverso: Brusque passou a ser, aos poucos, em vez de uma cidade exportadora de talentos e mão de obra, um lugar para onde aqueles com vontade de trabalhar e crescer se dirigiam.
Em sua tese de doutorado intitulada ‘Regimes de cidade: investigações acerca de experiências urbanas no Vale do Itajaí Mirim’, o historiador Álisson Sousa Castro aponta que entre os anos 1970 e 1980, a taxa de crescimento populacional do município era de 17%, bem abaixo do observado na década anterior, em torno de 33%.
De acordo com ele, Brusque volta a crescer significativamente a partir da administração do prefeito César Moritz, entre 1973 e 1977, quando novas indústrias se instalaram no município, o que contribuiu não só para a diversificação do parque fabril, mas também para a geração de empregos.
Tanto a diversificação fabril quanto a infraestrutura mais adequada foram preponderantes para a criação de empregos e, consequentemente, a atração de mão de obra
Além disso, ele avalia que o asfaltamento da rodovia Antônio Heil, em 1974, facilitou a vinda de turistas e clientes a Brusque o que possibilitou a intensificação na década seguinte das pequenas indústrias têxteis e culminou com o auge da rua Azambuja no início da década de 1990, assim como dos shoppings de moda neste mesmo período.
“Tanto a diversificação fabril quanto a infraestrutura mais adequada foram preponderantes para a criação de empregos e, consequentemente, a atração de mão de obra”, destaca.
É neste período que a cidade começa a receber famílias do Paraná e do Rio Grande do Sul. Anos mais tarde, chegam os migrantes do Norte e Nordeste e, mais recentemente, a cidade recebe haitianos e venezuelanos. Atualmente, Brusque é uma cidade plural, com oportunidades para todos.
“Os poucos movimentos arredios perderam força ao longo do tempo, como foi a manifestação contrária a vinda de baianos para Brusque alguns anos atrás. Recebemos pessoas de várias regiões do país e até de fora que vem em busca de uma vida melhor, convivendo em harmonia”, avalia Lauth.
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